As significações de parentalidade para pai e mãe que vivenciaram violência intrafamiliar na infância e ou adolescência

Abstract

O presente estudo aborda as significações da parentalidade para genitores que vivenciaram a violência intrafamiliar na infância e adolescência. Para tanto, foram integradas discussões sobre filialidade, parentalidade e violência intrafamiliar contra a criança e ou adolescente. Tendo em vista esta problemática, o referencial teórico adotado foi o da Psicologia Semiótico Cultural. Buscou-se analisar especificamente: os modos como a experiência de violência perpetrada pelos pais na infância se relacionam com as significações sobre filialidade e as significações que os participantes constroem sobre suas experiências de parentalidade. Como método, foi escolhida uma abordagem qualitativa com o uso da narrativa dos sujeitos, elegendo o estudo de casos múltiplos, sendo a análise realizada de forma que atendesse aos objetivos específicos. O estudo foi realizado no contexto do “Brincando em Família” do Instituto de Psicologia da Universidade Federal da Bahia que oferece atendimento psicológico em grupo a partir do brincar para as crianças e suas famílias. Desta forma, alguns pais que se adequaram aos critérios estabelecidos, foram convidados a participar da pesquisa empreendida, sendo o convite realizado a partir de uma breve explicação sobre os objetivos. Este estudo foi realizado com dois sujeitos (um pai e uma mãe). Entre os resultados, percebeu-se que para os participantes as significações sobre a filialidade foram atravessadas pela vulnerabilidade social e econômica e pela violência intrafamiliar. Na narrativa de José, a filialidade relacionada à figura paterna foi significada como violenta e permeada por sentimentos de ambivalência. No que diz respeito a sua mãe, José define a relação entre ambos como permeada por muito amor, cuidado mútuo, companheirismo e proteção. Também fica claro que suas significações atuais de parentalidade (principalmente com Laura e Josiel) estão também relacionadas com o seu próprio pai, descrevendo pontos negativos da relação que estabeleceu com ele, refletindo criticamente sobre como tais atitudes o impactaram e, deste modo, buscando agir diferente em relação ao próprio filho. As significações de filialidade desenvolvidas por Diana, referentes à própria mãe, assumem, primeiramente, sentimentos positivos como o de ser amada, querida e acarinhada. Entretanto, com a saída da mãe do contexto familiar, tais significações foram atravessadas pelo abandono material e afetivo, tristeza, ambiguidade, sentimento de inferioridade, além de violência física e psicológica sofrida por parte das irmãs. Quanto ao pai, seus relatos evidenciam as significações de filialidade perpassadas pelo distanciamento afetivo e a negligência. Para Diana, a experiência da maternidade mostrou-se como um evento disruptivo na sua trajetória. Em sua narrativa, a participante expressa que seus interesses pessoais conflitam com o exercício da maternidade, evidenciando especialmente na falta de investimento afetivo. Com os dois sujeitos desta pesquisa percebemos que a violência intrafamiliar experienciada na infância com os próprios pais, mesmo sendo um evento passado pode estar imbricada na experiência presente da parentalidade, embora sem determina-la.

This study addresses the meanings of parenting for parents who experienced intrafamily violence in childhood and adolescence. To this end, discussions on affiliation, parenting and intrafamily violence against children and / or adolescents were integrated. Given this problem, the theoretical framework adopted was the Cultural Semiotic Psychology. It was specifically analyzed: the ways in which the experience of violence perpetrated by parents in childhood is related to the meanings about affiliation and the meanings that participants construct about their parenting experiences. As a method, a qualitative approach was chosen using the narrative of the subjects, electing the study of multiple cases, and the analysis was performed in a way that met the specific objectives. The study was conducted in the context of the "Playing in Family" of the Institute of Psychology of the Federal University of Bahia that offers group psychological care based on playing for children and their families. Thus, some parents who met the established criteria were invited to participate in the research undertaken, and the invitation was made from a brief explanation of the objectives. This study was conducted with two subjects (one father and one mother). Among the results, it was noticed that for the participants, the meanings about affiliation were crossed by social and economic vulnerability and intrafamily violence. In Joseph's narrative, the fatherhood-related affiliation was signified as violent and permeated by feelings of ambivalence. Concerning his mother, Joseph defines their relationship as permeated by much love, mutual care, companionship, and protection. It is also clear that his current meanings of parenting (especially with Laura and Josiel) are also related to his own father, describing negative aspects of his relationship with him, critically reflecting on how such attitudes impacted him and thus seeking to act. different from his own son. The meanings of affiliation developed by Diana, referring to her mother, first assume positive feelings such as being loved, loved and cherished. However, with the mother leaving the family context, these meanings were crossed by material and emotional abandonment, sadness, ambiguity, feeling of inferiority, as well as physical and psychological violence suffered by the sisters. As for the father, his reports highlight the meanings of filialness permeated by affective distancing and neglect. For Diana, the experience of motherhood proved to be a disruptive event in her career. In her narrative, the participant expresses that her personal interests conflict with the exercise of motherhood, evidencing especially in the lack of affective investment. With both subjects of this research we realize that the intrafamilial violence experienced in childhood with their own parents, even being a past event may be imbricated in the present experience of parenting, although without determining it.