RENATA DIAS COSTA AVALIAÇÃO DE POLÃTICAS PÚBLICAS: UMA AVALIAÇÃO DA PERCEPÇÃO DO PROJETO DE IRRIGAÇÃO DE PONTO NOVO-BA Dissertação apresentada ao Núcleo de Pós- Gradua- ção em Administração, Escola de Administração, Universidade Federal da Bahia, para obtenção do grau de mestre em Administração. Orientador: Profa. Dra. Elizabeth Matos Ribeiro Salvador 2013 Escola de Administração - UFBA C837 Costa, Renata Dias. Avaliação de polÃticas públicas: uma avaliação da percepção do Proje- to de Irrigação de Ponto Novo-BA. – 2012. 152 f. Orientador: Profa. Dra. Elizabeth Matos Ribeiro. Dissertação (mestrado) – Universidade Federal da Bahia, Escola de Administração, Salvador, 2013. 1. PolÃticas públicas. 2. PolÃticas públicas – Avaliação. 3. Projetos – Avaliação. 4. Eficiência (Serviço público). I. Universidade Federal da Bahia. Escola de Administração. II. TÃtulo. CDD – 361.61 RENATA DIAS COSTA AVALIAÇÃO DE POLÃTICAS PÚBLICAS: UMA AVALIAÇÃO DA PERCEPÇÃO DO PROJETO DE IRRIGAÇÃO DE PONTO NOVO-BA Dissertação aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Administração, Escola de Administração da Universidade Federal da Bahia. Banca Examinadora Profa. Dra. Elizabeth Matos Ribeiro - Orientadora________________________________ Doutora em Ciência PolÃtica e da Administração pela Universidade de Santiago de Compostela Universidade Federal da Bahia Profa. Dra. Rosana de Freitas Boullosa ______________________________________ Doutora em PolÃticas Públicas pela Università IUAV di Venezia Universidade Federal da Bahia Prof. Dr. Weslei Gusmão Piau Santana ______________________________________ Doutor em Administração pela Universidade Federal da Bahia Universidade do Sudoeste da Bahia Aos meus amores, Gabriel e Pablo, aos meus pais Renato e Edymary, e a minha avó mãe Iaiá. AGRADECIMENTOS À Deus, por estar comigo em todos os momentos e sempre fazer cumprir as suas promessas em minha vida. A minha pequena alma é grata à sua misericórdia! Ao meu filho Gabriel, que tão pequeno sempre entendeu a necessidade de minhas ausências e me deu ânimo com seu jeito tão carinhoso de me amar. Você é minha vida! Ao meu marido Pablo Sá, que chegou à minha vida justamente neste momento final do Mestrado e de novas decisões profissionais, e que a todo o momento foi compreensivo, parceiro, amigo, apaixonado e dedicado. Amo-te muito e sou grata a Deus por ter me presenteado com você! Aos meus pais e à minha avó “Iaiáâ€, que foram fundamentais para a realização deste sonho. Obrigada mãe pela paciência, pelo apoio e pelo amor! Obrigada pai pelas idas e vindas para me levar aos destinos que eram tantos (Universidade, trabalho, casa, escola de Gabriel...), e pela paciência, cuidado e amor que sempre dispensou a mim! Obrigada vó pela mulher guerreira que é e por todo amor e apoio que sempre me deu, sem reservas! Amo vocês! A Ricardinho, meu sobrinho-filho, por todo amor, presença, carinho e “surpresas†todas as vezes que fazia questão de ir me buscar no trabalho, na UFBA, mesmo depois de dormir deitado no banco do carro de tanto esperar. Te amo meu filho! À Professora Elizabeth Matos, minha orientadora, pelo apoio e confiança! Aos amigos que fiz neste percurso e que agora fazem parte da minha vida e da minha história, em especial a Morjane Santos e Fabiane Louise. Beijos no coração de vocês! Ao Núcleo de Pós-Graduação em Administração da UFBA por toda atenção e apoio prestados! A todos os Professores do Mestrado pela competência e profissionalismo! A todos os amigos, que de alguma forma também fizeram parte deste sonho. Aos amigos da Cairu, aos amigos do Ministério de Música Vitória Certa e a todos os outros, que, mesmo não citados, sabem que ocupam um lugar especial no meu coração. “Não fosse isso e era menos. Não fosse tanto e era quase†(Paulo Leminski, 1980) RESUMO COSTA, Renata Dias. Avaliação de PolÃticas Públicas: uma análise do Projeto de Irrigação de Ponto Novo-BA. 152 p. Dissertação (Mestrado) – Escola de Administração. Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2013. O presente estudo teve como objetivo analisar o processo de implementação do Projeto de Irrigação de Ponto Novo-BA, de modo a identificar os principais aspectos que tem facilitado ou obstaculizado o alcance da polÃtica pública. Tal pesquisa justifica-se, pois, o grande desafio para a disseminação dos instrumentos de avaliação de programas e projetos no setor público é justamente encontrar pressupostos teórico-metodológicos que permitam mensurar, de forma confiável, o desempenho das polÃticas e construir uma base de análise consistente. Trata-se de uma pesquisa exploratória, de abordagem qualitativa, dividida em duas etapas: na primeira buscou-se desenhar um instrumento que permitisse proceder à análise da eficácia da polÃtica e o planejamento da pesquisa de campo; na segunda etapa, voltou-se para a devida análise dos dados obtidos sobre a referida polÃtica. Os resultados encontrados apontam que a implementação do Projeto de Irrigação de Ponto Novo não atingiu a eficácia, quando considerados os instrumentos de análise utilizados. Por fim, ressaltamos que o caminho para a eficácia em polÃticas públicas não pode ser percorrido unilateralmente, cabendo ao poder público municipal e a sociedade o compromisso de direcionar as polÃticas públicas para a realidade local. Palavras-chave: PolÃticas Públicas. Avalição de PolÃticas Públicas. Eficácia em PolÃticas públicas. ABSTRACT COSTA, Renata Dias. Evaluation of Public Policy: An Analysis of the Irrigation Project of Ponto Novo-BA. 152 p. Dissertação (Mestrado) – Escola de Administração. Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2013. The present study aimed to analyze the implementation process Irrigation Project Ponto Novo - BA in order to identify the key aspects that have facilitated or hindered the achievement of public policy. Such research is justified because the great challenge for the spread of instruments for evaluating programs and projects in the public sector is just finding theoretical and methodological assumptions that allow to measure reliably, policy performance, and build a base of analysis consistent. This is an exploratory, qualitative study, divided into two stages: first we sought to design a tool that allows to analyze the effectiveness of the policy and planning of field research in the second stage, turned to the proper analysis of the data obtained on this policy. The results show that the implementation of the Irrigation Project of Ponto Novo not reached the efficiency, when considering the analytical tools used. Finally, we emphasize that the way for effective public policy can not be followed unilaterally, leaving the municipal authority and the company's commitment to direct public policies to local realities. Keyword: Public Policies. Evaluation of Public Policies. Effectiveness in Public Policy. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 O Ciclo da PolÃtica segundo Howlett e Ramesch 34 Figura 2 Os três fluxos do processo decisório e a entrada de temas na agenda de governos 36 LISTA DE QUADROS Quadro 1 As fases do processo decisório em diferentes estudos sobre análise de polÃticas 33 Quadro 2 Diferentes tipos de polÃticas públicas 43 Quadro 3 Relação entre classificações de avaliação existentes e o ciclo da polÃtica 54 Quadro 4 As fases das polÃticas e as questões que se apresentam na análise de cada fase 55 Quadro 5 Sistematização Metodológica (Objetivos EspecÃficos) 70 Quadro 6 Categorias e subcategorias para análise da eficácia de polÃticas públicas 72 Quadro 7 Atores Institucionais 74 Quadro 8 CaracterÃsticas Fundamentais. MunicÃpio de Ponto Novo. Bahia. Brasil. 2007 82 Quadro 9 PGRH – Componente Estrutural 84 Quadro 10 Atores do Projeto de Irrigação de Ponto Novo 102 SIGLAS E ABREVIATURAS ABDI – Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial CDL – Câmara de Dirigentes Lojistas CNPJ – Cadastro Nacional de Pessoa JurÃdica COMUA – Comissão de Usuário de Ãgua EBDA – Empresa Baiana de Desenvolvimento AgrÃcola EVA – Estudo de Viabilidade Ambiental FGTS – Fundo de Garantia do Tempo de Serviço IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e EstatÃstica INSS – Instituto Nacional do Seguro Social NEEP – Núcleo de Estudos de PolÃticas Públicas PDDU - Plano Diretor De Desenvolvimento Urbano PDU – Plano Diretor Urbano ou Plano Desenvolvimento Urbano PFL – Partido da Frente Liberal PGRH – Programa de Gerenciamento de Recursos HÃdricos PT – Partido Dos Trabalhadores SEAGRI – Secretária da Agricultura, Pecuária, Irrigação, Reforma Agrária, Pesca e Aqüicultura SEI – Superintendência de Estudos Sociais e Econômicos SEPLAN – Secretaria do Planejamento SIR – Superintendência de Irrigação SUMÃRIO 1 INTRODUÇÃO 14 1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA E SITUAÇÃO PROBLEMA 17 1.2 JUSTIFICATIVA 20 1.3 OBJETIVOS DA PESQUISA 20 1.4 ESTRUTURA DO TRABALHO 21 2 REFERENCIAL TEÓRICO E CONCEITUAL 23 2.1 POLÃTICAS PÚBLICAS 23 2.1.1 Ciclo de PolÃticas Públicas 31 2.1.2 Tipos de PolÃticas Públicas 42 2.2 AVALIAÇÃO DE POLÃTICAS PÚBLICAS 45 2.2.1 Tipos de Avaliação de PolÃticas Públicas 48 2.2.2 Avaliação da Implementação de PolÃticas Públicas 58 2.2.3 Eficiência, Eficácia e Efetividade em PolÃticas Públicas 63 2.2.3.1 Eficiência em PolÃticas Públicas 63 2.2.3.2 Eficácia em PolÃticas Públicas 64 2.2.3.3 Efetividade em PolÃticas Públicas 65 3 ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA 67 3.1 ABORDAGEM METODOLÓGICA 67 3.2 ETAPAS DA PESQUISA 71 3.2.1 Primeira etapa: Desenho do instrumento de avaliação 72 3.2.2 Segunda etapa: Planejamento da pesquisa de campo 73 3.2.3 Instrumento de coleta de dados 73 3.2.4 Análise de dados 74 3.3 PREMISSAS E PRESSUPOSTOS 74 4 UMA REFLEXÃO SOBRE O LÓCUS DA PESQUISA E SUA CARACTERIZAÇÃO 78 4.1 CARACTERIZAÇÃO DO MUNICÃPIO DE PONTO NOVO 78 4.1.1 Um breve histórico do MunicÃpio 78 4.1.2 CaracterÃsticas 80 4.2 CARACTERIZAÇÃO DO PROJETO DE IRRIGAÇÃO DE PONTO NOVO 82 4.2.1 Objetivos 83 4.2.2 Investimento 83 4.2.3 Dados gerais do Projeto 84 4.2.4 Componente Estrutural 84 4.2.5 Principais obras 85 4.2.6 Coordenação do Projeto 85 4.2.7 Gestão do Projeto 86 4.2.8 Etapas do Projeto 86 5 ANÃLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 89 5.1 ANÃLISE DA EFICÃCIA DA POLÃTICA: CATEGORIAS E SUBCATEGORIAS ANALISADAS 89 5.1.1 Categoria 1: Engenharia Institucional e traços que constituem a polÃtica 89 5.1.1.1 Subcategoria 1.1 – Clareza dos objetivos, metas e direção da polÃtica 90 5.1.1.2 Subcategoria 1.2 – Recursos necessários 90 5.1.1.3 Subcategoria 1.3 – Cumprimento dos objetivos, metas e prazos 96 5.1.2 Categoria 2: Atuação dos atores envolvidos 102 5.1.2.1 Subcategoria 2.1 – Clareza no processo de construção da estratégia e divisão das atribuições e responsabilidades 102 5.1.2.2 Subcategoria 2.2 – Participação e compreensão da polÃtica por parte dos atores envolvidos 105 5.1.3 Categoria 3: Condições institucionais e sociais dos resultados 110 5.1.3.1 Subcategoria 3.1 – Fatores facilitadores que operam ao longo do processo de implementação da polÃtica 110 5.1.3.2 Subcategoria 3.2 – Obstáculos que operam ao longo do processo de implementação da polÃtica 111 6. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES 119 REFERENCIAS 128 Apêndice A – Entrevista SEAGRI 134 Apêndice B – Entrevista Distrito de Irrigação 136 Apêndice C – Entrevista Prefeitura 144 Apêndice D – Entrevista EBDA 146 Apêndice E – Entrevista SÃtio Barreiras 149 Apêndice F – Entrevista Sindicato dos Assentados 152 14 1. INTRODUÇÃO As polÃticas públicas brasileiras que eram promovidas pelo Estado até o inÃcio da década de 80 do século passado caracterizavam-se pelo processo decisório e capacidade de financiamento centralizado nas mãos do Estado, reflexo dos padrões de administração pública concebido em Vargas e concluÃdo pelos militares. Neste contexto, cabia aos Estados e MunicÃpios apenas a execução das polÃticas formuladas pelo governo central. A articulação entre governos estaduais, municipais e governo federal se estabelecia com base na troca de favores de cunho clientelista, fundamentado na chamada polÃtica dos governadores. O atendimento das demandas e necessidades da sociedade era controlado pelo governo federal deixando as esferas regionais e locais totalmente subordinadas à s prioridades e decisões da União. As polÃticas públicas neste perÃodo se caracterizavam pela fragmentação institucional e, esse crescimento desordenado do aparato estatal acabou gerando uma sobreposição de agências governamentais que passou a funcionar sem a devida coordenação e acabaram dificultando o desenvolvimento de ações administrativas articuladas e integradas entre si. Tal deformação acabou implicando, por um lado, limitações no alcance da eficácia das polÃticas, por outro, provocou o afastamento da sociedade civil do processo de formulação e implementação de polÃticas públicas. Desta forma, o processo decisório revelava o predomÃnio do clientelismo, do corporativismo e do insulamento burocrático. Mas cabe ressaltar que ao longo dos últimos vinte anos, após a promulgação da Constituição Federal de 1988 e a consolidação do processo democrático, o Estado brasileiro vem passando por transformações que tendem a redirecionar a forma de conceber e gerir polÃticas públicas. Essas mudanças estão centradas no esforço governamental e também social de se implementar um modelo de gestão pública pautado nos princÃpios constitucionais que fundamentam a democracia, especialmente os que fomentam a criação e consolidação de instrumentos de co- gestão ou co-produção das polÃticas públicas. Observam-se, portanto, evidências de esforços empreendidos no sentido de avançar no aprimoramento da relação entre os atores sociais e institucionais em âmbito nacional, regional e local. Ao lado desta preocupação em se implantar processos de democratização e garantia da equidade social, foram incorporadas na 15 agenda pública, a partir da reforma gerencial do Estado (de 1995) preocupações com o alcance de indicadores melhores de eficiência, eficácia e efetividade das polÃticas. É neste contexto, portanto, que o debate acerca da avaliação de polÃticas públicas ganha relevância e passa a assumir a avaliação como um instrumento imprescindÃvel para dimensionar a viabilidade de programas, projetos e ações, a partir da capacidade de não medir desempenho, mas principalmente de possibilitar caminhos alternativos para a reformulação e/ou redirecionamento dos objetivos das ações governamentais. Entretanto, essa prática apesar de ter assumido lugar de destaque nos discursos e planos de governos tem se revelado, ainda, bastante incipiente, em especial quando focaliza a avaliação de desempenho, resultados e impactos de polÃticas, programas, projetos e ações públicas. Embora se observe um crescente reconhecimento por parte do governo da importância da prática de avaliação como um importante instrumento de gestão e gerência, pois favorece conhecer, compreender, aperfeiçoar e (re)orientar ações que visam o aperfeiçoamento ou realinhamento das ações do Governo, a administração pública brasileira ainda revela posturas conservadoras em relação a tais práticas. Tal comportamento se torna mais evidente quando se observa uma grande dificuldade em se utilizar a avaliação como instrumento (re)orientador das ações administrativas, seja no âmbito do governo federal, estadual e principalmente na esfera municipal. Quando se observa um maior empenho por parte do governo em implantar mecanismos/sistemas de avaliação, muitas vezes até bastante sofisticados, esse compromisso tem se limitado apenas a cumprir exigências formais por parte das agências governamentais ou multilaterais de investimento ou mesmo como forma de cumprir obrigações legais. Essa constatação permite antecipar uma conclusão do estudo de que as diversas instâncias governamentais brasileiras têm perdido a oportunidade de utilizar a avaliação como um importante instrumento de aprendizagem de novas práticas administrativas. Neste sentido, a presente pesquisa definiu como objetivo central contribuir para essa discussão na medida em que se propõe a avaliar a eficácia do Projeto de Irrigação de Ponto 16 Novo/BA, entendido como uma polÃtica pública relevante para a promoção do desenvolvimento socioeconômico do estado da Bahia. O estudo pretende identificar, pois, os aspectos facilitadores e obstacularizadores do processo de implementação do projeto de irrigação avaliado. Para tanto, além dos dados obtidos a partir do instrumento de análise desenhado, conforme descrito na seção que trata da abordagem metodológica (CapÃtulo 3), contou com as contribuições alcançadas pelo estudo realizado por Souza (2010), que discute os precedentes e consequências regionais da polÃtica, e pelo trabalho desenvolvido por Silva (2008), que discorre sobre o processo de implantação da barragem, na perspectiva do processo de reordenação territorial e da ação do estado, além dos dados e informações resultantes da pesquisa exploratória realizada. Os citados trabalhos contribuÃram, pois, para uma melhor compreensão da caracterização da região e do projeto em si, como também aportaram uma aproximação à composição social e resultados alcançados pelo Projeto de Irrigação de Ponto Novo, a partir da avaliação do seu processo de implementação, conforme apresentados no capÃtulo 5 deste trabalho. Cabe destacar, pois, que os trabalhos citados foram de relevância para o desenvolvimento deste estudo na medida em que, permitiu a autora avançar tanto na pesquisa exploratória quanto nos aspectos relativos à avaliação da eficácia da polÃtica, com ênfase na análise de polÃticas publicas. O Projeto de Irrigação de Ponto Novo é entendido, aqui, como um projeto de polÃtica pública, pois, conforme será ressaltado nos estudos teóricos sobre o tema (CapÃtulo 2), nasce em dado contexto polÃtico e histórico e para sua concepção e implementação contribuÃram diversos interesses sociais entre atores que se relacionam de forma complexa e cujo desenho e atual estágio de evolução de tal polÃtica derivam dessas complexas interações. Quanto à definição de programa constata-se que é compreendido como um espaço organizacional privilegiado de aprendizado e criatividade, aberto à margem da rotina e dos procedimentos de uma organização ou de várias organizações e, onde, por um tempo definido e com um orçamento especÃfico, são desenvolvidos e testados novos procedimentos, métodos e enfoques que serão incorporados posteriormente à organização-alvo, conforme destaca Fischer (2002). 17 Quanto à definição de um programa especÃfico, como é o caso do Projeto de Irrigação analisado nesta pesquisa, assume-se o conceito de Carvalho (1988, p. 336) que argumenta que “a irrigação apresenta uma capacidade de transformação da estrutura produtiva, que funciona, de certa forma, autonomamente (...)†e “(...) o uso inadequado ou intensivo dos recursos pode gerar consequências mais gravesâ€. Como já ressaltado, o projeto de irrigação, unidade de análise deste estudo, foi iniciado no municÃpio de Ponto Novo-BA, em 1999, municipalidade predominantemente rural, marcado pela presença de pequenas propriedades produtivas. Cabe ressaltar nesta breve caracterização do espaço avaliado que Ponto Novo, assume caracterÃsticas ainda mais dramáticas na medida em que integra a ampla região baiana que sofre com as adversidades climáticas que condicionam a dinâmica socioprodutiva do semiárido baiano. Nesse sentido, a implantação da barragem e irrigação de Ponto Novo representava uma possibilidade relevante para viabilizar o desenvolvimento agrÃcola local e regional. Mas pode- se antecipar a modo de conclusão que a experiência deste projeto de irrigação revela ser uma polÃtica pública marcada pelas fragilidades ambientais, econômicas e sociais e abalizada ainda por algumas especificidades culturais. 