Freud e o problema da linguagem em Sobre a concepção das afasias

Abstract

A presente dissertação aborda o problema da linguagem nos primórdios do pensamento freudiano, concentrando-se na monografia Sobre a concepção das afasias (1891), trabalho em que Freud dá o seu primeiro passo em direção à construção da metapsicologia. Em seu trabalho é elaborada uma crítica às teorias localizacionistas de Wernicke e Lichtheim para os distúrbios de linguagem, assim como à teoria geral sobre o funcionamento do sistema nervoso de Meynert. A crítica freudiana consiste na refutação de todas as teses que serviriam como sustentáculo ao localizacionismo, o que resultou na construção de uma nova maneira de se pensar as relações entre o cérebro e a função psíquica da linguagem e, por conseguinte, do psiquismo como um todo. Sendo assim, a crítica freudiana ao localizacionismo também exigiu um exame nevrálgico da psicologia subjacente às teses localizacionistas e a sua devida reformulação. Esta ruptura operada foi capital para a constituição da psicanálise, visto que neste ponto Freud descortinou a possibilidade de edificar uma teoria “psicológica” especulativa, isenta de uma preocupação imediata com o determinismo anatômico. O problema que move nosso estudo interroga, pois, pela maneira como a crítica empreendida por Freud à neurologia do fim do século XIX o permitiu apropriar-se e subverter a psicologia implícita em seus fundamentos, conduzindo-o à formulação de uma nova teoria das representações que, em termos gerais, pode ser identificada como um dos alicerces da psicanálise em suas dimensões teórica e clínica. Entendemos que o conceito de representação forjado por Freud pode ser explicitado como um dos Grundbegriff da teoria metapsicológica, encontrando-o ao longo de todo o seu pensamento, sendo imprescindível o devido esclarecimento deste conceito para a adequada compreensão dos contornos epistemológicos do discurso psicanalítico enquanto um campo originário, assim como do modelo de psiquismo implicado em seus desdobramentos teóricos.

This dissertation addresses the problem of language in the early Freudian thought, focusing on the monograph On aphasia (1891), a work in which Freud takes his first step towards the construction of metapsychology. In his work, he elaborates a critique of Wernicke and Lichtheim's localizationist theories for language disorders, as well as to the Meynert’s general theory about the functioning of the nervous system. Freudian criticism consists in refuting all the theses that would serve as a support for localizationist theory, which resulted in the construction of a new way of thinking about the interactions between the brain and the psychic function of language and, therefore, of the psyche as a whole. Thus, the Freudian critique of localizationism also demanded a thorough analysis of the psychology underlying the localizationist theses and their due reformulation. This rupture was essential for the constitution of psychoanalysis, since at this point Freud revealed the possibility of building a speculative “psychological” theory, exempt from an immediate concern about anatomical determinism. The problem that drives our study questions the way in which the criticism undertaken by Freud to neurology at the end of the 19th century allowed him to appropriate and subvert the psychology implicit in its foundations, leading him to the formulation of a new representation theory which, in general terms, can be identified as one of the foundations of psychoanalysis in it’s theoretical and clinical dimensions. We understand that the concept of representation forged by Freud can be explained as one of the Grundbegriffs of metapsychological theory, finding it throughout his thought, and it is essential to clarify this concept for the proper understanding of the epistemological contours of psychoanalytic discourse as an original field, as well as the model of psyche involved in its theoretical developments.