Abstract: | A fundação, enquanto discurso de origem civilizadora das nações contemporâneas e a
mestiçagem, entendida como discurso fundacional da nação brasileira, são os temas tratados por esta pesquisa. A partir da leitura de cenas e contextos sociais, culturais e artísticos e,principalmente, das obras dos escritores baianos Jorge Amado, Sosígenes Costa e Adonias Filho, busca-se investigar o discurso fundacional não apenas como justificativa do nacionalismo, do racismo, da xenofobia e das políticas anti-imigracionistas, mas em suas rasuras, ou seja, processos de descontinuidade e de dispersão, configuradores daquilo que se
denomina: narrativas do “renegado começo”. Tais narrativas promovem uma percepção crítica e genealógica da história, uma abordagem estratégica acerca de sujeitos culturais e lugares,desenvolvida a partir de uma visão plural e conflituosa de experiências culturais. Esta visão
desconstrói o determinismo da metafísica da presença fundacional, em seu desejo de
continuidade dos ideais raciais e nacionalistas. Tocaia Grande, Iararana e Luanda Beira Bahia, e outras narrativas dos autores, respectivamente referidos, operam processos ambivalentes de identificação cultural, que põem em xeque tanto as referências unívocas e fixas da perspectiva histórica eurocêntrica, quanto o ideal da mestiçagem, produzido por alguns pensadores sociais do Brasil. A mestiçagem, entendida por esses pensadores como discurso de síntese racial e cultural, amparada na previsibilidade do sujeito nacional, na
construção conciliatória ou definitiva da ideia de “povo brasileiro”, encontra, especialmente na obra de Jorge Amado, o enfoque rasurado, através de personagens andejos e desterrados que, situados numa encruzilhada de culturas, ou num começo historicamente renegado, não se
encaixam no ideal desse discurso. |