1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA E SITUAÇÃO PROBLEMA As necessidades de avaliação em polÃticas públicas estão, em geral, associadas a problemas verificados no processo de implementação de seus programas, pois estas dificilmente conseguem atingir os objetivos e metas propostas e raramente são implementados de acordo com o desenho original traçados por seus formuladores, conforme defende Cavalvanti (2010). Neste contexto, destacam-se dois fatores que têm exercido grande influência na implementação dos programas públicos no Brasil: (a) as fortes assimetrias que tem marcado historicamente o padrão do federalismo nacional; e (b) as limitações do recente processo de consolidação da democracia (ARRETCHE, 2007). Cabe acrescentar a esses dois fatores o fato de que as polÃticas públicas sofrem fortes, e muitas vezes nefastas influências da fragilidade e incongruências do sistema polÃtico (sistemas de partidos) vigente no paÃs. Os fatores partidários tem exercido, nesses casos, um papel negativo, pois exercem influência perversa nas relações entre os grupos de interesses 18 locais. Tal cenário tem comprometido negativamente os resultados e efeitos advindos das polÃticas públicas implementadas em âmbito local e regional. Diante o exposto, o grande desafio para a disseminação dos instrumentos de avaliação de programas e projetos no setor público é justamente encontrar pressupostos teórico- metodológicos que permitam mensurar, de forma confiável, o desempenho das polÃticas e construir uma base de análise consistente que permita desencadear processos de aprendizagens com vistas à promoção de mudanças efetivas nas práticas de gestão pública em âmbito local e regional. Os desafios para analisar os motivos pelos quais o Projeto de Irrigação em implementação no MunicÃpio de Ponto Novo, enquanto polÃtica pública, não tem alcançado os resultados esperados são enormes. Essas dificuldades se confirmam tanto nos resultados das pesquisas desenvolvidas por Souza (2010) e Silva (2008) quanto pelas entrevistas realizadas e observação in loco. Nesse sentido, os desafios de se compreender os fatores que reforçam esse desempenho negativo no municÃpio e na região, medido pelo volume expressivo de investimento despendido sustentaram a base analÃtica desta pesquisa. Desse modo, um dos objetivos centrais deste estudo foi, portanto, contribuir para uma avaliação contextualizada sobre o evento, de modo a reconhecer e valorizar os processos e sujeitos envolvidos na implementação da polÃtica. No que se refere aos aspectos metodológicos optou-se pela modalidade de “avaliação de polÃticas públicas†a partir da percepção dos atores envolvidos, onde se buscou analisar a engenharia institucional e os traços constitutivos do projeto objeto deste estudo, considerando, pois, que qualquer polÃtica pode ser formulada e implementada de diversos modos, tomando como base, portanto, a definição de Arretche (1998). Por outro lado, foi dada ênfase na reconstituição das caracterÃsticas que marcaram o processo de implementação da polÃtica de Irrigação de Ponto Novo, de forma a apreendê-la em um todo coerente e compreensÃvel, dando, segundo Mattos e Baptista (2011), sentido e entendimento à s ambiguidades, incoerências e incertezas presentes em todos os momentos e estágios da ação pública avaliada. Desta forma, pretendeu-se identificar os fatores facilitadores e os obstacularizadores que fundamentaram o longo e tortuoso processo de implementação do Projeto de Irrigação de 19 Ponto Novo, sem se preocupar, neste momento, com os resultados diretamente alcançados. Neste caso, ainda que se possa atribuir alguns resultados prováveis, não se objetivou, neste momento, atribuir uma relação de causalidade entre o Projeto e seus resultados. Para tanto, tomou-se como pilar da pesquisa o conceito de “avaliação de eficáciaâ€, que de acordo com Draibe (2001), diz respeito a analisar se a medida da consecução dos resultados almejados é dada pelo predomÃnio dos fatores facilitadores. Buscou-se, também, identificar os obstáculos para o alcance destes resultados. Neste sentido, Arretche (2001) destaca a avaliação de eficácia como aquela que relaciona diretamente objetivos e instrumentos explÃcitos de um programa com seus resultados alcançados. Assim, interessa responder neste estudo à seguinte pergunta: Quais os principais fatores facilitadores e/ou obstacularizadores que tem influenciado o alcance da eficácia do processo de implementação do Projeto de Irrigação de Ponto No- vo-BA? Como o contexto da problematização está associado ao conceito de eficácia da polÃtica pública, indicando os aspectos facilitadores e/ou obstacularizadores para o alcance das metas e objetivos desse instrumento, apresenta-se a seguir as metas e objetivos da polÃtica avaliada delineados no Plano Diretor de Recursos HÃdricos da Bacia do Itapicuru, que, inicialmente propôs as ações abaixo, que fundamentam a análise proposta: a) Ações de desenvolvimento ï‚· Implantação de novos barramentos (Recursos hÃdricos superficiais); ï‚· Aproveitamento de barramentos existentes (Recursos hÃdricos superficiais); ï‚· Exploração de águas subterrâneas; ï‚· Desenvolvimento hidro agrÃcola. b) Ações setoriais de irrigação – Fornecer à sociedade civil, à s entidades governamentais as indicações necessárias ao desenvolvimento ordenado e racional da irrigação da bacia de forma sustentada e compatÃvel com as disponibilidades e caracterÃsticas dos solos e dos recursos hÃdricos; c) Ações setoriais de saneamento; 20 d) Ações setoriais de preservação ambiental; e) Ações setoriais de apoio e implementação; f) Controle de doenças de via de veiculação hÃdrica; g) Abastecimento de água para consumo humano atingindo 80% da população de toda bacia. 1.2 JUSTIFICATIVA Optou-se pela avaliação do Projeto de Irrigação do MunicÃpio de Ponto Novo pelos seguintes motivos: (1) A relevância da avaliação de polÃticas públicas, que, apesar do reconhecimento atual pela administração pública brasileira, revela que sua utilização ainda é bastante restrita; (2) A importância do conhecimento cientÃfico acerca do tema, pois, embora a avaliação tenha alcançado um nÃvel relevante de difusão entre as comunidades acadêmica, polÃtica e técnica, ainda não é possÃvel observar uma cultura consistente de avaliação no Brasil, devidamente consolidada e continuamente integrada, como instrumento decisivo para o processo de gestão pública; (3) Trata-se do maior projeto de Irrigação realizado com recursos estaduais na Bahia, na década de 90, resultado de um investimento já realizado de R$ 60 milhões, em parceria com o Banco Mundial, e da aplicação de recursos obtidos através do fundo criado com a privatização da Coelba; e (4) O reconhecimento dos desafios que o projeto enfrenta para concluir a sua implementação. Além disso, trata-se de uma região que vem sendo abordada por diversos estudos, devido ao caráter inovador do Projeto de Irrigação, assim também pelos altos investimentos governamentais ali realizados. Como destaca Souza (2010, p. 210), “a gestão da água e a irrigação vêm sendo trabalhadas como possÃveis soluções para as regiões nordestinas que formam o semiáridoâ€. Destaque-se ainda, nesta justificativa, a escolha do recorte temporal da pesquisa, que contempla o inÃcio da fase de implementação do projeto ao seu momento atual; a saber, os anos de 1999 a 2012. 1.3 OBJETIVOS DE PESQUISA Esta pesquisa tem como objetivo geral avaliar a eficácia do processo de implementação do Projeto de Irrigação de Ponto Novo-BA, de modo a identificar os principais aspectos que tem facilitado ou obstaculizado o alcance da polÃtica pública. 21 Para viabilizar o alcance deste objetivo geral, propõem-se os seguintes objetivos especÃficos: (1) Compreender os aspectos teórico-metodológicos que fundamentam os processos de avaliação em polÃticas públicas, com foco na modalidade de análise da eficácia; (2) Identificar e/ou desenhar instrumentos metodológicos que possibilitem analisar a eficácia do Projeto de Irrigação de Ponto Novo-BA; (3) Compreender, de forma crÃtica e contextualizada, o projeto, seu enquadramento institucio- nal, seus ciclos de implementação, a dinâmica que caracteriza a atuação dos principais atores envolvidos, os objetivos pretendidos, o público-alvo beneficiado diretamente com a polÃtica, os critérios de inclusão e seleção dos reassentados e dos empresários locais, os benefÃcios re- cebidos pelos participantes e a presença ou não de condicionalidades; (4) Verificar se a polÃtica tem conseguido alcançar os objetivos e metas definidos na formulação e/ou revisão do Projeto; e (5) Identificar os pontos crÃticos do processo de implementação da polÃtica, ressaltando os aspectos facilitadores e/ou obstacularizadores no alcance da eficácia planejada. 1.4 ESTRUTURA DO TRABALHO Além do capÃtulo 1, parte inicial do trabalho, que teve por objetivo introduzir o tema de pesquisa e contextualizá-lo, bem como apresentar o problema de pesquisa e seus objetivos, a presente dissertação está estruturada em mais cinco capÃtulos. O capÃtulo 2 apresenta o referencial teórico da pesquisa, compondo-se de duas seções: PolÃticas Públicas; e Avaliação de PolÃticas Públicas, com destaque para a modalidade de análise da eficácia de polÃticas públicas. No capÃtulo 3 apresentam-se os aspectos metodológicos da pesquisa, com destaque para os instrumentos, estruturados em 5 grandes seções: Abordagem Metodológica; Estratégia de Pesquisa; Premissas; Modelo de Análise, sendo este composto por duas subseções, e a Apresentação do Modelo de Análise e as Premissas. No capÃtulo 4, apresenta-se uma reflexão acerca do lócus da pesquisa e sua caracterização. 22 No capÃtulo 5, de caráter empÃrico, apresenta-se a análise dos resultados da pesquisa, dividindo-se em dois momentos: (1) a análise geral do Projeto de Irrigação do MunicÃpio de Ponto Novo, com vistas a conhecer os seguintes aspectos: enquadramento institucional, ciclos de implementação, objetivos pretendidos, público-alvo, critérios de inclusão e seleção dos reassentados e empresários locais, benefÃcios recebidos pelos participantes e a presença ou não de condicionalidades; e (2) a análise do processo de implementação do Projeto, com vistas a conhecer os seguintes aspectos: caracterização do processo de implementação e pontos crÃticos no processo de implementação. O capÃtulo 6, última parte do trabalho, traz as considerações finais, limitações da pesquisa e sugestões para trabalhos futuros. A seguir, apresenta-se o referencial teórico utilizado para dar embasamento a este trabalho, sustentando as premissas e os pressupostos concernentes à pesquisa. 23 2. REFERENCIAL TEÓRICO E CONCEITUAL Este capÃtulo visa apresentar o referencial teórico utilizado para dar embasamento a este trabalho. Nele foi abordado o tema “PolÃticas Públicas†por tratar do reconhecimento da necessidade de compreensão dos aspectos teóricos que fundamentam as polÃticas públicas, analisadas em sua ordem, limites e lógica, para que seja possÃvel individualizar a polÃtica em questão, e o tema “Avaliação em PolÃticas Públicasâ€, por tratar do fenômeno em análise. 2.1 POLÃTICAS PÚBLICAS Enquanto área do conhecimento, polÃticas públicas nasce nos EUA, como subárea da ciência polÃtica com ênfase nos estudos sobre as ações dos governos nos anos 50 e chega à comunidade acadêmica européia duas décadas depois (SOUZA, 2006). Por tratar-se de um tema complexo que envolve as relações sociais, em especial as relações Estado-Sociedade observa-se uma grande diversidade de conceitos de polÃticas públicas. Para os estudos correntes sobre o tema, a área de polÃticas públicas contou com quatro grandes fundadores, dentre os quais podem ser destacados H. Laswell, H. Simon, C. Lindblom e D. Eeaston, conforme apresenta Souza (2006): Laswell (1936) introduz a expressão policy analysis (análise de polÃtica pública), ainda nos anos 30, como forma de conciliar o conhecimento cientÃfico/acadêmico com a produção empÃrica dos governos, e ainda, como forma de estabelecer o diálogo entre cientistas sociais, grupos de interesse e governo. Para ele, é preciso refletir sobre o poder que é destinado ao Estado, pois, o Estado é o único produtor de polÃticas públicas. No Pós-Segunda Guerra Mundial, em 1951, ganhou destaque o argumento de que havia a necessidade de um campo especÃfico de conhecimento para analisar as polÃticas. Laswell (1951) então, apresentou o conceito de policy sciences para definir alguns métodos cujos objetivo era investigar os processos polÃticos, ao mesmo tempo que, os resultados de tais análises seriam contribuições para compreender e orientar as ações do governo, conforme destacam Mattos e Baptista (2011, p.61): Firmava-se, a partir de então, um campo de análise com foco na atuação dos governos e com objetivo de orientar a ação dos mesmos, tendo como principal elemento de 24 análise as polÃticas públicas, definidas como respostas dos governos à s demandas, problemas e conflitos que afloram de um grupo social, sendo o produto de negociações entre os diferentes interesses, mediados pela racionalidade técnica, com vistas à manutenção de uma ordem. Simon (1957) incluiu o conceito de racionalidade limitada para definir o papel dos “fazedores†de polÃticas (policy makers) argumentando, sobretudo, que a limitação da racionalidade poderia ser minimizada pelo „conhecimento racional‟. Lindblom (1959; 1979), por sua vez, questionou a ênfase dada ao racionalismo de Laswell e Simon e propôs a incorporação de outras variáveis para a formulação e análise de polÃticas públicas tais como as relações de poder e a integração entre as diferentes fases do processo decisório. Ao questionar a ênfase dada ao racionalismo, reforça a importância destas novas variáveis no avanço do conceito de polÃticas públicas. Easton (1965) contribui com esse debate ao definir polÃtica pública como um sistema, ou seja, como uma relação entre formulação, resultados e o ambiente. Para esse autor, polÃticas públicas recebem inputs dos partidos, da mÃdia e dos grupos de interesse, que influenciam seus resultados e efeitos, e assim, é possÃvel perceber uma relação de interdependência entre o sistema polÃtico e o ambiente externo. À visão dos autores clássicos sobre o conceito de PolÃtica Pública cabe acrescentar as contribuições de Mead (1995) que define polÃtica pública como um campo dentro do estudo da polÃtica que analisa o governo à luz de questões públicas. Destaca, pois, que as questões públicas de grande porte (ou as polÃticas públicas de grande relevância) contribuem para a análise das ações do governo, defendendo que a polÃtica pública integra um processo maior que é a própria polÃtica, conforme destacam Mattos e Baptista (op cit): (...) falar de polÃtica pública no âmbito de discussão deste campo de conhecimento remete ao processo de construção de uma ação governamental para um setor, do que se denominou por algumas correntes „Estado em ação‟, considerando recursos, atores polÃticos, espaços institucionais (arenas), ideias e negociação, como se fosse possÃvel por um exercÃcio analÃtico e racional prever e determinar mudanças, bastando para isso o uso da boa técnica analÃtica, o estudo e a análise dos caminhos de uma polÃtica pública. 25 Lynn (1980), em comunhão com os autores citados, define polÃtica pública como um conjunto de ações do governo que irão produzir efeitos especÃficos. Para ele, uma das funções primordiais do Estado é, portanto, formular e implementar polÃticas públicas. Peters (1986) acrescenta a essa discussão que polÃtica pública é a soma das atividades dos governos que agem diretamente ou através de delegação e que influenciam a vida dos cidadãos. Dye (1984), por sua vez, acrescenta elementos ainda mais complexos a essa conceituação afirmando que polÃtica pública “é tudo o que o governo escolhe fazer ou não fazerâ€. Buscando encontrar uma sÃntese possÃvel nesse debate, Teixeira (2002, p. 02) afirma que: Elaborar uma polÃtica pública significa definir quem decide o quê, quando, com que consequências e para quem. São definições relacionadas com a natureza do regime polÃtico em que se vive, com o grau de organização da sociedade civil e com a cultura polÃtica vigente. Nesse sentido, cabe distinguir “PolÃticas Públicas†de “PolÃticas Governamentaisâ€. Nem sempre “polÃticas governamentais†são públicas, embora sejam estatais. Para serem “públicasâ€, é preciso considerar a quem se destinam os resultados ou benefÃcios, e se o processo de elaboração é submetido ao debate público. No esforço de sintetizar os conceitos apontados Souza (2006) destaca que o pressuposto analÃtico que rege a constituição e a consolidação dos estudos sobre polÃticas públicas integra duas dimensões interligadas entre si: (a) o de que em democracias estáveis aquilo que o governo faz ou deixa de fazer é passÃvel de ser; e (b) esse conceito é formulado cientificamente e analisado por pesquisadores independentes. Para Saravia e Ferrarezi (2006) a polÃtica pública representa um fluxo de decisões públicas orientado a manter o equilÃbrio social ou introduzir desequilÃbrios para modificar essa realidade. Acrescenta os autores que em uma perspectiva mais operacional, o conceito em tela inclui um sistema de decisões públicas que visa ações ou omissões, preventivas ou corretivas, destinadas a manter ou modificar a realidade de um ou vários setores da vida social, através de objetivos e estratégias de atuação e alocação dos recursos necessários para cumprir os objetivos previstos, conforme ressaltam Mattos e Baptista (op cit, p. 62): Assim, ganha relevância algumas perguntas do tipo: como e quem participa da definição dos problemas no âmbito dos governos? Os enunciados apresentados em torno de um problema são suficientes? Que problemas ficam de fora dos debates governamentais e quem se dedica a eles? O que cabe ao analista de polÃtica que tem a 26 pretensão de produzir conhecimento? Afinal, quem pesquisa os problemas que não são reconhecidos como problemas de governo? Não deveria ser a ciência à quela a tratar do que o governo não prioriza e colocar em discussão o próprio Estado? Cabe destacar nesse debate as contribuições mais recentes de Capano e Giuliani (1998) ao afirmar que uma polÃtica pública é um construto (social), uma abstração, e não um objeto em si. Acrescentam que a polÃtica pública é uma construção ideal para a solução de um problema identificado como socialmente relevante. Para os autores, a definição e compreensão de PolÃtica Pública integram leis, discursos, comportamentos administrativos, propostas técnicas, questões orçamentárias, manifestações públicas, atitudes lobistas de atores, setores e grupos sociais distintos, entre outros. Com base nesses pressupostos, o que caracteriza cada polÃtica pública, então, seria a forma como estes elementos se manifestam e se relacionam. Nesse sentido, Araujo (2010) defende que as polÃticas públicas precisam ser estudadas em sua ordem, limites e lógica para que seja possÃvel individualizar a polÃtica em questão. Reforçando essa perspectiva analÃtica, Fernandes (2007) argumenta que o desempenho dos governos é marcado pela qualidade do processo polÃtico o que implica então, que os resultados das ações governamentais têm relação direta com o comportamento dos atores sociais e polÃticos nas arenas decisórias. Com base nessa leitura crÃtica, Boullosa (2007) conceitua polÃticas públicas como “uma ação pública, sobretudo, complexa e multiatorial voltada ao tratamento de problemas de relevância pública e socialâ€. A autora entende por polÃtica pública o processo complexo de definição, elaboração e implantação de estratégias de ação, por parte do governo, na identificação e seleção de determinados problemas sociais a serem resolvidos. Nesse aspecto, Mattos e Baptista (2011, p. 67) corroboram com esta nova abordagem de análise quando destacam que (...) qualquer polÃtica está associada a construções históricas e modos de operar próprios de cada realidade, de cada Estado. Toda polÃtica insere-se numa trajetória geral e também especÃfica e constitui-se numa institucionalidade, que de alguma forma a condiciona e dá sentido. Os Estados são permeados por instituições que definem práticas e processam caminhos para a ação polÃtica cotidiana. 27 Neste aspecto, Mattos e Baptista (op cit, p. 126) defendem que existem vários motivos que justificam a consideração das instituições para a análise das polÃticas públicas, conforme destacado a seguir: 1. As regras de organização subjacentes ao processo de produção de polÃticas afetam o poder dos atores sobre as decisões no momento da formulação e sobre a implementação das polÃticas – ou seja, as polÃticas não são formuladas ou implementadas pelos atores polÃticos em um “vazio institucionalâ€. Existem regras formais e práticas informais de vários tipos que delimitam as escolhas dos atores ou mesmo condicionam as suas preferências. 2. As polÃticas públicas podem ser afetadas tanto por regras mais gerais, como por regras especÃficas de cada polÃtica (...). 3. A posição dos atores nas redes de instituições e nas organizações pode influenciar a definição dos próprios interesses dos atores, ao estabelecer suas responsabilidades institucionais e relações com outros atores – nesse sentido, as posições e escolhas de um ator podem variar a depender da função desempenhada em uma rede institucional ou organização setorial. 4. As instituições podem influenciar os resultados das polÃticas, embora isoladamente não sejam suficientes para explicá-los – ou seja, para compreender e explicar os motivos pelos quais algumas polÃticas geraram determinados resultados (ou não) é importante considerar os condicionantes institucionais, por exemplo, sob que regras e procedimentos a polÃtica formulada e implementada; mas também questões inerentes ao próprio processo polÃtico tais como se houve quais seriam os “pontos de vetoâ€, os tipos de relações entre os atores, entre outras. Dye (1965) ainda afirma que as instituições governamentais dão à s polÃticas públicas três caracterÃsticas distintas: Inicialmente o governo empresta legitimidade à s polÃticas; Em segundo lugar, as polÃticas governamentais envolvem universalidade; E, finalmente, o governo monopoliza a coerção na sociedade, o que pode comprometer o seu desenvolvimento. Neste sentido, Frey (Op. Cit., p. 230) comenta a importância das condições institucionais no estudo das polÃticas públicas: O desleixo ou menosprezo com os elementos estruturais de polÃtica pela „policy analysis‟ tradicional deve-se, em nosso entender, a sua tradição em atribuir, na análise de processos polÃticos, aos conteúdos da polÃtica uma importância maior do que à s condições institucionais. Por outro lado, deve ter contribuÃdo a esse desleixo o caráter tradicionalmente quantitativo dos estudos de polÃticas públicas, assim como o fato de que boa parte dos estudos que contribuÃram para o desenvolvimento teórico dessa vertente recente da ciência polÃtica têm sido realizados em paÃses com sistemas polÃticos institucionalmente estáveis. E acrescenta, ainda, que: 28 Porém, se nos dedicarmos à análise de sistemas polÃticos em transformação e com instituições não consolidadas, como é o caso dos paÃses da América Latina, do leste da Europa ou, de forma geral, dos paÃses em desenvolvimento, aumenta a tentação de atribuir ao fator “instituições estáveis ou frágeis†importância primordial para explicar o êxito ou fracasso das polÃticas adotadas. (FREY, Op. Cit., p. 230). Em sÃntese, as instituições podem ser vistas como produto de processos polÃticos e que refletem as relações de poder existentes. Por outro lado, Boaventura Santos (Apud Mattos e Baptista, 2011, p. 65) acrescenta nesse debate que “a iniciativa e o poder de decisão sobre o desenvolvimento, longe de ser competência exclusiva do Estado e das elites econômicas, deve residir na sociedade civilâ€: Nesta perspectiva, a análise de polÃticas também se interessa pelas formas de intervenção adotadas historicamente pelas instituições, pelas relações entre atores públicos e privados, pela sociedade civil, pelos pactos, objetivos, metas e perspectivas dos diferentes grupos sociais em disputa, os conceitos e sentidos de polÃtica. Mas para este percurso de análise não dispomos de uma teoria geral ou modelos a priori, é preciso, ao contrário, reconhecer os caminhos especÃficos e dar visibilidade aos processos polÃticos concretos que dão sentido ao enunciado ou prática de uma polÃtica, pois é na prática cotidiana das instituições e das relações sociais que podemos reconhecer elementos do nosso modo de constituir as polÃticas de Estado. É mister lembrar que nesta visão, os atores polÃticos e sociais não agem apenas de acordo com os seus interesses pessoais, ao contrário, suas identidades também influenciam o comportamento nos processos de decisão polÃtica, conforme aponta Frey (Op. Cit., p. 233). Neste sentido, Mattos e Baptista (Op. Cit, p. 188) contribuem para a discussão ao ressaltar que, A decisão de institucionalizar a avaliação, conforme enfatizado por Hartz (2001) exige que seja definida “uma polÃtica de avaliação para a avaliação de polÃticas†com a definição de propósitos e de recursos; definição de tipos de abordagens; localização em organograma das instâncias onde a prática avaliativa deve ser desenvolvida e as relações que devem ser estabelecidas para utilização dos seus resultados. Afinal não basta avaliar polÃticas, completar um ciclo com a verificação da influência da avaliação e a utilização dos resultados para a melhoria da polÃtica. No entanto o investimento numa cultura avaliativa implica necessariamente no aprendizado e na apropriação sobre desenhos e abordagens de avaliação. Afinal, a avaliação requer uma aproximação e um debruçar sobre questões remetidas ao por que, para que, para quem, como, de forma a potencializa-la como instrumento que faça parte da vida institucional e não apenas como objeto de legitimação do feito. A partir da sÃntese dos principais conceitos sobre o tema polÃticas públicas, identificou-se como conceito guia para o desenho desta pesquisa a abordagem defendida por Capano e 29 Giuliani (1998) que entendem que uma polÃtica pública não é um objeto em si, mas um constructo, uma abstração, uma construção ideal para solucionar um problema identificado como socialmente relevante. Conforme apontam esse conjunto de autores, as polÃticas públicas não nascem de forma espontânea e nem são descobertas por estudiosos, ao contrário, são compostas a partir de leis, discursos, comportamentos administrativos, propostas técnicas, questões orçamentárias, manifestações públicas, atitudes lobistas de atores, setores e grupos sociais distintos. Dentro desse campo de discussão será incorporado, ainda, como conceito guia para o desenvolvimento desta pesquisa o defendido por Boullosa que conceitua polÃticas públicas como “uma ação pública, complexa e multiatorial voltada ao tratamento de problemas sociais considerados de pública relevância†(Op. Cit.). As polÃticas públicas, em sua maioria, buscam responder demandas que são interpretadas pelo poder público, porém, com influência da sociedade civil, a partir das pressões e mobilizações sociais para atender, sobretudo, aos setores marginalizados. Algumas ações visam promover o desenvolvimento com a criação de projetos para criação de emprego e renda. E outras se fazem necessárias para intermediar conflitos entre os atores sociais. Guareschi et al (2004) contribuem neste debate quando definem a polÃtica pública como um conjunto de ações coletivas que tem como objetivo garantir através de um compromisso público direitos sociais, e, neste caso, as ações do Estado devem atender o interesse público. Draibe (2001) avança neste aspecto ao destacar que na literatura contemporânea, tomando como base a teoria pluralista, as polÃticas públicas ganham um caráter transcendente explicado por alguns enfoques e assim, a esfera do poder público é superada nas polÃticas públicas quando a sociedade é incorporada no processo decisório, como parte essencial. Muller (2003) ao afirmar que a polÃtica pública é resultado de uma construção social, corrobora com esta visão e acrescenta que o conteúdo da polÃtica pública estará sujeito tanto aos fatores relevantes para a sociedade como aos fatores que são priorizados pelo sistema polÃtico. Neste caso, quando se analisa uma polÃtica, institucional ou não, o que está em jogo, então, é aquilo que mobiliza os sujeitos e as instituições. 30 Neste sentido, Mattos e Baptista (Op. Cit., p. 70) contribuem com o debate quando afirmam que “são os sujeitos que fazem a história. Partimos do reconhecimento de que nenhuma polÃtica prescinde da participação de sujeitos e que existem diferentes inserções dos mesmos no debate polÃticoâ€. Por outro lado, outras teorias como a elitista, ao refletir a relação histórica entre elites polÃticas e Estado; a estruturalista, quando considera que o Estado tem a capacidade de fortalecer a organização dos governantes e de manter os governos desarticulados; e a funcionalista, quando reconhece a ação do Estado condicionada à acumulação capitalista, dão suporte à idéia de unificação de poder. Neste sentido, Teixeira (Op. Cit., p. 01), adverte que: PolÃticas públicas são diretrizes, princÃpios norteadores de ação do poder público; regras e procedimentos para as relações entre poder público e sociedade, mediações entre atores da sociedade e do Estado. São, nesse caso, polÃticas explicitadas, sistematizadas ou formuladas em documentos (leis, programas, linhas de financiamentos) que orientam ações que normalmente envolvem aplicações de recursos públicos. Nem sempre porém, há compatibilidade entre as intervenções e declarações de vontade e as ações desenvolvidas. Devem ser consideradas também as “não-açõesâ€, as omissões, como formas de manifestação de polÃticas, pois representam opções e orientações dos que ocupam cargos. Nesta direção, Frey (Op. Cit., p. 219) acrescenta que “as disputas polÃticas e as relações das forças de poder sempre deixarão suas marcas nos programas e projetos desenvolvidos e implementadosâ€. Desta forma, pode-se concluir que para que as polÃticas públicas sejam legitimadas se fazem necessárias mediações sociais e institucionais, pois o poder retrata os interesses diferenciados e até contraditórios na relação social que existe entre os vários atores de uma polÃtica pública, conforme destacado por Mattos e Baptista (Op. Cit., p. 63): A polÃtica como resultado de uma disputa de poderes e saberes, na qual predomina um discurso sobre os demais, que aponta certas possibilidades de pensamento (ideias, conceitos) e caminhos, e exclui outras. Exclui do discurso oficial, mas não do cotidiano das instituições e da prática. Neste mesmo sentido, os referidos autores criticam a concepção racionalista e universal de Estado e defendem a busca pela compreensão das diferentes relações de poder que são estabelecidas entre os grupos sociais na construção das polÃticas em Estados especÃficos. Afirma, pois, que não é suficiente tratar os processos polÃticos apenas no que é aparente ou 31 estabelecido formalmente; é preciso romper com uma visão normativa e descritiva das polÃticas, além de trazer o que há de vida em sua construção. 2.1.1 Ciclo de PolÃticas Públicas Com base na concepção atual de polÃtica pública, a mesma é formada por fases que incluem: formulação, implementação, resultados e impactos, constituindo-se em policy cicle, ainda que, “na prática, os atores polÃticos-administrativos dificilmente se atêm a essa sequência†(FREY, Op. Cit., p. 229). Mattos e Baptista argumentam, ainda, que: Mesmo que partamos do princÃpio que o planejamento, a gestão e a avaliação correspondem a atividades distintas, ao considerarmos seus propósitos, suas finalidades; não há como negar a complementaridade entre elas no que se refere ao ciclo de uma polÃtica, um programa ou de um projeto. Afinal, qual de nós que lidamos com polÃticas públicas, ou mais especificamente com programas, não tratamos em nosso cotidiano desses temas? (Op. Cit., p. 189). Em sÃntese, o ciclo de polÃticas públicas é uma tipologia em que a polÃtica pública é abordada como um ciclo deliberativo e dinâmico, formado por estágios, e permeado pelos interesses do Estado e pelas necessidades da sociedade, mobilizando, assim, atores públicos e privados, conforme aponta Frey (Op. Cit., p. 226): Ao subdividir o agir público em fases parciais do processo polÃtico-administrativo de resolução de problemas, o „policy cycle‟ acaba se revelando um modelo heurÃstico bastante interessante para a análise da vida de uma polÃtica pública. As várias fases correspondem a uma sequência de elementos do processo polÃtico-administrativo e podem ser investigadas no que diz respeito à s constelações de poder, à s redes polÃticas e sociais e à s práticas polÃtico-administrativas que se encontram tipicamente em cada fase. Mattos e Baptista (Op. Cit.) apostam que a idéia de ciclo da polÃtica talvez seja a perspectiva mais corrente e compartilhada nos atuais estudos de polÃtica pública, com grande parte destes estudos fazendo uma análise por momentos ou fases do processo polÃtico. A preocupação em explicar e identificar o processo polÃtico, a partir de fases distintas, surge paralelamente ao processo de desenvolvimento do próprio campo de análise da polÃtica pública, entre os séculos XIX e XX. 32 No pós-segunda guerra houve uma intensificação desses estudos, sobretudo nos EUA e na Inglaterra. O objetivo principal desse esforço era dotar o processo decisório de efetividade, conforme apontam Mattos e Baptista (Ibidem, p. 139): Assim, a ideia era conhecer as demandas da sociedade e o processo polÃtico na formação e execução das polÃticas para possibilitar decisões acertadas. Foi neste contexto que teve inÃcio a construção do enfoque da polÃtica em fases ou estágios, ressaltando os diferentes momentos de formulação e desenvolvimento de uma polÃtica. Numa perspectiva histórica, reconhece-se que Harold Lasswell foi um dos primeiros autores a discutir sobre o conceito de PolÃtica Pública o que implica afirmar que, além de consolidar teoricamente este campo de análise, deu enfoque também à s fases. Reconhece-se também a relevante contribuição de Simon, a partir da aplicação da teoria sobre a escolha humana e tomada de decisões administrativas sobre os problemas organizacionais (1947), a partir da definição de três fases distintas neste processo: inteligência, desenho e escolha. Lasswell, em 1951, juntamente com Daniel Lerner na coedição do livro The Policy Sciences, propõe sete estágios ao processo de construção e desenvolvimento de uma polÃtica pública, como forma de simplificar e melhor dividir o processo, são as seguintes: informação, promoção, prescrição, invocação, aplicação, término e avaliação. Charles Lindblom, ainda nos anos 1950, critica de forma veemente tal modelo, acusando Lasswell de demasiadamente racional, rejeita a divisão da polÃtica em fases, etapas estanques, e propõe uma análise que levasse em consideração o poder e a interação entre as mesmas. Em 1974, Gary Brewer também critica o modelo de Lasswell ao advertir que as polÃticas não possuem um ciclo definido ou linear, pois ocorrem modificações em seu curso e introduz a noção de polÃtica pública como um ciclo contÃnuo. Desta forma, propõe uma nova fase ao ciclo, chamada de reconhecimento do problema; incrementa o modelo proposto por Lasswell e decompõe o processo decisório em seis etapas: intervenção, estimativa, seleção, implementação, avaliação e término. O quadro a seguir sintetiza as principais caracterÃsticas dos principais modelos elaborados sobre o tema. 33 Quadro 01: As fases do processo decisório em diferentes estudos sobre análise de polÃtica Estudos Fases definidas H A Simon – Administrative Behaviour, 1947 Inteligência, Desenho, Escolha. H D Lasswell – The Policy Orientation, 1951 Informação, Promoção, Prescrição, Invocaçao, Aplicação, Término e Avaliação. R Mack – Planning and Uncertainty, 1971 Reconhecimento do problema, Formulação de alternativas, Decisão, Efetivação, Correção/Ajuste. R Rose – Comparing public policy, 1973 Reconhecimento public das necessidades existentes, Como os temas são colocados na agenda, Como as demandas avançam, Como o governo se envolve no processo decisório, Recursos e constrangimentos, Decisões polÃticas, O que determina as escolhas de governo, A escolha no contexto, Implementação, Resultados, Avaliação da polÃtica e Feedback. G Brewer – The policy sciences emerge, 1974 Invenção, Estimativa, Seleção, Implementação, Avaliação e Término. W Jenkins – Policy Analysis: a political and organizational perspective, 1978 Iniciação, Informação, Consideração, Decisão, Implementação, Avaliação e Término. BW Hogwood and LA Gunn – Policy analysis for the Real World, 1984 Definição de temas, Filtro de temas, Definição de temas, Prognóstico, Definição de objetivos e prioridade, Análise de opções, Implementação da PolÃtica, monitoramento e controle, Avaliação e revisão, Manutenção da polÃtica, Sucessão e Término. Howlett e Ramesh, Studying Public Policy, 1993 Montagem da agenda, formulação da polÃtica, tomada de decisão, implementação e avaliação. FONTE: Adaptado de MATTOS e BAPTISTA, 2011, p. 141 Mas como destacam Mattos e Baptista (Ibidem, p. 142), “apesar das crÃticas ao modelo (caráter funcionalista, racional e que tenta manter o controle sobre o processo polÃtico), este persiste no debate acadêmico como referência.†. A idéia de ciclo que tem sido bastante divulgada nos dias atuais e trabalhada nos estudos recentes de polÃtica é pautada no trabalho de Howlett e Ramesch (1995) intitulado Improved Model. Os autores dividem os ciclos ou processo da polÃtica pública em cinco etapas: (1) montagem da agenda; (2) formulação da polÃtica; (3) tomada de decisão; (4) implementação e (5) avaliação, conforme figura a seguir. 34 Figura 01: O Ciclo da PolÃtica segundo Howlett e Ramesch FONTE: Adaptado de HOWLETT e RAMESCH (1995) apud MATTOS e BAPTISTA (2011) Para este modelo, o primeiro passo para se desenvolver uma polÃtica é o de reconhecimento de uma problema como de relevância pública, ou montagem da agenda. Como afirmam os autores , “(...) os problemas constituem o ponto de partida para a geração de uma polÃtica pública. Mas que problemas são reconhecidos pelos governantes como relevantes? Como se dá este processo de reconhecimento?†(Op. Cit.,p. 143). Mattos e Baptista (2011) destacam ainda o trabalho de Kingdon (1984) desenvolvido nos EUA acerca de duas polÃticas públicas (saúde e transportes) para compreender como alguns temas que incluem estas áreas passaram a compor a agenda polÃtica governamental, bem como foram desenvolvidas as alternativas para a tomada de decisão. Kingdon, ao perceber que os problemas se apresentavam de forma distinta, bem como ganhavam atenção diferenciada por parte do governo, denominou como “Agenda†a lista de assuntos e problemas que ganham atenção do governo e das pessoas ligadas a ele, num determinado momento. Destacou, ainda, que à medida que os cenários polÃticos se modificam o processo de mudança da agenda se altera. Desta forma, o autor destaca os diferentes status dos problemas no âmbito de uma polÃtica de governo (Apud Mattos e Baptista, Op. Cit., p. 144): Avaliação Montagem da Agenda Implementação Tomada de Decisão Formulação da PolÃtica 35 1. A agenda sistêmica ou governamental – corresponde à lista de assuntos e problemas do paÃs, colocados na sociedade, que por algum motivo não despertaram a atenção do governo e dos formuladores de polÃtica naquele momento e que ficaram aguardando oportunidade e disputando espaço para entrar na agenda governamental; 2. A agenda institucional ou governamental – inclui os problemas que obtêm a atenção do governo, mas ainda não se apresentam na mesa de decisão; 3. A agenda decisória ou polÃtica – corresponde à lista de problemas que estão sendo considerados e que serão trabalhados nos processos decisórios. Neste estudo, Kingdon ainda assegura que a entrada de novos problemas na agenda decisória é resultado de uma combinação de fluxos independentes que atravessam as estruturas de decisão e não produzida por um processo necessariamente incremental, a saber: fluxo de problemas (problem stream), fluxo de soluções alternativas (policy stream) e o fluxo da polÃtica (politics stream), conforme indicado a seguir: 1. Fluxo de problemas – remete à s condições sociais e à forma como cada condição desperta a necessidade de ação. Problemas podem ser percebidos a partir de indicadores (por ex: taxas de mortalidade), de eventos, crises e sÃmbolos (por ex: desastres, acontecimentos), ou no feedback de ações governamentais (por ex: no acompanhamento de atividades implementadas, retorno de metas e outros). Um problema, quando identificado por dados quantitativos, por crises, ou pelo retorno de ações governamentais, assume grande importância no debate de formulações polÃticas, contribuindo para a construção de argumentos em favor de uma polÃtica que busque resolver tais questões. Ainda assim, a evidência dos problemas não é capaz de isoladamente influenciar a tomada de decisão, exigindo uma articulação com os demais fluxos. 2. Fluxo de alternativas e soluções – são propostas rotineiramente elaboradas por especialistas, funcionários públicos, grupos de interesse, entre outros. Estes diferentes grupos mobilizam comunidades de polÃticas que se envolvem com determinados temas e aguardam o surgimento de oportunidades para propor soluções para os problemas. As alternativas e soluções estão disponÃveis e quando surgem os problemas passam por um processo competitivo de seleção, para efetiva consideração no processo decisório das polÃticas. 3. Fluxo polÃtico – dimensão da polÃtica „propriamente dita‟, na qual as coalizões são construÃdas a partir de barganhas e negociações. Neste fluxo, três elementos exercem influência sobre a agenda governamental: o “clima†ou “humor†nacional (por ex: um momento polÃtico favorável a mudanças dado o carisma de um governante ou a conjuntura polÃtica, econômica e social); as forças polÃticas organizadas (grupos de pressão); e mudanças no interior do próprio governo. (MATTOS e BAPTISTA, 2011, p. 146). A figura a seguir ajuda a compreender melhor os respectivos fluxos: 36 Figura 02: Os três fluxos do processo decisório e a entrada de temas na agenda de governos FONTE: Adaptado de MATTOS e BAPTISTA (2011) Com base na figura, percebe-se que cada um dos fluxos possui vida própria e caminho relativamente independente. Quando os mesmos convergem criam „janelas de oportunidade‟ (policy windows), o que permite a formação de polÃticas ou mudanças nas polÃticas que já existem. Desta forma, uma janela de oportunidade contempla um conjunto de condições que são favoráveis a alterações nas agendas assim como à entrada de novos temas. Prosseguindo na perspectiva de ciclo, o passo seguinte após a entrada do problema na agenda governamental é a formulação da polÃtica. É neste momento que são formuladas soluções e alternativas para o problema. Após a formulação, então, tem-se condições para a tomada de decisão. Nestas fases, são desenhadas as metas, são estabelecidos os recursos necessários, bem como o horizonte temporal, ou seja, nelas se definem os princÃpios e diretrizes para o desenvolvimento de uma ação. Mattos e Baptista (Op. Cit., p. 148) destacam que algumas questões orientam a análise destas fases: 1. Como as alternativas polÃticas foram formuladas? 2. Como determinada proposição foi escolhida entre as demais alternativas? Janela de oportunidade Convergência de fluxo Fluxo de Problemas Indicadores, Crise, feedback de ações. Fluxo deSoluções Viabilidade técnica, custos, aceitação pela comunidade. Fluxo PolÃtico “Clima nacionalâ€, forças polÃticas organizadas e mudanças no governo. Entrada de um tema na AGENDA DE GOVERN O 37 3. Quem participou do processo de formulação e decisão das polÃticas? Avançando na perspectiva de ciclo, a fase que se segue é a de implementação. Nesta fase, coloca-se uma determinada solução em prática e a mesma é envolvida por uma série de sistemas ou atividades da administração pública: o sistema gerencial decisório, os sistemas de informação, os agentes implementadores da polÃtica, os sistemas logÃsticos e operacionais (recursos materiais, financeiros), dentre outros, conforme destacam os mesmos autores. Para Frey (Op. Ci.t) o ciclo das polÃticas públicas também se dá em cinco fases: percepção e definição de problemas; formação da agenda; elaboração de programas e decisão; implementação de polÃticas e avaliação. Na fase de percepção e definição de problemas, o autor afirma que se busca entender os critérios que são utilizados pelo poder público na definição dos temas relevantes e que merecem atenção polÃtica. Gonçalves (2011) acrescenta que a utilização de indicadores de desempenho, a realização de eventos simbólicos e o feedback das ações que foram desenvolvidas pelo governo são elementos úteis para evidenciar os respectivos temas e assim aumentar a probabilidade de que os mesmos sejam tratados politicamente. Já na fase de formação da agenda, decide-se se o tema que foi identificado como relevante fará ou não parte da agenda polÃtica ou se por conta da relação custo-benefÃcio é mais viável adiar o seu tratamento. De acordo com Subirats (2006), são três as caracterÃsticas gerais que favorecem que um tema seja levado à agenda polÃtica, a saber: 1) A valoração do impacto geral do tempo; 2) A valoração do nÃvel de impacto sobre a realidade social e 3) A viabilidade de uma solução antecipada ou previsÃvel. Neste sentido, Frey (Op. Cit., p. 227) acrescenta que para tomar esta decisão quanto à formação de agenda é preciso que: (...) pelo menos uma avaliação preliminar sobre custos e benefÃcios das várias opções disponÃveis de ação, assim como uma avaliação das chances do tema ou projeto de se impor na arena polÃtica [...], pelo menos é conveniente o envolvimento dos relevantes atores polÃticos. Na fase de elaboração de programas e decisão se faz necessário considerar a opinião pública na conversão dos inputs (demandas e apoio) em outputs (produtos do sistema polÃtico) para o estabelecimento da governabilidade. Nesta fase decide-se sobre os recursos e sobre o prazo 38 temporal da polÃtica. Frey (Ibidem, p. 228) adverte que normalmente precedem ao ato de decisão processos de conflito e de acordo que envolvem pelo menos os atores mais influentes na polÃtica e na administração. E acrescenta, ainda, que: Em geral, a instância de decisão responsável decide sobre um „programa de compromisso‟ negociado já antecipadamente entre os atores polÃticos mais relevantes. Decisões „verdadeiras‟, isto é, escolhas entre várias alternativas de ação, são raras exceções nesta fase do ciclo polÃtico. Teixeira (Op. Cit, p. 05) também discute alguns aspectos que merecem destaque na análise da fase de formulação de polÃticas públicas: 1. Identidade – iniciativas de proposições para responder questões que constituem um elemento importante no processo de formação de identidade coletiva dos atores sociais. 2. Plataformas polÃticas – as polÃticas públicas expressam o sentido do desenvolvimento histórico-social dos atores sociais na disputa para construir a hegemonia; refletem, pois, as concepções que têm do papel do Estado e da sociedade civil, constituindo programas de ações que respondem as suas carências e demandas. 3. Mediações Institucionais – as polÃticas públicas traduzem mediações entre interesses e valores dos diversos atores que se defrontam em espaços públicos para negociar soluções para o conjunto da sociedade ou determinados grupos sociais. 4. Dimensão Estratégica – as polÃticas públicas diretamente ligadas ao modelo econômico e à constituição de fundos públicos assumem aspecto estratégico, quando se constituem referência e base para a definição de outras polÃticas ou programas em determinadas áreas. As opções estratégicas devem considerar, ao mesmo tempo, as inovações tecnológicas e a reestruturação produtiva e os seus efeitos sobre o emprego e o agravamento das desigualdades sociais, buscando-se alternativas que redirecionem o emprego não apenas de forma compensatória que torna seus beneficiários meros objetos da assistência, mas que os tornem cidadãos ativos, contribuindo, através de novas formas de inserção social, para o desenvolvimento da sociedade. Na mesma ordem, Cavalcanti (2010) acrescenta que a concepção atual de uma polÃtica pública perpassa as fases de formulação, implementação, resultados e impactos. Na fase de formulação é feito o desenho de um programa no qual de define a estratégia geral da respectiva polÃtica pública (definindo objetivos, metas, recursos, entre outros). Na visão clássica, este conceito é superior aos demais e não se considera a implantação, bem como seus efeitos, como instrumentos retro alimentadores. Neste aspecto, o autor destaca o avanço em relação à visão clássica da visão do policy cicle que é entendido não como um processo simples e linear. Desta forma, segundo destaca Cavalcanti (Ibidem, p. 03), mesmo que nesta nova perspectiva, se considere a relevância da fase de implementação continua a dar maior ênfase à formulação. 39 Todavia, esta análise acaba sendo muito limitada, pois “considera problemas de implementação „desvios de rota‟ e não, contradição de objetivos entre formuladores e implementadores, que requer negociação, barganhaâ€. Neste sentido, o autor defende que o policy cicle deve ser concebido como um processo dinâmico e não apenas simples e linear, que envolve apenas formuladores e implementadores. Ao contrário, afirma que todas as pessoas envolvidas ou interessadas numa dada polÃtica devem ser consideradas no processo. Na fase de implementação de polÃticas ocorre à execução de atividades que possibilitam que as ações ocorram na prática e que se obtenha êxito no alcance das metas estabelecidas na fase de formulação. Gonçalves (2011) destaca dois modelos no processo de implementação de polÃticas públicas: o modelo de cima para baixo (top dow) e o modelo de baixo para cima (bottom up), conforme aponta Mattos e Baptista (Op. Cit., p. 149). Para alguns analistas a implementação é a fase administrativa da polÃtica, onde todo o controle está nas mãos dos “formuladoresâ€, situados no topo das organizações. Esta forma de compreender a implementação ficou conhecida como enfoque top-dow, porque define a existência de uma organização central que assume o controle dos fatores polÃticos, organizacionais e técnicos e a divisão de responsabilidades. O modelo top dow baseia-se na visão clássica do ciclo de polÃticas e reflete a ideia de hierarquia da administração pública que defende que o poder público deve tomar a decisão e os demais devem acatá-la. Desde essa perspectiva de análise, a implementação é vista como uma ação governamental que se reflete em programas e projetos. Desconsidera-se neste modelo aspectos quanto aos efeitos retro alimentadores sobre o processo de formulação da polÃtica. Gonçalves (2011) adverte que neste modelo para que o processo de implementação seja efetivo faz-se necessário definir claramente os objetivos do programa, viabilizar o acesso aos recursos e controlar os envolvidos na condução das ações de implementação. Já o modelo bottom up considera que o processo de implementação é imperfeito no controle do processo de elaboração de polÃticas, levando-o apenas a uma continuidade do processo de formulação, uma vez que o processo não está livre dos riscos de haver distorções entre o que foi planejado e o que está sendo executado. O que permite concluir que para essa perspectiva de análise os principais obstáculos no processo de implementação são: capacidade institucional dos agentes implementadores, problemas de natureza polÃtica e boicotes 40 executados por grupos que se sentem prejudicados por aquela forma de implementação (GONÇALVES apud MATTOS e BAPTISTA, p. 150). Neste enfoque, pressupõe-se que a polÃtica não se define no topo da pirâmide da administração, mas no nÃvel concreto de sua execução. Parte da análise das redes de decisões que se estabelecem no enfrentamento entre os diversos atores quando da implementação, sem conferir um papel determinante à s estruturas pré-existentes. Parte também da ideia de que existe sempre um controle imperfeito em todo o processo de elaboração da polÃtica, o que condiciona o momento da implementação. Assim, a implementação é entendida como o resultado de um processo interativo através do qual uma polÃtica, que se mantém em formulação durante um tempo considerável, se relaciona com o seu contexto e com as organizações responsáveis por sua implementação. Este enfoque alerta para o fato de que certas decisões que idealmente pertencem ao terreno da formulação só são efetivamente tomadas durante a implementação, porque se supõe que determinadas opiniões conflitivas não podem ser resolvidas durante o momento da tomada de decisão. Na fase de avaliação, última fase do ciclo, analisa-se os efeitos e resultados da implementação junto ao público-alvo e à sociedade. Neste momento do ciclo, pode-se avaliar se o programa responde à s metas e objetivos que foram pré-definidos, bem como os seus efeitos. Conforme aponta Frey (Op. Cit., p. 228), “trata-se de indagar os déficits de impacto e os efeitos colaterais indesejados para poder deduzir consequências para ações e programas futuros.†Nesta fase, os déficits de implementação são detectados e, em geral, relacionam-se com as lacunas que são provocadas por distorções ocorridas nas fases de formulação e implementação, destaca Gonçalves (2011). Acrescenta o autor que os déficits de implementação tornam-se iminentes quando se adota o modelo top dow, em especial, devido à s lacunas provocadas pela distorção e falta de sintonia entre as percepções dos que estão no topo das instituições públicas e os anseios da sociedade. Neste sentido, para evitar tais déficits, Teixeira (2002) traduz alguns momentos que podem ser identificados e precisam ser devidamente acompanhados na elaboração, implementação e avaliação das polÃticas públicas propostas, são eles: a) Elaboração e formulação de um diagnóstico participativo e estratégico com os principais atores envolvidos, no qual se possa identificar os obstáculos ao desenvolvimento, fatores restritivos, oportunidades e potencialidades; negociação entre os diferentes atores; b) Identificação de experiências bem sucedidas nos vários campos, sua sistematização e análise de custos e resultados, tendo em vista possibilidades de ampliação de escalas e criação de novas alternativas; 41 c) Debate público e mobilização da sociedade civil em torno das alternativas e mais entre os atores; d) Decisão e definição em torno de alternativas; competências das diversas esferas públicas envolvidas, dos recursos e estratégias de implementação, cronogramas, parâmetros de avaliação; e) Detalhamento de modelos e projetos, diretrizes e estratégias; identificação das fontes de recursos; orçamento; mobilização dos meios disponÃveis e a providenciar; mapeamento de possÃveis parcerias, para a implementação; f) Na execução, publicização, mobilização e definição de papéis dos atores, suas responsabilidades e atribuições, acionamento dos instrumentos e meios de articulação; g) Na avaliação, acompanhamento do processo e resultados conforme indicadores; redefinição das ações e projetos. No caso de os objetivos do projeto ou programa terem sido alcançados, nesta fase pode-se ou suspender ou finalizar o ciclo polÃtico ou pode-se iniciar um novo ciclo, conforme aponta Frey (Op. Cit., p. 229): Vale assinalar que o modelo heurÃstico do „policy cycle‟ é um “tipo puro†idealizador do processo polÃtico, na prática dificilmente este se dá de pleno acordo com o modelo. Porém, o fato de os processos polÃticos reais não corresponderem ao modelo teórico não indica necessariamente que o modelo seja inadequado para a explicação desses processos, mas sublinha o seu caráter enquanto instrumento de análise. O „policy cycle‟ nos fornece o quadro de referência para a análise processual. Ao atribuir funções especÃficas à s diversas fases do processo polÃtico-administrativo, obtemos – mediante a comparação dos processos reais com o tipo puro – pontos de referência que nos fornecem pistas à s possÃveis causas dos déficts do processo de resolução de problema. Vale destacar que, talvez, uma das principais contribuições da idéia do ciclo de polÃtica pública seja justamente a possibilidade da compreensão de que uma polÃtica passa por diferentes momentos em seu processo de construção, destacando, assim, a necessidade do reconhecimento das especificidades de cada momento para intervir de forma efetiva sobre o processo polÃtico, conforme ressaltam Mattos e Baptista (Op. Cit., p. 161): Ou seja, ao atribuir à análise das fases a pretensão de entender e direcionar os rumos da polÃtica poder-se-ia incorrer no erro de não se perceber o jogo de poder e disputa que perpassa toda e qualquer polÃtica e de se atribuir ao analista o papel de detentor de uma verdade e de orientador da boa polÃtica. Neste sentido, a delimitação das fases pode ser um fator crÃtico limitador da análise, especialmente se não há uma compreensão da forma como cada contexto constitui sua polÃtica e dos arranjos e processos polÃticos de disputa em cada âmbito. Um exemplo que talvez ajude a explicitar o limite desta abordagem é quando se propõe um estudo de implementação sem considerar que mesmo na implementação há formulação, ou quando se imagina que, para que se possa estudar uma determinada fase, tenha que se abarcar todo o conjunto de questões que se apresentam naquele momento da polÃtica, sem atentar para as questões que estão presentes no campo em análise, adotando-se um modelo de análise a priori, um „deve ser‟ da polÃtica que irá se repetir em todos os contextos. 42 Assim, é inevitável destacar a idéia de fragmentação, bem como o risco de tratar uma fase como estanque num processo de análise e, ainda, de se imaginar que uma polÃtica pública tenha comportamento previsÃvel. Sobretudo, estas não são questões exclusivas para este modelo, pois, na verdade, as mesmas se apresentam para todo o campo de análise da polÃtica. 2.1.2 Tipos de PolÃticas Públicas Na sua variedade, se faz necessário destacar alguns tipos de polÃticas públicas, pois essa tipologia ajudará na definição quanto ao tipo de atuação que se pode adotar na implementação de uma dada polÃtica. Neste sentido, Mattos e Baptista (Op. Cit., p. 190) acrescentam que as avaliações respondem a questões avaliativas com base em hipóteses geradas no monitoramento acerca das diferenças observadas na implementação ou em relação aos efeitos alcançados. Os autores ressaltam que as avaliações comumente são mais complexas, a depender da(s) pergunta(s) a ser(em) respondida(s), o que, por sua vez, orienta a tipologia de avaliação e concluem que: Ao remetermos as tipologias de avaliação ao foco desta, logo vinculamos foco ao tipo de efeitos da polÃtica ou programa que buscamos explicar, e a qual queremos nos deter, como por exemplo, os do processo, os de resultado ou os de impacto. Esse é um ponto crucial da avaliação porque temos uma tendência a dizer que queremos saber o impacto de uma polÃtica, ou que avaliamos o impacto de uma polÃtica sem nem sempre nos aproximarmos disso. Teixeira (Op. Cit., p. 03), por sua vez, destaca alguns critérios que podem ser utilizados para identificar o tipo de atuação da polÃtica: 1) Quanto à natureza ou grau da intervenção: a) estrutural – buscam interferir em relações estruturais como renda, emprego, propriedade, etc. b) conjuntural ou emergencial – objetivam amainar uma situação temporária, imediata. 2) Quanto à abrangência dos possÃveis benefÃcios: a) universais – para todos os cidadãos b) segmentais – para um segmento da população, caracterizado por um fator determinado (idade, condição fÃsica, gênero etc.) c) fragmentadas – destinadas a grupos sociais dentro de cada segmento. 3) Quanto aos impactos que podem causar aos beneficiários, ou ao seu papel nas relações sociais: a) distributivas – visam distribuir benefÃcios individuais; costumam ser instrumentalizadas pelo clientelismo; 43 b) redistributivas – visam redistribuir recursos entre os grupos sociais: buscando certa equidade, retiram recursos de um grupo para beneficiar outros, o que provoca conflitos; c) regulatória – visam definir regras e procedimentos que regulem o comportamento dos atores para atender interesses gerais da sociedade; não visariam benefÃcios imediatos para qualquer grupo. Nesta perspectiva, Gonçalves (Op. Cit.) acrescenta que o que determinará a eficiência deste processo é o caráter distributivo, redistributivo, ou regulatório da polÃtica em questão. O quadro abaixo apresenta os diferentes tipos de polÃticas, bem como suas caracterÃsticas básicas citadas pelo autor: QUADRO 02: Diferentes tipos de polÃticas públicas DISTRIBUTIVAS REDISTRIBUTIVAS REGULATÓRIAS Apresenta baixa ou nenhuma possibilidade de conflito, essas polÃticas tendem a ser compreendidas, pela sociedade como um todo, como necessárias e urgentes. Têm como caracterÃstica básica a forte possibilidade de conflitos entre os atores envolvidos, já que estes se entendem como “perdedores†ou “ganhadoresâ€. Nessas polÃticas, o resultado da ação público-estatal não pode ser percebido antecipadamente, portanto, as normas e procedimentos acordados entre os atores, a priori, não geram conflitos. FONTE: Adaptado de Gonçalves (2011) De acordo com esta classificação, as polÃticas distributivas devido à percepção de que as polÃticas só trazem vantagens para a população-alvo não geram conflitos. Já as polÃticas redistributivas são responsáveis por maiores conflitos, pois promovem deslocamento de bens ou valores entre grupos sociais e devido aos interesses divergentes, compromete o processo decisório. Por outro lado, as polÃticas regulatórias regulam as dimensões econômica, social e administrativa, e, como os custos e benefÃcios são conhecidos, a configuração da polÃtica é que irá determinar a existência e intensidade dos processos de conflito, consenso ou coalizão. Frey (Op. Cit.) considera, além das polÃticas distributivas, redistributivas e regulatórias, as polÃticas constitutivas ou estruturadoras. Para o autor, as polÃticas distributivas são caracterizadas por um baixo grau de conflito dos processos polÃticos e, em geral, beneficiam um grande número de destinatários, porém em escala relativamente pequena. As polÃticas redistributivas, no entanto, são orientadas para o conflito, pois o processo polÃtico que visa a uma redistribuição costuma ser polarizado e repleto de conflitos. 44 Já as polÃticas regulatórias trabalham, segundo o autor, com ordens e proibições, decretos e portarias. Neste caso, os custos e benefÃcios podem ser distribuÃdos de forma igual e equilibrada entre os grupos e setores da sociedade, assim como as polÃticas também podem atender a interesses particulares e restritos. Por fim, as polÃticas constitutivas ou estruturadoras determinam as regras do jogo, bem como a estrutura dos processos e conflitos polÃticos, ou seja, as condições gerais sob as quais vêm sendo negociadas as polÃticas distributivas, redistributivas e regulatórias, conforme aponta Frey (Op. Cit., p. 224): A polÃtica estruturadora diz respeito à própria esfera da polÃtica e suas instituições condicionantes („polity‟) – refere-se à criação e modelação de novas instituições, à modificação do sistema de governo ou do sistema eleitoral, à determinação e configuração dos processos de negociação, de cooperação e de consulta entre os atores polÃticos. Na seção que segue aprofunda-se a discussão quanto à avaliação de polÃticas públicas, pois, entende-se que esta fase do ciclo é decisiva para a efetividade das demais fases, devido a sua caracterÃstica de atribuição de valor que pode proporcionar melhoria contÃnua à s polÃticas pú- blicas. Neste sentido, Cavalcanti (2010, p. 2) ressalta que: (...) a avaliação se revela como um importante mecanismo de gestão, uma vez que for- nece informações e subsÃdios para tomada de decisão dos gestores, formuladores e implementadores de programas, pois possibilita conhecer o que está acontecendo e atuar sobre os fatos de forma a realizar ajustes necessários, economizando-se dessa forma tempo e recursos, o que eleva a credibilidade das ações públicas. As informações foram levantadas a partir da seleção de conceitos relevantes para discutir a avaliação de resultados de polÃticas públicas formuladas e implementadas por um governo, levando em consideração os conceitos de eficiência, eficácia e efetividade, conceitos estes que possuem relação direta com processos, resultados e impactos. Ao discutir esta temática no âmbito do setor público, busca-se destacar a importância deste instrumento para conhecer, compreender, bem como aperfeiçoar e orientar as estratégias e ações para o aperfeiçoamento e realinhamento de programas dos governos materializados pelas polÃticas públicas, e, especialmente, prestar contas à sociedade das ações governamen- tais. 45 2.2 AVALIAÇÃO DE POLÃTICAS PÚBLICAS Sobre o conceito de avaliação em polÃticas públicas a literatura é bastante vasta e complexa. Portanto, aqui não se pretende esgotar a discussão, mas focalizar os tipos de avaliações que respondem melhor aos problemas de implementação de programas de polÃticas públicas. Conforme destacado por Mattos e Baptista (Op. Cit., p. 181-182): As raÃzes da avaliação remontam aos primórdios da história da humanidade (avaliação informal), no entanto a avaliação formal teve como marco histórico o perÃodo da Grande Depressão nos Estados Unidos até o perÃodo que sucedeu a Segunda Grande Guerra Mundial pela necessidade de avaliação das polÃticas públicas implementadas para equacionar os problemas sociais existentes (Guba & Lincoln, 1989). A avaliação, desde então, vem passando por constantes transformações e diferentes influências que se traduzem na confluência de diferentes campos do saber, como as ciências sociais, a economia, a pesquisa clinica e epidemiológica e o direito. Com a expansão do campo da avaliação, surgiram diferentes vertentes e tendências norteadoras de saberes e práticas, que Guba e Lincoln (1989), ou mesmo Almeida (2006), vão localizá-las em quatro gerações: a primeira (1910-1930) que tem como ênfase a construção e aplicação de instrumentos de medidas para avaliar os beneficiários de uma intervenção; a segunda (1930-1967), centrada na descrição da intervenção marca o surgimento da avaliação de programas; a terceira (1967-1980) apoiada no julgamento de mérito e do valor de uma intervenção para ajudar na tomada de decisões; e a quarta (1980-atual) refere-se à negociação entre os atores interessados e envolvidos na avaliação. No Brasil, nas duas últimas décadas, observa-se um avanço nos processos de avaliação de polÃticas públicas, em especial, devido ao processo de descentralização e municipalização da gestão de polÃticas públicas que ocorreu no paÃs a partir da Constituição de 1988. Mattos e Baptista (Op. Cit.) destacam que, embora a avaliação seja apontada no ciclo da polÃtica como uma fase especÃfica, nos modelos que adotam esta perspectiva, ela é utilizada como um instrumento de apoio a tomada de decisões nas diversas fases do ciclo. Ou seja, os autores ressaltam que a mesma não se restringe à avaliação de resultados da polÃtica, nem tampouco à etapa final do processo. Há um relativo consenso de que o processo de avaliar implica a atribuição de valor. Essa definição clássica foi endossada pelo britânico Michael Scriven (1967) apud Boullosa (2009), que define a avaliação como uma atividade formal de atribuição de valor material, simbólico e 46 de mérito a uma entidade, que pode assumir diferentes complexidades, como planos, programas, projetos e/ou ações. Spink (2001, p. 07), por sua vez, discute a avaliação de programas, projetos e atividades, não como prática cientÃfica ou técnica, mas enquanto prática social, afirmando que “(...) se avaliação é a atribuição de valor: quem deve atribuir valor? Ou, visto na ótica das avaliações que encontramos nas agências de desenvolvimento e nos financiadores de projetos: o valor que está sendo atribuÃdo é o valor de quem?†Para o autor, todo projeto, programa ou atividade que visa contribuir, melhorar ou alterar uma situação existente é, por definição, um conjunto de ações não estático que intervêm num processo social contÃnuo e situado historicamente. Acrescenta que “a avaliação precisa ser entendida não como auditoria ou cobrança, mas, antes de qualquer coisa, como uma parte integral da construção cotidiana da democracia†(Ibidem, p. 13). Para Dye (2005), avaliar polÃticas inclui: estudar os programas; relatar os ouputs dos programas governamentais; avaliar os impactos dos programas sobre os grupos-alvo e sobre os outros grupos, e propor mudanças e ajustes. No final da década de 80 e durante a década de 90, a administração pública brasileira passou por uma fase de reformas, a chamada reforma gerencialista, justificada pela crise de governabilidade e credibilidade do Estado. Esta reforma pautou-se em princÃpios neoliberais e definiu como um dos seus objetivos principais a avaliação, com vistas à melhoria funcional da administração pública, a partir da filosofia empresarial. Nesse bojo, pode-se inferir que a prática da avaliação das polÃticas públicas implementadas pelos governantes e dos resultados alcançados em determinado perÃodo possui um viés do gerencialismo trazida pela reforma do Estado, com foco nos resultados. Segundo Araújo (2010, p, 48), “essa cultura gerencialista acabou levando ao entendimento de que os avaliadores são medidores e auditores de resultados, concentrando a avaliação nas últimas etapas dos processos de intervençãoâ€. A busca pela modernização da gestão pública reforçou o valor da avaliação enquanto etapa final do ciclo de projetos e programas. No entanto, embora a avaliação esteja atualmente 47 reconhecida pela administração pública brasileira, o seu uso, em virtude da visão gerencialista, ainda é muito restrito, conforme destaca Boullosa (Op. Cit.). A autora argumenta ainda que, embora o processo de avaliação tenha sido muito difundido no Brasil, ainda não se observa uma cultura de avaliação consolidada e integrada. Avalia-se, segundo Boullosa, porque se sabe que deve, mas na maioria das vezes não se sabe bem o porquê, distanciando-a dos processos de aprendizagem que incluem intervenção social, sobretudo, quando são promovidos pelo Estado. Neste sentido, corrobora Fischer (2002, p. 158) que: É difÃcil precisar a tradição da avaliação de projetos no Brasil, mas suspeita-se haver uma fraca cultura de avaliação, onde: (a) raramente os projetos sociais do setor público são concebidos de forma a tornar a sua avaliação exequÃvel; (b) tais projetos tendem a ser avaliados em termos de indicadores de processo que se referem à cobertura do projeto, como por exemplo, número de escolas construÃdas etc. e não em termos do seu impacto, como por exemplo o Ãndice de erradicação da alfabetização; ou de resultados de longo prazo como a diminuição da pobreza, etc; e (c) há uma tradição das organizações do setor público (e privado) brasileiros de não se auto avaliarem, sendo a norma simplesmente sobrepor novos projetos para tratar de problemas recorrentes. Talvez o conceito que melhor expresse tal realidade seja o de “esquecimento organizacional†em lugar de aprendizagem. Especialmente o esquecimento por meio de desassociação ou desorientação, ou seja a perda de continuidade com o passado e com o futuro, onde as ações são desligadas de suas consequências. Os conceitos formulados pelos autores Scriven (1967), Patton (1998), Weiss (1998) e Boullosa (2007) consideram que em toda avaliação emite-se um juÃzo de valor. Neste sentido, Boullosa (Op. Cit., p. 112) acrescenta que: Avaliação é o conjunto de atividades, nem sempre solidamente correlacionadas, voltado para a expressão de um juÃzo ou sÃntese avaliatória, direcionado a um fim, nem sempre claro e/ou explÃcito, empreendido por um conjunto de agentes, nem sempre definidos ou etiquetados como avaliadores. Este juÃzo deve ser o máximo possÃvel argumentado através de instrumentos e procedimentos de pesquisa avaliatória (não somente pesquisa social aplicada), de modo a possibilitar a sua reconstrução analÃtica e discussão dos resultados, juÃzo ou sÃntese avaliatória, pelas coletividades interessadas em tal avaliação, desencadeando um processo de aprendizagem prático- institucional (relativo ao objeto de avaliação) e social (relativa à dimensão dialógico- cÃvica da sociedade em geral). Ainda neste sentido, Arretche (1998) contribui ao esclarecer que, devido ao fato de que todo processo de avaliação envolve necessariamente um julgamento, uma atribuição de valor, uma medida de aprovação ou desaprovação a uma polÃtica ou programa, bem como uma análise da mesma com base numa certa concepção de justiça, não existe possibilidade de que uma 48 avaliação ou análise de polÃticas públicas seja apenas instrumental ou técnica, devido ao forte envolvimento entre atores e interesses. Entende-se, desta forma, que em termos de definição de avaliação não existe um consenso. No entanto, observa-se que existe um consenso em relação ao julgamento na avaliação, ou seja, a atribuição de valores deve ser pautada em critérios legÃtimos e válidos, assim como se deve explicitar, de forma clara, os critérios e parâmetros utilizados na emissão de julgamento. Além disso, não se pode desprezar o caráter polÃtico da avaliação, tornando-a muitas vezes uma ferramenta gerencial. Neste contexto, Faria (2005, p. 98) corrobora quando observa que “nos debates e nos estudos correlatos mais recentes a prevalência de um viés normativo e/ou uma priorização dos aspectos mais técnicos da avaliação das polÃticas públicas, bem como uma ênfase em seu papel de instrumento gerencialâ€. 2.2.1 Tipos de Avaliação de PolÃticas Públicas Avaliar é na verdade uma atividade intrÃnseca ao ser humano, portanto, a avaliação é uma atividade carregada de subjetividade, relacionada tanto ao campo da decisão, quanto ao campo da aprendizagem individual e social. O propósito da avaliação é guiar os tomadores de decisão para a continuidade, necessidade de correções ou até mesmo suspensão de uma determinada polÃtica ou programa. Mattos e Baptista (Op. Cit.) consideram que a avaliação tanto pode ser resultado direto da aplicação de critérios e normas bem definidos, como pode ser elaborada a partir de um procedimento cientÃfico, neste caso, caracterizando-se como uma pesquisa. Desta forma, entende-se a avaliação como uma ferramenta de pesquisa, que atende aos critérios de sistematização e planejamento, com vistas a possibilitar dados e informações de forma confiável. Avaliar projetos consiste, ainda, em verificar, de forma sistemática, se um programa está operando em conformidade com o seu planejamento. Nesse sentido, afirma Fischer (Op. Cit., p. 229) que: Por avaliação entende-se o exercÃcio, fixo ou não no tempo, destinado a avaliar, sistemática e objetivamente, a relevância, o desempenho e o sucesso de projetos e programas já concluÃdos ou em andamento. Assim como no monitoramento, as atividades de avaliação devem ser planejadas no nÃvel do paÃs, do programa ou do projeto. Deve-se estabelecer um diagnóstico da situação (base line data) e os indicadores de desempenho adequados. 49 Dye (2005) considera que a avaliação de polÃticas públicas inclui: estudar os programas; relatar os ouputs dos programas governamentais; avaliar os impactos dos programas sobre os grupos-alvo e sobre os outros grupos e propor mudanças e ajustes. Nos componentes contextuais de resultados de projeto de polÃticas públicas, destacam-se três caracterÃsticas básicas de uma avaliação, segundo Carvalho apud Araújo e Boullosa (Op. Cit., p. 115), a saber: 1) É um processo contÃnuo e permanente, que abarca o projeto desde sua concepção, sua implementação e seus resultados; 2) É um processo participativo, que envolve tanto gestores, equipe executora e bene- ficiários da ação quanto agentes externos, como especialistas em avaliação, parcei- ros e financiadores; 3) É um processo de aprendizado social, ou seja, deve permitir aos envolvidos no projeto a apropriação reflexiva da ação. Uma das propostas apontadas pelo PPNADL/2006 refere-se justamente ao desenvolvimento de metodologia de avaliação da produtividade sistêmica do território municipal, na linha das novas metodologias de avaliação da riqueza, já discutidas no âmbito do governo. 1 De modo geral, distinguem-se quatro tipos de avaliação, conforme afirma Cavalcanti (2010): Avaliação ex-ante; Avaliação ex-post ou somativa; Avaliação formativa ou de processo e Monitoramento.  Avaliação ex-ante Esta avaliação é realizada antes do inÃcio do projeto e procura medir a viabilidade do programa a ser implementado considerando a relação custo-benefÃcio, podendo ainda medir a viabilidade polÃtica e institucional, bem como as expectativas dos seus beneficiários. Segundo Mattos e Baptista (Op. Cit., p. 154) este tipo de avaliação consiste: (...) no levantamento das necessidades e estudos de factibilidade que irão orientar a formulação e a tomada de decisões para uma polÃtica. Denominadas por Draibe (2001) como “avaliações-diagnósticoâ€, atendem a um ou dois dos seguintes objetivos: (a) produzir orientações, parâmetros e indicadores que se incorporam ao projeto, 1 Metodologia de Patrick Viveret, divulgada em parceria com a Universidade de BrasÃlia; metodologias apresentadas por Jean Gadrey e Jany Catrice no documento: Os novos indicadores de riqueza; e a metodologia aplicada nos EUA no Calvert-Henderson Quality of Life Indicators. 50 melhorando seu desenho e suas estratégias metodológicas e de implementação; e (b) fixar um ponto de partida que permita comparações futuras (linhas de base ou tempo zero).  Avaliação ex-post ou somativa Este tipo de avaliação investiga em que medida o programa atinge os resultados esperados pelos formuladores no plano de implementação ou após a sua conclusão, e pode ser agrupada nas modalidades de resultados esperados e resultados não esperados a partir da análise de objetivos, impactos e resultados. Segundo Mattos e Baptista (Op. Cit., p. 157): A avaliação somativa trabalha com dados relativos aos resultados. Busca a análise e produção de informações que têm como interesse subsidiar decisões relativas à continuidade do programa, seu encerramento, sua ampliação e mesmo sua adoção por outros gestores ou em outros momentos, fundamentando-se na especificação de até que ponto os objetivos propostos foram atingidos. Neste caso, Cavalcanti (Op. Cit.) destaca que quando independente de sua modalidade a variável “resultados†ganha destaque no processo de avaliação, faz-se necessário responder a algumas indagações. A Universidade de Campinas apud Cavalcanti (Op. Cit., p. 43) destaca alguns exemplos: a) que tipos de serviços ou benefÃcios os beneficiários do programa estão recebendo? b) em que medida os serviços ou benefÃcios realmente recebidos pelos beneficiários do programa estão de acordo com as intenções originais dos formuladores? c) os beneficiários estão satisfeitos com os resultados atingidos pelo programa? d) os resultados atingidos são compatÃveis com os resultados esperados? e) como e porque os programas implementados geram resultados não esperados? Na avaliação de resultados com foco nos impactos são abordados os efeitos de uma interven- ção ou programa de mais longo prazo. Além disso, o impacto não pode ser atribuÃdo, de forma exclusiva, a uma única intervenção, mesmo que se busque na avaliação de impacto identificar qual foi à proporção da intervenção ou programa avaliado para obter-se o impacto na popula- ção geral. Nesse sentido, Mattos e Baptista (Op. Cit., p. 192-193) destacam que: (...) a avaliação de impacto deve ter um desenho rigoroso e abrangente, que inclua também os efeitos combinados de intervenções convergentes. Por isso, avaliações de impacto são tecnicamente complexas e de alto custo por buscar responder a perguntas do tipo: Quanto do efeito se deve à intervenção? Quanto da variação do efeito obser- vado foi devido à intervenção? Essas não são perguntas fáceis de responder e, em ge- ral, requer, assim como nas avaliações de resultado estudo com grupos de intervenção 51 e controle e a introdução do contra factual, ou seja, que ajuda a identificar o que acon- teceria com o desfecho esperado se a intervenção não acontecesse. Vale destacar que as avaliações ex-post, conforme observam os já citados autores (Op. Cit., p. 154), “são aquelas que ocorrem concomitantemente ou após a implementação da polÃtica e se distinguem, quanto à natureza, em „avaliação de processo‟ e „avaliação de resultadosâ€.  Avaliação formativa ou de processo Esta categoria se propõe a investigar como o programa funciona, quais as estratégias utilizadas para o alcance dos resultados. Centraliza-se nos processos e não nos resultados e, por isso, é mais utilizada na fase de implementação. Segundo Mattos e Baptista (Op. Cit., p. 154): As “avaliações de processo†buscam, mormente, identificar os atores estratégicos a serem mobilizados, a estratégia de implementação e os subprocessos e estágios pelos quais se desenvolve a implementação. De acordo com Draibe (2001, p. 30), buscam identificar os fatores facilitadores e os obstáculos que operam ao longo da implementação e que condicionam, positiva ou negativamente, o cumprimento das metas e objetivos. Tais fatores podem ser entendidos como condições institucionais e sociais dos resultados. Este tipo de avaliação tem como objetivo fornecer informações para adequar e superar pro- blemas durante a fase de implementação.  Avaliação de Resultados Neste caso, pretende-se identificar se os programas cumpriram seus objetivos, levando em consideração o quanto foi cumprido e com que qualidade. Para Draibe (2001) é possÃvel iden- tificar alguns tipos de resultados que podem ser avaliados: 1) Desempenho ou resultados (em seu sentido restrito) – são os produtos do programa, conforme estabelecidos nas metas e resultantes do processo de produção particular; 2) Impactos – referem-se à s alterações ou mudanças realizadas efetivamente na realidade que o programa busca intervir e que são provocadas por ele; 3) Efeitos – referem-se aos outros impactos do programa, ainda que não esperados, e que afetam o meio social e institucional no qual se realizou. 52 As avaliações de resultado ou de efetividade/eficácia são mais complexas metodologicamente, uma vez que abordam como e por que as atividades de uma respectiva intervenção alcança- ram os resultados esperados numa população-alvo. Este tipo de avaliação pode explicar os motivos pelos quais alguns resultados não foram alcançados, ou seja, descreve os efeitos da intervenção e aponta o que poderia ocorrer na sua falta. Conforme ressaltam Mattos e Baptis- ta, 2011, p. 192): Assim, uma avaliação de resultado usualmente requer um elemento comparativo em seu desenho: um grupo controle ou um grupo de comparação que não recebeu a inter- venção. Além disso, enfatiza as relações causais entre intervenção e efeito. Esse tipo de avaliação responde a questões do tipo: a intervenção explica os efeitos esperados? a intervenção ou programa foi a causa dos resultados observados? Para isso faz-se ne- cessário estudo com grupos de intervenção e controle para isolar a influência do con- texto externo no alcance de resultados.  Monitoramento Trata-se de um processo sistemático e periódico de análise da gestão, funcionamento e desempenho de programas e projetos e tem como objetivo identificar desvios na execução das ações entre o planejado e o executado, por isso é desenvolvido na fase de execução do projeto. Quanto à metodologia de avaliação, tradicionalmente, o modelo segue a lógica da racionalidade analÃtica, porém, nos últimos anos, vêm sendo adotadas abordagens participativas, como é o caso da Avaliação e Monitoramento Participativos – A&MP, que propõe que projetos de desenvolvimento local sejam implementados de forma participativa, flexÃvel e negociada, e, para isso, sugere-se o uso de métodos indutivo-interpretativos para levantar e analisar as informações. Segundo Fischer (Op. Cit., p. 164): Enquanto que na avaliação “convencionalâ€, a objetividade cientÃfica é um ideal a perseguir; na participativa busca-se a emancipação dos indivÃduos e comunidades. Neste sentido, ambos podem ser entendidos como modelos ideais que, na prática, apresentam uma série de limitações. (...) A aplicação de projetos de avaliação participativa é mais recente e suas limitações estão ainda para ser reveladas. Na avaliação convencional persegue-se a objetividade cientÃfica; na participativa, busca-se a emancipação dos indivÃduos. É mais adequada, segundo Fischer (Op. Cit.), quando há a necessidade de um julgamento externo independente; informação especializada e que por isso 53 só os peritos técnicos podem prover; as partes interessadas disporem de tempo para participar ou quando a discordância entre as partes é grande inviabilizando a abordagem colaborativa. Já a avaliação participativa é muito útil, em especial quando as questões tratam de dificuldades de implementação; o efeito do projeto nos beneficiários, ou ainda quando a informação que se deseja refere-se ao conhecimento dos participantes sobre as metas do programa ou sobre suas visões a respeito do desenvolvimento do mesmo, conforme classifica Fischer (Ibidem). Destaca-se ainda, que a metodologia de avaliação participativa emerge de forma intensa a partir do final dos anos 1960, quando alguns avaliadores questionaram as avaliações realizadas de cima para baixo (top-dow) sem levar em consideração os atores do objeto da avaliação. Estrella e Gaventa (1998) apud Fischer (2002, p. 165) recomendam os seguintes passos para a avaliação participativa “(i) planejamento, (ii) coleta de dados; (iii) análise de dados e (iv) documentação, relato e compartilhamento da informação gerada pela avaliaçãoâ€. Castanhar e Costa (2007) acrescentam que embora a avaliação de desempenho esteja normalmente associada à mensuração de eficiência na gestão de programas públicos, este não é o único e nem o mais importante critério, e destacam outros, de acordo com o Manual da UNICEF: a) Eficiência: termo com origem nas Ciências Econômicas que significa a menor relação custo/benefÃcio possÃvel para o alcance dos objetivos estabelecidos no programa; b) Eficácia: medida do grau em que o programa cumpre os seus objetivos e metas; c) Impacto (ou efetividade): indica se o programa tem efeitos (positivos) no ambiente ex- terno em que ele interveio, em termos técnicos, econômicos, socioculturais, institucio- nais e ambientais; d) Sustentabilidade: mede a capacidade de continuidade dos efeitos positivos desejados, após o seu término; e) Análise custo-efetividade: similar à idéia de custo de oportunidade e ao conceito de pertinência, comparando formas alternativas para ser selecionada aquela ativida- de/projeto que atenda à queles objetivos ao menor custo; 54 f) Satisfação do beneficiário: avalia a atitude do beneficiário em questão à qualidade do atendimento que está recebendo do programa; g) Equidade: busca avaliar o grau em que os benefÃcios de um programa estão sendo dis- tribuÃdos de maneira justa e compatÃvel com as necessidades do usuário. Spink (2001, p. 16) aborda a avaliação democrática, esboçada a partir da avaliação participativa, como método de avaliação restrita, destacando que: Avaliação participativa é uma técnica de avaliação; ninguém duvida da presença necessária dos avaliadores e seus conhecimentos; a questão é abrir um pouco o espaço para outros. Seguindo esta linha, é comum comentar-se nas agências internacionais que a avaliação participativa é também uma boa maneira de “educar†comunidades sobre a importância da avaliação e “ajudá-las†a aprender a fazer, um sinal claro da postura tutelar em relação à competência e opinião (...) O uso da expressão avaliação democrática busca estabelecer uma contraposição que não esconde as diferenças de poder e de influência e vai em busca de processos cada vez mais abertos em relação aos atores envolvidos e suas formas de interação; de aprofundar os mecanismos de governança a partir dos quais valor é atribuÃdo. Avaliação democrática inicia-se com a compreensão que atividades, projetos e programas são intervenções em processos contÃnuos e, ao intervir, fazem parte do mesmo processo. A avaliação democrática deve ser entendida, pois, como ação a favor de uma cidadania que inclui todos, gestores de projetos e avaliadores. Sua prática foi influenciada pela pesquisa- ação enquanto processo colaborativo de investigação e ação, pela mobilização social e pesquisa participante, pela avaliação participativa, educação popular e pela teoria e ação dialógica de Paulo Freire, destaca Spink (Ibidem). Para sintetizar e facilitar a compreensão do estudo de avaliação desenvolvido neste trabalho, o quadro a seguir apresenta a relação entre as diversas classificações de avaliações e a discussão feita sobre o ciclo de polÃtica. Quadro 03 – Relação entre classificações de avaliação existentes e o ciclo da polÃtica Ciclo da PolÃtica Classificações Formação/Formulação Implementação Avaliação Final (Resultados gerados) Avaliação ex-ante X Avaliação ex-post X X 55 Avaliação de processo X X Avaliação de Resultados X Avaliação PolÃtica X Análise de PolÃticas Públicas X Avaliação de PolÃticas Públicas X Formativa X Somativa X FONTE: MATTOS E BAPTISTA, 2011, p. 158 Os autores ressaltam, sobretudo, que o tipo de avaliação é determinado pelos objetivos e questões colocadas em relação à s polÃticas, e apresentam exemplos de perguntas disparadoras de estudos de avaliação, conforme sistematizado por Mattos e Baptista (Op. Cit., p. 159): 1) A ação polÃtica implementada trouxe mudanças positivas ou negativas para as condições prévias das populações? Qual ou quais os impactos gerados? 2) As ações previstas foram realizadas? 3) As metas definidas foram alcançadas? Os instrumentos e recursos previstos foram empregados? 4) As ações propostas utilizam os diferentes recursos com eficiência? Os autores destacam, ainda, outras questões que se apresentam na análise de cada fase, conforme quadro a seguir. Quadro 04: As fases das polÃticas e as questões que se apresentam na análise de cada fase. Fases da PolÃtica Questões pertinentes na análise de cada fase Reconhecimento do problema – montagem da agenda ï‚· Como os temas ganharam atenção dos governos? ï‚· Que problemas foram reconhecidos pelos governantes como relevantes? ï‚· Como as alternativas para estes temas foram geradas? ï‚· Como a agenda governamental se constituiu? ï‚· Por que e quando uma idéia emergiu? Formulação da polÃtica - Tomada de decisão ï‚· Como as alternativas polÃticas foram formuladas? ï‚· Como determinada proposição foi escolhida entre outras 56 alternativas? ï‚· Quem participou do processo de formulação e decisão das polÃticas? Implementação ï‚· A formulação da polÃtica apresenta objetivos, metas e direção clara? ï‚· Os recursos necessários para sua implementação foram considerados no momento da formulação/implementação? ï‚· O processo de construção da estratégia de implementação é claro? Em especial quanto à divisão de atribuições e atividades? Exige mudança organizacional? ï‚· Os atores que estão envolvidos na implementação estão de acordo e compreendem a polÃtica traçada? Avaliação ï‚· A ação polÃtica implementada trouxe mudanças positivas ou negativas para as condições prévias das populações? Qual (is) os impactos gerados? ï‚· As ações previstas foram realizadas? ï‚· As metas definidas foram alcançadas? Os instrumentos e recursos previstos foram empregados? ï‚· As ações propostas utilizam os diferentes recursos com eficiência? FONTE: Adaptado de Mattos e Baptista, 2011, p. 159 Cabe ressaltar, pois, que o presente estudo parte do reconhecimento que os métodos tradicionais e quantitativos de avaliação, embora sejam necessários, não são suficientes para sustentar adequadamente o debate proposto. Desse modo, faz-se necessário buscar nas abordagens qualitativas mecanismos alternativos que possam dar conta dessa tarefa e, então, estruturar uma proposta que melhor aproxime a discussão desses objetivos, conforme argumenta Fischer (Op. Cit.). Este trabalho alinha-se, portanto, aos princÃpios da policy evaluation (avaliação de polÃticas públicas) cuja origem concentra-se na policy analysis, distanciando-se da program evaluation (avaliação de programas). Cabe destacar, pois, que não se pretende limitar a avaliação apenas ao seu funcionamento, operacionalização, mas, sobretudo, interpretar a polÃtica – objeto do presente estudo - a partir da percepção dos atores envolvidos em sua implementação. 57 O conceito de avaliação que fundamentou a pesquisa é o de Arretche (2001) que destaca que a avaliação de polÃticas públicas é caracterizada pela atribuição da relação de causalidade. Neste caso, devem-se adotar métodos e técnicas de pesquisa que estabeleçam tal relação. Nesta perspectiva, optou-se pela modalidade de “avaliação de polÃticas públicasâ€, pois é a tipologia que melhor responde aos objetivos da pesquisa. E, segundo Mattos e Baptista (Op. Cit., p. 156): Busca reconstituir suas caracterÃsticas de forma a apreendê-las em um todo coerente e compreensÃvel, dando sentido e entendimento à s ambiguidades, incoerências e incertezas presentes em todos os momentos e estágios da ação pública. Aproxima-se da avaliação de processos à medida que permite identificar os fatores facilitadores e os obstáculos que operam ao longo da implementação, sem se preocupar-se diretamente com os resultados. Ainda que possa atribuir a um determinado desenho institucional alguns resultados prováveis, não almeja atribuir uma relação de causalidade entre o programa e um resultado. Para dar suporte à modalidade escolhida e para orientar o desenvolvimento deste estudo avaliativo, tomar-se-á como referência o conceito de “avaliação de eficáciaâ€, que está centrado no alcance dos objetivos e metas pretendidos, considerando os fatores facilitadores e/ou obstáculos nesse processo percebidos pelos atores envolvidos. Assume-se também como base conceitual, analÃtica e metodológica para o estudo a definição de avaliação de Boullosa (Op. Cit.) que considera a avaliação como um conjunto de atividades, que nem sempre são solidamente correlacionadas, guiado para a expressão de um juÃzo ou sÃntese avaliatória, direcionado a um fim, que nem sempre é claro e/ou explicito, compreendido por um conjunto de agentes, nem sempre definidos ou etiquetados como avaliadores, de modo a permitir a sua reconstrução analÃtica e discussão dos resultados, juÃzo ou sÃntese avaliatória, pelas coletividades interessadas em tal avaliação, desencadeando um processo de aprendizagem prático-institucional (relativo ao objeto de avaliação) e social (relativa à dimensão dialógico-cÃvica da sociedade em geral). Como a literatura sobre avaliação é bastante vasta, a proposta deste trabalho é a de focalizar os tipos de avaliação que melhor respondem aos problemas de implementação de polÃticas públicas. Assim, a escolha de estudo tem relação direta com a variável tempo (momento em que se realiza a avaliação), assim como com o funcionamentos e resultados da polÃtica em estudo. Para Cavalcanti (Op. Cit., p. 5): “É reconhecido que grande parte dos problemas 58 encontrados se situa na fase de implementação de um programa ou projeto, quando são reveladas as necessidades de ajustes, aperfeiçoamento e mesmo de substituição do programaâ€. 2.2.2 Avaliação da Implementação de PolÃticas Públicas A avaliação pode e deve ocorrer em diferentes momentos do ciclo de vida de um projeto - formulação, implementação e resultados/impactos - e, para cada uma delas, sofrerá variações em sua natureza, dinâmica, caracterÃsticas e propósitos. Na verdade, ao considerar os diferentes ciclos de uma polÃtica pública, se está considerando que esta é o somatório desses resultados que redirecionará os programas e o sujeitará à complementaridade ou à renovação. Como apontam Mattos e Baptista (Op. Cit., p. 191), as avaliações de processo, tidas como equivalentes a avaliação de implantação ou implementação, envolvem, em geral: (...) estrutura e processo, e enfatiza as explicações para a diferença entre o pretendido e o realizado (Brasil, 2007), por exemplo: as diferenças entre a cobertura pretendida e a cobertura alcançada, bem como as explicações para essas diferenças. De maneira geral, a avaliação de processo informa aos atores envolvidos na intervenção se as ações deste atingiram a população-alvo pretendida, o nÃvel, a extensão e a qualidade dos serviços prestados e que recursos foram necessários para apoiar o esforço realizado. A fase de implementação é vista pelos analistas da polÃtica como crucial dada a sua complexidade. Na literatura acadêmica existe uma variedade de obras que discutem a implementação no intuito de compreender as relações entre as ações propostas e as que de fato são implementadas, os sucessos e insucessos dos governos para cada situação, a exemplo de Pressman e Wildavsky (1973); Bardach (1977); Elmore (1979); Sabatier e Mazmanian (1980); Ham e Hill (1984); Hogwood e Gunn (1984); e Lindblom (1984). Conforme apontam Mattos e Baptista (Op. Cit., p. 151): Cabe aqui destacar o estudo de Hogwood e Gunn (1984), no qual o momento de implementação está diretamente relacionado à fase de formulação da polÃtica, onde há uma tendência de se construir pactos polÃticos abrangentes, sem uma especificação da polÃtica a ser implementada, ou dos pré-requisitos que a sustentam. Os autores argumentam que se o resultado da negociação no momento de formulação de uma polÃtica é o desenho de uma polÃtica ruim, com um diagnóstico impreciso e inconsistente da realidade polÃtica e institucional, a chance de implementação dessa polÃtica é pequena. Portanto, se a polÃtica é “boaâ€, mas a perspectiva de execução é ruim, pela falta de capacidade técnica ou falta de recursos, também existirão problemas na implementação. Consideram, também, que uma polÃtica está sujeita a fatores externos diversos, que não estão necessariamente associados ao momento de formulação da polÃtica e que dificultam sua implementação. Por exemplo, ao azar no momento de colocar em prática uma ação (fator má sorte). 59 Entende-se, assim, que é na fase de implementação que a polÃtica é validada em termos potenciais, e que, neste momento, a negociação se torna mais intensa e são estabelecidos novos pactos, em algumas ocasiões, com novos atores. Em geral, é dado inÃcio a um novo processo decisório e retoma-se a sua formulação. Mattos e Baptista (Op. Cit., p. 152) destacam que neste enfoque: (...) importa saber por que a implementação gera tantas possibilidades de mudança na polÃtica inicialmente desenhada. Hogwood e Gunn (1984) apontam pelo menos três razões: 1) o baixo compromisso dos polÃticos com o momento de implementação, aceitando que a eles cabe o ônus da formulação, do qual prestam contas; 2) uma divisão institucionalizada entre aqueles que formulam e os que implementam uma polÃtica, sendo estes últimos capazes de identificar os pontos-chave da operacionalização (conhecimento técnico); 3) a própria complexidade do processo, que demanda um conhecimento sólido e prévio das múltiplas variáveis que influem no processo polÃtico e que, por mais controladas que sejam, apresentam também um comportamento independente, não-linear. Neste sentido, os autores apresentam algumas questões que são importantes ao se analisar a fase de implementação de uma polÃtica, a saber: 1) A formulação da polÃtica apresenta objetivos, metas e direção clara? 2) Os recursos necessários para sua implementação foram considerados no momento da formulação/implementação? 3) O processo de construção da estratégia de implementação é claro? Em especial quanto à divisão de atribuições? Exige mudança organizacional? 4) Os atores envolvidos na implementação estão de acordo e compreendem a polÃtica traçada? Cabe destacar, ainda, que na realidade brasileira, o federalismo e a democracia representam os principais fatores que influenciam, de forma significativa, o processo de implementação de polÃticas públicas, uma vez que os executores ficaram mais próximos dos beneficiários de uma polÃtica, a partir do federalismo. Em relatório desenvolvido pelo NEEP na Universidade de Campinas apud Cavalcanti (Op. Cit., p. 15), é possÃvel identificar algumas razões que traduzem o distanciamento entre formulação e implementação de polÃticas, conforme destacado a seguir: a) falta de informações quanto aos objetivos do programa – Muitas vezes as agências formuladoras não informam aos implementadores os objetivos efetivos do 60 programa, o que pode levá-los “ [...] a eleger uma referência para a implementação – seus próprios objetivos ou objetivos dos stakeholdersâ€; b) discordância das prioridades estabelecidas nos objetivos do programa – neste caso, os implementadores conhecem os objetivos do programa, mas deles discordam e elegem “[...] suas próprias prioridades (burocráticas, de sua clientela, ou ainda de grupos de interesses) como sua referência de atuaçãoâ€; c) razões adversas – nesta situação, os implementadores conhecem e concordam com os objetivos do programa, mas devido “[...] a impedimentos associados à capacidade fiscal e administrativa das agências implementadoras até compromissos e lealdades de ordem polÃticaâ€, impossibilita-os de realizar os objetivos traçados pelos formuladores; d) imprevisibilidade – “Problemas não previstos no momento da formulação podem levar os implementadores a promover adaptação ao desenho original, com vistas a garantir que os objetivos de um dado programa sejam realizadosâ€. Nesta fase, pode-se adotar o tipo de avaliação somativa (em que os resultados de um programa ou polÃtica são focalizados) ou formativa (em que se procura analisar o funcionamento do programa, suas etapas, mecanismos, processos, conexões, e não os resultados). Frey (Op. Cit., p. 228) destaca que o interesse da „policy analysis‟ nesta fase se refere, em especial, ao fato de que, muitas vezes, os resultados e impactos reais de certas polÃticas não correspondem aos impactos que foram projetados na fase de formulação. O autor, distingue, ainda, para o processo de implementação, as abordagens, cujo objetivo principal é a análise da qualidade material e técnica de projetos ou programas, daquelas para qual a análise é direcionada para as estruturas polÃtico-administrativas e a atuação dos atores envolvidos, afirmando que: No primeiro caso, tem-se em vista, antes de mais nada, o conteúdo dos programas e planos. Comparando os fins estipulados na formulação dos programas com os resultados alcançados, examina-se até que ponto a encomenda de ação foi cumprida e quais as causas de eventuais “déficits de implementaçãoâ€. No segundo caso, o que está em primeiro plano é o processo de implementação, isto é, a descrição do “como†e da explicação do “porquêâ€. A presente pesquisa discute a eficácia da fase de implementação (avaliação in itinere) dentro do ciclo do projeto objeto de estudo, por contemplar o estágio atual da polÃtica observada, com foco na abordagem voltada para a análise das estruturas polÃtico-administrativas e sobre a percepção dos atores envolvidos acerca da polÃtica. Conforme destaca Boullosa (Op. Cit., p. 58), “a fase de implementação é onde a intervenção planejada realmente acontece. É considerada atualmente, por grande parte da literatura sobre o tema, como a fase mais complicada e imprevisÃvel de intervençãoâ€. 61 As avaliações in itinere, intermediária ou de processo são realizadas durante a fase de implementação e pode levar em conta tanto as fases de formulação como a fase de implementação, considerando suas naturezas e dinâmicas de evolução, mas quase sempre está focada no acompanhamento e verificação dos resultados mais imediatos da intervenção que se estuda, conforme destaca a mesma autora. Neste sentido, Boullosa (Ibidem, p. 114) acrescenta que na avaliação da implementação de um projeto incrementam-se as possibilidades de êxito ao proporcionar indÃcios a respeito do que se passou e por quê. Inclui-se um processo de adaptação do plano ideal à s condições reais e locais, à s dinâmicas da organização e à s incertezas programadas, e, para tanto, busca-se responder: “Quais são os componentes e atividades crÃticas (implÃcitos e explÃcitos) do projeto? Que vÃnculos existem entre esses componentes, as metas e os efeitos do projeto? Que aspectos do processo de implementação favorecem o êxito ou criam obstáculos para consecução do projeto?†Para tanto, deve-se incluir como objetivos da avaliação da implementação, de acordo com a autora os seguintes objetivos: 1) incrementar a eficácia das atividades em curso (desde o inÃcio do projeto e modificando as atividades iniciais, se necessário); 2) apoiar a continuação do projeto a longo prazo; 3) deixar claro porque se cumprem ou não se cumprem as metas do projeto, auxiliando nas tomadas de decisão. Spink (Op. Cit.) agrega a esse debate apresentando algumas perguntas que devem ser feitas na avaliação da implementação de um Projeto ou Programa, em diversos graus de detalhe e de acordo com o processo e circunstâncias: 1) As ações (atividades, projeto ou programas) estão funcionando de acordo com o planejado e estão chegando aonde devem chegar e acontecendo onde devem acontecer? 2) Quais os resultados imediatos e de curto prazo das ações? 3) Quais as consequências que podem ser observadas: intencionais e não intencionais, positivas e negativas? 4) Qual o impacto do trabalho como um todo na situação social mais ampla que você queria alterar em primeiro lugar? A primeira pergunta favorece a análise do desempenho básico do que se quer avaliar, ou seja, a eficiência ou eficácia. Nas próximas perguntas ocorrem as brigas entre os campos de conhecimento, grupos profissionais e atores sociais, pois as mesmas tratam de como medir 62 aquilo que está acontecendo, destaca o autor e cita um modelo similar ao processo apresentado que é usado na Europa na área de desenvolvimento econômico local com seus sete passos: 1) necessidades de ação; 2) objetivos do projeto; 3) meios de agir; 4) ações implantadas; 5) resultados; 6) efeitos dos resultados e 7) impactos do projeto. Nesse sentido, Mattos e Baptista, (Op. Cit., p. 150) contribuem com a discussão ao afirmarem que: Esta concepção faculta ao gestor a possibilidade de considerar insucessos (em especial, a não consecução de objetivos e metas) como desvios de rota cometidos por aqueles que, localmente, não foram capazes de executar a polÃtica da maneira exata como foi estabelecida. Embute, portanto, uma divisão do trabalho na qual os que estão no nÃvel central de poder detêm o monopólio da elaboração e da implantação das polÃticas, restando aos que estão na „ponta dos serviços‟ a colocação em prática do que foi pensado por aqueles que estão no comando da polÃtica. Consequência direta deste processo: os bônus pelos acertos são capitalizados, sobretudo, pelos gestores, enquanto os ônus dos erros são distribuÃdos entre os executores e os setores da sociedade que sofrem por não terem seus problemas superados. Vale destacar que no processo de avaliação da eficácia percebe-se que, muitas vezes, os programas não atingem os objetivos e metas que foram propostos, ainda que sua implementação cumpra o que foi desenhado originalmente, bem como as estratégias que foram estabelecidas na formulação. Tais divergências podem estar associadas tanto a problemas de relacionamento entre formuladores, implementadores e stakeholders, como a falta de capacidade institucional e falta de diálogo e negociação na esfera pública, bem como a diversos outros fatores. Para Mattos e Baptista (Op. Cit.) o grande desafio para os desenhos das avaliações é justamente conseguir apreender o quanto o alcance ou não das mudanças esperadas estão relacionadas aos fatores contextuais que podem referir-se a: a) facilidades que podem ser compreendidas como aspectos, circunstâncias e/ou fenômenos que contribuÃram para o sucesso da atividade/resultado; b) as barreiras como aspectos e circunstâncias, relacionados ao projeto e instituições envolvidas, que dificultaram a execução da atividade e o alcance do resultado; c) as externalidades que se referem a aspectos e circunstâncias, fora das possibilidades do projeto e governabilidade dos atores envolvidos, que dificultaram ou influenciaram a execução das atividades. 63 2.2.3 Eficiência, Eficácia e Efetividade em PolÃticas Públicas Na perspectiva do polyci cycle, a avaliação deve perpassar por todas as fases do ciclo da polÃtica, pois as mesmas estão sujeitas a apresentar déficits de eficiência, eficácia ou efetividade, pilares que dão suporte à avaliação de polÃticas públicas. A crise do Estado e a escassez de recursos que impactavam a capacidade de resposta do governo à s crescentes demandas na área social, bem como a preocupação com a democratização dos processos e ainda com a equidade dos resultados, fez com que fossem introduzidas na agenda avaliativa preocupações com a eficiência, a eficácia e a efetividade da ação estatal, assim como com a qualidade dos serviços públicos. (FARAH, 2001). 2.2.3.1Eficiência em PolÃticas Públicas Uma polÃtica é eficiente quando otimiza os recursos utilizados, ou seja, quando consegue obter o melhor resultado possÃvel com os recursos disponÃveis. Nesse sentido Belonni, Magalhães e Souza (2001) consideram que a avaliação da eficiência de uma polÃtica pública inclui verificar se as necessidades do público-alvo foram atendidas, se os recursos alocados foram utilizados de forma a proporcionar uma relação custo-benefÃcio excelente e se a implementação da polÃtica pública não resultou em sobreposição de esforços. Para Cavalcanti (Op. Cit., p. 9), avaliar eficiência implica basicamente em responder aos seguintes questionamentos: “Quanto o programa fez? O quanto de recursos utilizou? E em quanto tempo? Os resultados obtidos revelam a eficiência (fazer mais com menos e em tempo hábil) do programaâ€. Para este caso, a avaliação formativa ou de processos é a mais indicada, pois a mesma dá enfoque nos processos e mecanismos de execução. Assim, pode-se compreender em que medida acontece a otimização dos recursos públicos financeiros, materiais e humanos, a partir da comparação entre metas alcançadas, recursos que foram empreendidos e tempo de execução. De acordo com Cavalcanti (Ibidem, p. 07), Sua função maior é a de observar em que medida o programa está sendo implementado como planejado. Preocupa-se em responder, entre outras, as seguintes indagações: a) A população-alvo está sendo atendida, conforme as metas? b) O cronograma está sendo cumprido? 64 c) Os recursos estão sendo alocados com eficiência? Na visão de Gonçalves (Op. Cit.), o déficit de eficiência se dá quando os recursos que foram previstos para a implementação de um determinado programa não são condizentes com os alocados para a sua realização. Para tanto, leva-se em consideração os instrumentos, procedimentos, conteúdos e métodos utilizados, bem como a sua adequação ao público-alvo. Draibe (Op. Cit.) contribui neste sentido, pois entende que este tipo de avaliação investiga a relação entre o esforço empregado na implementação do programa e os resultados alcançados. 2.2.3.2 Eficácia em PolÃticas Públicas A eficácia de uma polÃtica pública está relacionada aos resultados que a mesma produz sobre a sua população beneficiária (efeitos) e sobre o conjunto da população e do meio ambiente (impactos), conforme destaca Cavalcanti (Op. Cit.). Problemas de eficácia ocorrem quando independente dos recursos disponÃveis, o programa não atinge os objetivos e metas que foram estabelecidos para um determinado perÃodo de tempo. Os problemas de eficácia relacionam-se a divergência entre os resultados alcançados e os objetivos planejados. Como destaca Gonçalves (Op. Cit., p. 76), “avaliar a eficácia é compreender as mudanças que uma intervenção exógena provocou em uma dinâmica social endógenaâ€. Nesta modalidade, assim como na avaliação de eficiência, o monitoramento é um tipo de avaliação propÃcia. Cavalcanti (Op. Cit., p. 8) ressalta que “(...) para monitorar é imprescindÃvel que o problema esteja bem definido, bem como as ações estejam bem desenhadas e programadas, identificadas por indicadores claros e objetivos, possÃveis de serem trabalhadosâ€. Além do monitoramento, a autora destaca o tipo de avaliação somativa ou de resultados, pois trata de avaliar se o programa ou projeto produziu algum efeito sobre os seus beneficiários e qual a classificação de tais efeitos. 65 2.2.3.3 Efetividade em PolÃticas Públicas O conceito de efetividade se desdobra a partir da correspondência entre os objetivos que foram traçados num determinado programa ou projeto e os resultados atingidos. Trata-se de uma avaliação de resultados. Cavalcanti (Ibidem, p. 11) ressalta que: Muitos autores tratam o conceito de eficácia e efetividade de forma igual, mas é prudente, quando se trata de avaliação de polÃticas públicas, fazer esta distinção. Sendo assim, a eficácia é uma dimensão do processo de desenvolvimento e implementação do programa. Neste caso, o modelo de avaliação indicado é o de resultados, uma vez que visa aferir os resultados “intermediários†(até o final do programa). A efetividade aponta outra dimensão do resultado – os finais, ex-post -, tem a ver com os resultados mais abrangentes da polÃtica junto aos setores visados. Neste caso, o tipo de avaliação adequada é a avaliação de impactos, já que procura traduzir os impactos do programa no contexto mais amplo, (econômico, polÃtico e social), objetivando a melhoria da qualidade de vida. A avaliação da efetividade de uma polÃtica pode ser averiguada tanto por meio da avaliação dos resultados junto ao público-alvo, como pela avaliação do impacto que aquela intervenção pública provocou no contexto polÃtico, econômico e social, acrescenta a autora. Destaca-se a avaliação somativa neste processo, pois seu objetivo principal é o de analisar a efetividade de um programa para compreender em que medida o mesmo atingiu os resultados esperados. A avaliação de impacto também diz respeito à efetividade de uma polÃtica pública, uma vez que permite a verificação dos resultados junto ao público-alvo. Nesse sentido, Gonçalves (Op. Cit., p. 76) destaca que: A avaliação de impacto produz informações a respeito dos efeitos, desejados e indesejados, da ação do Estado sobre a sociedade, que, quando disseminadas corretamente, levam à ampliação da consciência polÃtica, dos gestores públicos e da sociedade civil organizada, e, possibilita a releitura do processo à luz da relação simbiótica existente entre as partes. Para Draibe (Op. Cit.), a avaliação da efetividade refere-se à relação que existe entre objetivos, metas, impactos e efeitos. Sendo assim, a medida da efetividade de um programa se dá pelas quantidades e nÃveis de qualidade com que se realizam as alterações (impactos e efeitos) que se pretende provocar na realidade abraçada pelo programa. A escolha pela avaliação da percepção da polÃtica neste estudo viabilizou o alcance dos objetivos propostos. De posse deste levantamento teórico foi possÃvel desenhar um instrumento capaz de avaliar a eficácia do Projeto. O passo seguinte foi estabelecer os 66 aspectos metodológicos da pesquisa e desenhar o instrumento de avaliação. A partir da aplicação da referida metodologia foi possÃvel avaliar a eficácia da polÃtica em questão. O capÃtulo a seguir detalha o percurso metodológico utilizado para a realização da pesquisa que resultou nesta dissertação. 67 3. ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA Este capÃtulo tem por objetivo apresentar os pressupostos metodológicos que fundamentaram o desenvolvimento da pesquisa. Tais aspectos referem-se à abordagem, pressupostos/premissas e estratégias utilizadas, bem como, o modelo de análise, roteiros e tipos de entrevistas definidos. 3.1 ABORDAGEM METODOLÓGICA A pesquisa caracteriza-se, no que tange a sua finalidade, como uma pesquisa aplicada, observacional, conduzida sob a forma de estudo de caso ilustrativo. Yin (2001) ao definir a técnica de estudo de caso reúne dois aspectos principais que caracterizam essa estratégia de pesquisa: seu escopo e seus aspectos metodológicos. Quanto ao escopo, destaca que: Um estudo de caso é uma investigação empÃrica que investiga um fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto da vida real, especialmente quando os limites entre o fenômeno e o contexto não estão claramente definidos [...] (YIN, 2001, p. 32). Na perspectiva metodológica esclarece: A investigação de estudo de caso enfrenta uma situação tecnicamente única em que haverá muito mais variáveis de interesse do que pontos de dados, e, como resultado, baseia-se em várias fontes de evidência, com os dados precisando convergir em um formato de triângulo, e, como outro resultado, beneficia-se do desenvolvimento prévio de proposições teóricas para conduzir a coleta e a análise de dados. (YIN, 2001, p. 32- 33). Neste caso, em se tratando de avaliação de polÃticas públicas a partir de um caso empÃrico, vale a pena destacar a observação feita por Frey (Op. Cit., p. 243): Os estudos de polÃticas públicas enfocam basicamente casos empÃricos e seus resultados têm, portanto, pelo menos em um primeiro momento, apenas validade situacional. Corre-se pois o risco de considerar padrões de ação e estruturas observados e detectados nos estudos empÃricos, os quais de fato estão presentes só conjunturalmente, como caracterÃsticas inerentes de um certo sistema polÃtico- administrativo („ibidem‟). Todavia, vale mencionar que, à medida que cresce o número de estudos especÃficos realizados nos vários campos de polÃtica, aumenta não apenas o conhecimento referente à s polÃticas especÃficas, mas também o conhecimento teórico referente à s inter-relações entre estruturas e processos do sistema polÃtico- administrativo por um lado e os conteúdos da polÃtica estatal por outro. Levando-se em conta por meio do ciclo polÃtico a dinâmica temporal dos diversos processos, 68 abrem-se acima de tudo possibilidades para uma compreensão mais consistente de processos transicionais de caráter dinâmico. Quanto aos objetivos, este estudo se classifica como exploratório, por proporcionar contato direto com o problema, via mapeamento documental, resgate teórico e acesso a depoimentos de pessoas que vivenciam a realidade pesquisada; e, descritiva, pois registra, analisa e estabelece relações entre as variáveis, sem manipulá-las (GIL, 1994; VERGARA, 2007). No que diz respeito à abordagem ela se destaca como pesquisa qualitativa do tipo avaliativa, pois envolve uma avaliação mais aprofundada das informações coletadas em um determinado estudo (observacional ou experimental) na tentativa de explicar o contexto de um fenômeno no âmbito de um grupo, grupos ou população. No que tange ao delineamento, este estudo adotou os seguintes procedimentos técnicos: a) revisão bibliográfica, ao mapear e explorar a literatura disponÃvel sobre o tema; b) investigação documental, ao buscar materiais que ainda não tinham sido submetidos à análise; e c) pesquisa de campo, ao realizar uma investigação empÃrica com atores institucionais ligados à polÃtica, com utilização de entrevistas semi-estruturadas. Para avaliar a percepção dos atores foram adotadas as técnicas denominadas entrevista e documentação indireta. O procedimento da técnica de entrevista deu-se pela necessidade de coletar dados não encontrados em registros e fontes documentais (CERVO; BERVIAN, 1996). A escolha pelo procedimento de coleta de dados denominado documentação indireta, deu-se através da leitura e análise de materiais produzidos por terceiros (MARCONI; LAKATOS, 2008). A coleta de dados para uma avaliação de polÃticas públicas normalmente é realizada através de abordagens qualitativas para descrever as atividades e percepções dos atores relacionadas ao programa, em especial no estágio de implementação. Nesta ordem, Mattos e Baptista (Op. Cit.) indicam as seguintes técnicas: observações, entrevistas, grupos focais (equipe do programa, usuários e outros informantes-chaves) e revisão de documentos da intervenção. As fontes de dados compõem-se de três tipos: (1) fontes de informação bibliográfica (polÃticas públicas e avaliação de polÃticas públicas); (2) dados secundários referentes à caracterização 69 do projeto e participação de outros atores na gestão (Distrito de Irrigação); (3) pesquisa empÃrica, realizada através das entrevistas. A pesquisa documental centrou-se nos documentos do Distrito de Irrigação e nos documentos produzidos pela equipe de assistência social ao projeto. Vale ressaltar que, como o Distrito de Irrigação ainda carece do controle e do monitoramento de suas ações, o material não é tão rico, e, conforme se observou na pesquisa exploratória, encontra-se disperso. Para a análise dos dados adotou-se a técnica de análise de dados qualitativa denominada análise de conteúdo, com o objetivo de identificar o que vem sendo dito acerca do tema (VERGARA, 2005), e, então, proceder à avaliação da percepção da polÃtica quanto à sua eficácia. A análise de conteúdo é uma técnica que trabalha os dados coletados, objetivando a identificação do que se está sendo dito acerca de um determinado tema e por isso se faz necessário descodificar o que está sendo comunicado. Para este processo de descodificação o pesquisador pode utilizar vários procedimentos, como análise léxica, análise de categorias, análise de enunciação e análise de conotações, conforme destaca Chizzotti (2006). Para esta pesquisa adotou-se a técnica de análise de categorias a partir do desenho do instrumento de avaliação estabelecido. Para a aplicação da técnica foram seguidas as seguintes etapas, conforme apresentação de Bardin (2006): 1) pré-análise, 2) exploração do material e 3) tratamento dos resultados, inferência e interpretação. Num primeiro momento, fase da pré-análise, todo o material a ser analisado foi organizado com o objetivo de torná-lo operacional, sistematizando as idéias iniciais através da leitura flutuante, escolha dos documentos, formulação das hipóteses e dos objetivos e a determinação de indicadores por meio de recortes nos documentos de análise e nas entrevistas que foram transcritas. Em seguida, o material foi explorado (segunda fase) a partir da definição de categorias e subcategorias de avaliação desenhadas na pesquisa, orientado pelas hipóteses e referenciais teóricos. 70 Por fim, realizou-se o tratamento dos resultados, inferência e interpretação (terceira fase) a partir da análise reflexiva e crÃtica. A categorização estabelecida facilitou este processo. Neste aspecto, Frey (Op. Cit., p. 221) contribui sobre a importância de um direcionamento processual e investigação da vida interna ao analisar uma polÃtica pública. Os estudos tradicionais sobre polÃticas públicas – baseados em métodos quantitativos – frequentemente são forçados a se limitar a um número reduzido de variáveis explicativas, devido à s dificuldades técnicas e organizativas. No entanto, se quisermos saber mais detalhes sobre a gênese e o percurso de certos programas polÃticos – os fatores favoráveis e os entraves bloqueadores -, então, a pesquisa comparativa não pode deixar de se concentrar de forma mais intensa na investigação da vida interna dos processos polÃtico-administrativos. Com esse direcionamento processual, tornam-se mais importantes os arranjos institucionais, as atitudes e objetivos dos atores polÃticos, os instrumentos de ação e as estratégias polÃticas. Neste sentido, entende-se que a estratégia metodológica atende aos requisitos da pesquisa, pois, conforme aponta Mattos e Baptista (Op. Cit., p. 77): O conteúdo de uma polÃtica apresenta-se nos documentos institucionais, nos discursos oficiais, nas falas dos participantes do debate polÃtico, na mÃdia e em outros veÃculos. Reconhecer e tratar um conteúdo é buscar as linhas de sentido de uma ação polÃtica na visão dos diferentes grupos e sujeitos em disputa. É importante diferenciar esta forma de análise daquela que busca o sentido oculto da polÃtica, a intencionalidade dos atores e as incoerências da própria ação polÃtica dos sujeitos. O quadro a seguir sintetiza a estratégia metodológica que orientou o estudo: Quadro 05: Sistematização Metodológica (Objetivos EspecÃficos) OBJETIVOS METODOLOGIA (1) Compreender os aspectos teórico- metodológicos que fundamentam os processos de avaliação em polÃticas públicas com foco na modalidade de análise da eficácia; - Pesquisa em fontes de informação bibliográfica (digital e impressa). -Análise qualitativa. (2) Identificar e/ou desenhar instrumentos meto- dológicos que possibilitem analisar a eficácia do Projeto de Irrigação de Ponto Novo-BA; - Pesquisa em fontes de informação bibliográfica (digital e impressa). -Análise qualitativa. (3) Compreender, de forma critica e contextualizada, o projeto, seu enquadramento institucional, seus ciclo de implementação, a dinâmica que caracteriza a atuação dos principais atores envolvidos, os objetivos preten- didos, o público-alvo beneficiado diretamente com a - Pesquisa em Souza (2010) e Silva (2008) - Pesquisa documental (documentos do Distrito de Irrigação, da Seagri, da equipe de assistência social e atas do Conselho); - Entrevistas semiestruturadas com o gestor do 71 polÃtica, os critérios de inclusão e seleção dos reassen- tados e dos empresários locais, os benefÃcios recebidos pelos participantes e a presença ou não de condiciona- lidades; Distrito e Diretoria da Seagri. - Análise qualitativa - Análise de conteúdo (4) Verificar se a polÃtica tem conseguido alcançar os objetivos e metas definidos na formulação e/ou revisão do Projeto; - Pesquisa em Souza (2010) e Silva (2008) - Entrevistas semiestruturadas com o gestor do Distrito, Diretoria da Seagri, Secretário de Agricultura e Presidente da Associação dos Reassentados. - Observação in loco - Análise qualitativa - Análise de conteúdo (5) Identificar os pontos crÃticos do processo de im- plementação da polÃtica, ressaltando os aspectos facili- tadores e/ou obstáculos no alcance da eficácia plane- jada. - Pesquisa em Souza (2010) e Silva (2008) - Entrevistas semiestruturadas com o gestor do Distrito, Diretoria da Seagri, Secretário de Agricultura e Presidente da Associação dos Reassentados. - Observação in loco - Análise qualitativa - Análise de conteúdo Fonte: Elaboração própria. Na realização da pesquisa observou-se um déficit de informações e memória institucional acerca do projeto, o que exigiu maior esforço e tempo na busca de dados primários, devido a sua relevância para a pesquisa. Neste sentido, Frey (Op. Cit., p. 246) corrobora quando considera que: Um estudo de polÃticas públicas que, na sua análise e avaliação, quer fazer justiça – pelo menos aproximadamente – à realidade empÃrica, dificilmente, pode, no caso da existência de déficits de informação, deixar de dirigir uma parte dos esforços de pesquisa para esses levantamentos primários, ainda que isso possa significar – por consequência das limitações de capacidades e recursos disponÃveis – cortes nas pretensões referentes à profundidade das investigações sobre a dimensão „policy‟. Na seção a seguir, detalham-se as etapas cumpridas no decorrer da pesquisa para obtenção, tratamento e análise dos dados referentes à análise da eficácia da polÃtica. 3.2 ETAPAS DA PESQUISA A pesquisa foi desenvolvida em duas etapas. Na primeira buscou-se desenhar um instrumento que permitisse proceder à análise da eficácia da polÃtica e para o planejamento da pesquisa de campo. Enquanto na segunda etapa, voltou-se para a devida análise dos dados obtidos sobre a referida polÃtica. Para melhor compreensão das duas etapas, como parte de um mesmo processo de trabalho, em um primeiro momento expõem-se os procedimentos adotados no desenho do instrumento. Em seguida, descreve-se planejamento da pesquisa de campo. 72 3.2.1 Primeira etapa: Desenho do instrumento de avaliação Este estágio da pesquisa trata da avaliação de polÃticas públicas na modalidade de análise da eficácia, e, para tanto, foi desenhado um instrumento de análise a partir da sistematização de categorias e subcategorias analÃticas. As categorias e subcategorias analÃticas desenhadas nesta pesquisa foram elaboradas, a priori, levando em consideração o que Laville & Dionne (1999) denominam de modelo fechado, que permite ao pesquisador a prévia definição das categorias e subcategorias analÃticas tomando como base a teoria que trata do tema pesquisado. Além disso, para o desenho do instrumento tomou-se como referência a sistematização de variáveis para identificação de polÃticas públicas inovadoras, democráticas e participativas proposta por Farah (1997; 2002) e Spink e Farah (1999). Assim, com base no referencial teórico adotado nesta pesquisa que trata da análise da eficácia de polÃticas públicas e nos modelos sugeridos por Lavile & Dionne; Farah (1997; 2002) e Spink e Farah (1999), foram desenhadas nesta etapa da pesquisa as seguintes categorias e subcategorias de análise, conforme quadro a seguir: Quadro 06: Categorias e subcategorias para análise de eficácia de polÃticas públicas CATEGORIAS SUBCATEGORIAS Engenharia institucional e traços que constituem a polÃtica ï‚· Clareza dos objetivos, metas e direção da polÃtica; ï‚· Recursos necessários considerados no momento da formulação/implementação da polÃtica; ï‚· Cumprimento dos objetivos, metas e prazos. Atuação dos atores envolvidos ï‚· Clareza no processo de construção da estratégia e divisão das responsabilidades; ï‚· Participação e compreensão da polÃtica por parte dos atores envolvidos. 73 Condições institucionais e sociais dos resultados ï‚· Fatores facilitadores que operam ao longo do processo de implementação da polÃtica; ï‚· Obstáculos que operam ao longo do processo de implementação da polÃtica. Fonte: Elaboração própria 3.2.2 Segunda etapa: Planejamento da pesquisa de campo Após a definição das categorias e subcategorias a serem utilizadas para a análise da eficácia do Projeto de Irrigação de Ponto Novo, em implementação desde 1999, partiu-se para o planejamento da pesquisa de campo, a ser realizada junto à Superintendência de Irrigação, na Secretaria de Agricultura, Irrigação e Reforma Agrária (SEAGRI); Distrito de Irrigação; Prefeitura de Ponto Novo-BA; EBDA; SÃtio Barreiras e Sindicato dos Assentados, determinados como sujeitos da pesquisa – atores institucionais da polÃtica. Ao contatar os atores institucionais todos se mostraram interessados em colaborar com a pesquisa. No contato com o Distrito de Irrigação, responsável pela gestão do Projeto, a pesquisadora requereu acesso aos documentos do Projeto (Estatuto do Distrito, Projeto inicial e possÃveis alterações/revisões, atas de reuniões e relatórios de avaliação elaborados pela assistência social), relativos ao perÃodo de 1999 a 2012, e os mesmos foram disponibilizados. De posse desta documentação e após exploração exaustiva da mesma, os atores foram contatados no sentido de agendamento da data para a realização das entrevistas, que aconteceram no perÃodo de 21 a 29/03/2012, o que viabilizou a coleta de dados não disponÃveis nos documentos oficiais explorados. 3.2.3 Instrumentos de coletas de dados Para coletar os dados secundários referentes à etapa da pesquisa fez-se uso da técnica de análise documental, que compreende a identificação, a verificação e a apreciação de documentos para determinado fim, conforme ressalta Moureira (2008). Para coletar os dados primários realizou-se 06 (seis) entrevistas semiestruturadas com os atores institucionais já citados conforme quadro a seguir: 74 Quadro 07: Atores Institucionais ATOR INSTITUCIONAL ENTREVISTADO Superintendência de Irrigação Antonio Fernando Pereira dos Santos (Diretor de Engenharia de Irrigação na SEAGRI) Distrito de Irrigação José Adilson Cardoso da Silva (Engenheiro Agrônomo e Gerente do Distrito de Irrigação) Prefeitura de Ponto Novo Fernando Antonio da Silva (Secretário de Agricultura) EBDA Ederli Afonso Vieira (Técnico agropecuário e responsável pelo escritório da EBDA em Ponto Novo) SÃtio Barreiras Fábio Regis de Albuquerque (Sócio) Sindicato dos Assentados José Vieira (Presidente) Fonte: Elaboração própria A escolha deste tipo de entrevista deu-se pela flexibilidade e adaptabilidade desta técnica de coleta de dados qualitativos (Hair et al, 2005). Para nortear o processo, sem, no entanto, influenciá-lo ou direcioná-lo, elaborou-se 05 (cinco) roteiros temáticos, um para cada ator entrevistado (Ver Apêndices A, B, C, D, E e F) tomando como base as categorias e subcategorias desenhadas na pesquisa. Ao discorrerem livremente sobre suas experiências junto ao projeto investigado, os entrevistados expressaram suas percepções. As entrevistas tiveram duração média de uma hora cada, todas foram gravadas em formato MP3 e transcritas na Ãntegra (Ver Apêndices A, B, C, D, E e F). 3.2.4 Análise de dados Os dados primários e secundários relativos à pesquisa foram submetidos ao método de análise de conteúdo. Dessa forma, tanto os documentos e relatórios, como as informações obtidas a partir das entrevistas semiestruturadas junto aos atores institucionais passaram pelas seguintes fases, conforme indica Bardin (2000): a) leitura flutuante; b) seleção de unidades de análise; c) processo de categorização e subcategorização; d) agrupamento das unidades de análise; e) codificação das unidades de análise. A atenção aos critérios estabelecidos na análise de conteúdo favoreceu a análise da eficácia do projeto. 75 Definiu-se como unidade de registro, para fins da pesquisa, a frase modal selecionada pelo seu propósito de comunicação e não pela sua extensão. Dessa forma, inicialmente foi feita a exploração dos textos a fim de extrair frases modais que evidenciassem estruturas linguÃsticas simples ou enunciados complexos relacionados à s categorias e subcategorias analÃticas desenhadas previamente e pautadas na literatura que trata de avaliação de polÃticas públicas. Assim, depois de identificadas, as frases modais foram acopladas em categorias e subcategorias analÃticas e foram adotados como critério de inclusão e exclusão os significados, sentidos e a relação de significância das mesmas. Destaca-se que as categorias e subcategorias analÃticas desenhadas para a pesquisa cumprem as prerrogativas de análise de conteúdo indicadas por Bardin (1977), uma vez que são: ï‚· Exaustivas: por percorrer todo o conjunto de textos; ï‚· Exclusivas: por precisar os elementos de cada categoria; ï‚· Objetivas: por permitir o uso por outros pesquisadores; ï‚· Pertinentes: tanto no que diz respeito ao objetivo do estudo quanto ao tema em questão. 3.3 PREMISSAS E PRESSUPOSTOS Premissas são condições assumidas como bases orientadoras para o desenvolvimento da pesquisa. São fatores que, para propósitos de planejamento e execução da investigação podem ser consideradas como adequadas e seguras. De acordo com Mattos e Baptista (Op. Cit.), em geral, as pessoas que se interessam por estudos de polÃtica já apresentam algum entendimento da polÃtica em questão, já têm alguma relação com a polÃtica ou já têm algo a dizer sobre ela e estão buscando elementos de sustentação para seu pensar. Assim, para o desenvolvimento da presente pesquisa, assumiu-se a seguinte premissa e pressuposto: Premissa 1: O projeto inseriu o municÃpio de Ponto Novo no mercado regional, estadual e 76 nacional, consolidado através da atividade de fruticultura irrigada do estado. Atualmente, a agricultura irrigada constitui uma das mais importantes oportunidades de negócio no contexto da economia baiana. Entretanto, apesar da implantação do projeto ter gerado alguns resultados positivos, conforme afirma Souza (2010), estes efeitos não têm conseguido reverter os problemas históricos que marcam o baixo desempenho da economia do municÃpio e região no contexto estadual e nacional. Observa-se pois, que o municÃpio mantém, ainda, os traços tÃpicos de uma sociedade desestruturada socialmente e economicamente, situação agravada pelas forças do uso intensivo dos seus recursos, já escassos e restritos, o que tende a agravar, ainda mais, a situação de restrições da população local. Pressuposto 1: Diante da constatação identificada na Premissa indicada acima, reconhece-se que o Projeto de Irrigação em Processo de Implementação no MunicÃpio de Ponto Novo-BA ainda não alcançou os objetivos e metas previstas. Exceto por alguns poucos resultados positivos, observados nas dimensões econômica e social. Nesse sentido, assume-se como pressuposto que o projeto revela problemas de concepção e principalmente de gestão, que pode ser comprovado pela condução desarticulada das ações, da falta de interação entre os atores (ausência da policy network) e pelas consequências negativas no âmbito ambiental. Os dados analisados, na pesquisa exploratória, permitem afirmar que problemas de concepção e, principalmente, de gestão têm comprometido o alcance dos objetivos e metas definidos no projeto em análise, comprometendo e frustrando, desse modo, o processo de implementação da polÃtica de desenvolvimento do MunicÃpio de Ponto de Novo e região. Constatou-se que a incapacidade de gestão do projeto tem provocado um choque cultural (tÃpico de polÃticas públicas do tipo Top Down). Partimos da premissa de que tal constatação é um indicativo de que o processo de mudança cultural não tem sido priorizado no desenho, na implementação e nos instrumentos de avaliação da polÃtica. Como consequência, assiste-se a um natural divórcio entre as expectativas formais estabelecidas no projeto e aquelas implÃcitas no imaginário da sociedade/comunidade beneficiada. Essa situação é agravada pela ausência de sistematização, guarda de registros que possibilitem a construção de uma memória do projeto e da formação de uma inteligência institucional que 77 permita a consolidação dos novos padrões de gestão para o alcance do desenvolvimento proposto. Na subseção seguinte será apresentada a caracterização do MunicÃpio bem como, uma visão geral do Projeto de Irrigação de Ponto Novo-BA, para familiarizar o leitor com o ambiente e contexto da pesquisa. 78 4 UMA REFLEXÃO SOBRE O LÓCUS DA PESQUISA E SUA CARACTERIZAÇÃO Esta seção foi desenvolvida com base nos trabalhos de Souza (2010) que discute os precedentes e consequências regionais da polÃtica pública, e de Silva (2008) que discorre sobre o processo de implantação da barragem de Ponto Novo, na perspectiva do processo de reordenação territorial e da ação do Estado. Além disso, muitas informações quanto ao municÃpio foram extraÃdas do site da Prefeitura de Ponto Novo. Estes trabalhos contribuÃram para uma melhor compreensão da caracterização da região e do projeto avaliado, como também para uma breve aproximação à sua composição social e resultados alcançados a partir da implementação do Projeto de Irrigação de Ponto Novo. Destaque-se, neste sentido, que os trabalhos foram de grande relevância para o desenvolvimento deste estudo na medida em que apoiado nos seus resultados foi possÃvel avançar no desenho e realização da pesquisa exploratória no que tange aos aspectos relativos à eficácia da polÃtica, com ênfase na análise de polÃticas públicas enquanto modalidade de avaliação. 4.1 CARACTERIZAÇÃO DO MUNICÃPIO DE PONTO NOVO 2 Ponto Novo é um pequeno municÃpio do Estado da Bahia –Brasil, com uma dinâmica social e econômica articulada à s atividades rurais. 4.1.1 Um breve histórico do MunicÃpio Ponto Novo situa-se no Centro Norte do Estado da Bahia, região Piemonte Norte do Itapicuru, pertence à 28ª. Região Administrativa – Senhor do Bonfim, cidade situada a 45 km de distância. Com uma área aproximada de 497 km², fica a 332 km de Salvador, e, segundo dados do IBGE (2012), conta atualmente com uma população de 15.742 habitantes (Censo 2010). Ponto Novo surgiu na margem direita do Rio Itapicurú-Açú, na extremidade norte do então municÃpio de Saúde, Região de Jacobina, por volta do ano de 1946. Nasceu com o advento da construção de uma ponte, pelo DERBA, sobre o referido rio, na estrada que ligaria Feira de 2 Parte dos dados extraÃdos em http://www.pontonovobahia.com.br/?pg=noticia&cidade=&id=1127 79 Santana a Juazeiro, cortando terras da fazenda Capim Grosso, propriedade de Leovigildo Ferreira da Silva e Agnelo Pereira do Amaral. O nome de Ponto Novo – segundo algumas fontes – foi uma colocação dos recém-fundadores, operários da construção da ponte, na sua conclusão. Alguns queriam que o lugarejo fosse chamado de Ponte Nova – justa homenagem à nova construção. Outros, alegando existir outro lugar com o mesmo nome, opinaram por Ponto Novo, visto que se tratava de um “ponto novo†na região. Tem-se ainda a informação de que os caminhoneiros que passaram a utilizar a nova estrada começaram a marcar encontros no “ponto novo†de fiscalização implantado no povoado, que já contava com uma bomba de gasolina, algumas casas e até uma pensão. Vale destacar, que, de acordo com dados do PDU (2004), na região também se configurou a figura do coronelato e a exigência de oligarquias que não possuÃam interesse em desenvolver a região, com a intenção de manter o status quo e preservar o domÃnio sobre o sertanejo e as demais camadas sociais. Assim, a população estava ocupada em atividades para atender à s oligarquias locais, bem como aos seus interesses polÃtico-eleitorais. Desta forma, a atual estrutura socioeconômica da região Piemonte do Norte do Itapicuru e, em especial, do municÃpio de Ponto Novo, é originária desses fatores. A partir da década de 50, o povoado de Ponto Novo pertencente a Saúde, então Distrito de Campo Formoso, tem sua população aumentada, através do processo migratório. Com a emancipação de Caldeirão Grande, o referido povoado torna-se distrito deste municÃpio. Neste perÃodo Ponto Novo já contava com sistema de eletrificação a motor e o abastecimento de água era feito através de animais ou mesmo por latas e potes transportados nas cabeças das pessoas. Com o aumento progressivo da população, manifesta-se o interesse dos polÃticos locais em tornar Ponto Novo um municÃpio. O povoamento da região deu-se, em especial, com a exploração do ouro na região de Jacobina, por meio das expedições. “A rigor, o povoado expandiu sua população a partir dos anos 60, atraindo fluxos migratórios face a melhor condição de suas terras no contexto micro- regional.†(PDU, 2004, p.2). E, assim, no dia 08 de janeiro de 1989, houve o plebiscito onde a população do então distrito de Ponto Novo confirmou nas urnas o desejo de ter a Independência PolÃtica. O processo de 80 emancipação foi encaminhado à Assembléia Legislativa do Estado e através da Lei Estadual nº 4837/89, de 24 de fevereiro de 1989, publicada no Diário Oficial de 25 de fevereiro de 1989, criou-se o municÃpio de Ponto Novo. Com a criação do novo municÃpio, foi incorporado ao mesmo o distrito de Barracas e o povoado de Limeira. E a nova municipalidade teve sua primeira eleição em 03 de outubro de 1989, elegendo seu primeiro prefeito, o senhor Nelson Maia. 4.1.2 CaracterÃsticas Do ponto de vista da dinâmica natural existe predominância dos processos que caracterizam o semiárido, com chuvas irregulares e ciclos de estiagem que contribuem na formação dos solos e no predomÃnio da vegetação de Caatinga. O relevo é formado por tabuleiros interioranos e pela Serra de Jacobina. Há ocorrência da presença de calcário. Depósitos eluvionares e coluvionares, gnaisses charnockiticos, granito- gnaisses e rochas básicas ultrabásicas, compõe a sua geologia. Pesquisas recentes denotam a grande presença de nÃquel, mais especificamente na região de Várzea do Poço e Morrinhos. O solo, no geral, tem aptidão regular para lavouras e pastagens plantadas. A vegetação é pouco diversificada e rasteira, predominando a caatinga, floresta estacional e floresta estacional semi-decidual. Não é rico em matas, mas encontram-se algumas plantas medicinais como – já agora um tanto raras: pau-de-rato, angico, erva cidreira, umburana de cheiro e capim santo. Sobressaem-se ainda que em pequena escala, várias espécies de cactus (mandacaru, palma e palmatória), o caruá, ariri e ouricuri. O clima de Ponto Novo é do tipo seco sub-úmido e semiárido com uma temperatura média anual de 23,9°C (Máxima de 29,3° e MÃnima de 20°C). O perÃodo de chuvas é de Dezembro a fevereiro ou março, com uma pluviosidade anual media de 685mm, sendo que por estar encravado na região do semiárido tem um alto risco de seca. O potencial agroclimático de Ponto Novo tem aptidão regular agrÃcola voltada para o plantio das seguintes culturas: feijão, milho, mandioca, mamona e pastagens plantadas. Produz ainda grande quantidade de ouricuri – nativo na região – e nos meses de dezembro a fevereiro muito umbu também é produzido. Atualmente essa produção se diversificou através da fruticultura irrigada, destacando-se pela produção de grande quantidade de banana, côco, manga, abacaxi, 81 goiaba, melancia e maracujina. O municÃpio produz ainda acerola, tomate, coentro, alface e outras hortaliças. A economia do MunicÃpio baseia-se na agricultura, que representa 70%, a pecuária responde por 25% e o comércio contribui com apenas 5%. Do percentual da pecuária, uma pequena parcela é representada pela produção de gado leiteiro e de corte, além da criação de caprinos e ovinos. O fruto e a força do trabalho são mostrados na grandiosa feira livre onde se comercializa inúmeros produtos, tais como: carnes, verduras, frutos tropicais da região, roupas e calçados. Aliás, em decorrência do dia da sua realização – domingo – para ela acorrem diversos vendedores ambulantes dos mais diferentes municÃpios da região, destacando-se pela diversidade de produtos. A hidrografia do municÃpio é formada pela bacia Hidrográfica do Itapicuru, cujo principal rio – o rio Itapicuru-Açu – além de separar o municÃpio dos municÃpios de Filadélfia e Pindobaçu, abriga uma grande Barragem: a Barragem de Ponto Novo. O rio Itapicuru-mirim serve de ponto limÃtrofe na extremidade sul, na dita “passagem do Umbuzeiroâ€. Dentro do municÃpio existem dois grandes riachos: riacho do Zinho e o riacho Grande. Neste foi feito uma barragem quando da construção da rodovia BR 407 – o Açude dos 47 – que armazena grande volume de água por ocasião das chuvas de verão, servindo para matar a sede de milhares de animais domésticos e silvestres, além de ser um reservatório para os habitantes da circunvizinhança. ConstruÃda a 6 Km da sede do municÃpio sobre o leito do rio Itapicurú-Açú, a Barragem de Ponto Novo serve para controlar e manter o nÃvel do curso do rio e, armazenar um volume de milhões de metros cúbicos de água. Devido ao fato de Ponto Novo ser um municÃpio com predominância rural e que ainda sofre com as adversidades climáticas, de acordo com o Plano Diretor do MunicÃpio (Op. Cit., p. 14), a barragem e a irrigação “representavam, por sua vez, a única possibilidade de viabilizar o desenvolvimento agrÃcola local e regionalâ€. O quadro a seguir sintetiza as caracterÃsticas fundamentais do municÃpio. 82 Quadro 08: CaracterÃsticas Fundamentais. MunicÃpio de Ponto Novo. Bahia. Brasil. 2007 Informações Gerais Ãrea (Km²) População Total Densidade Demográfica Distância da sede em relação a Salvador Latitude Sul Longitude de Oeste 465,21 17.199 36,96 Hab/km2 332 km 10°51‟ 40°03‟ CaracterÃsticas climáticas Clima Pluviosidade Média Anual PerÃodo chuvoso: Temperatura média anual Amplitude térmica Risco de seca Seco a subúmido e semiárido 685 mm Dezembro a fevereiro 23,9° Temperatura máxima: 29,3° Temperatura mÃnima: 20.0° Alto Outros aspectos naturais relevantes Altitude Bacia Hidrográfica Tipos de solos Vegetação Ocorrências Minerais Geologia 400 m Itapicuru Latossolo Vermelho- Amarelo distrófico, Planossolos Solódicos, Podzólico Vermelho Contato caatinga- Floresta Estacional Decidual e Floresta Estacional Decidual Calcário Granito- gnaisses charnockiticos, rochas básicas- ultrabásicas. Fonte: Silva (Op. Cit., p. 206). 4.2 CARACTERIZAÇÃO DO PROJETO DE IRRIGAÇÃO DE PONTO NOVO 3 O Governo da Bahia, através da Secretaria da Agricultura, Irrigação e Reforma Agrária (SEAGRI) e da Secretaria do Meio Ambiente e Recursos HÃdricos (SEMARH), com apoio do Banco Mundial criou o Projeto de Irrigação de Ponto Novo para desenvolver o potencial 3 Dados extraÃdos da SEAGRI em http://www.seagri.ba.gov.br/programa_pontonovo.asp 83 produtivo do semiárido baiano. “Ponto Novo era uma das cidades mais pobres da Bahia. Com grandes estiagens, as perspectivas de produção de alimentos para subsistência já eram difÃceis e a produção para o mercado era quase inimaginável.†(SEAGRI). 4.2.1 Objetivos Desenvolver o potencial produtivo do semiárido baiano, com o aproveitamento da barragem de Ponto Novo como fonte hÃdrica de suprimento, era, portanto, o propósito fundamental do Projeto, comprometido, pois, com a promoção da integração entre os pequenos e médios produtores, aumento dos ganhos com a implantação de uma economia de escala e verticalização da produção com a constituição de associações e empresas responsáveis pela comercialização de insumos, beneficiamento agrÃcola, industrialização e venda da produção. De acordo com a SEAGRI, no inÃcio do Projeto a barragem tinha os seguintes usos previstos: a) abastecimento humano, para uma melhor condição de vida e redução na incidência de doenças de transmissão via aquática; b) abastecimento animal (aumentando a renda da população); c) irrigação, aumentando a renda das atividades econômicas da região, e d) piscicultura. 4.2.2 Investimento Para a implementação do Projeto foi estimado um investimento total da ordem de R$ 75,3 milhões, sendo R$ 35,6 milhões na implantação da barragem e R$ 39,7 milhões nas obras de irrigação e linha de transmissão. 4.1.2.1 Dados gerais do Projeto ï‚· Localização: Entre Salvador e Juazeiro, à s margens da BR-407. ï‚· Fonte hÃdrica: Barragem de Ponto Novo com capacidade de acumulação de 40 milhões de metros cúbicos de água. ï‚· Ãrea Total: 3.443,36 ha 2.536,57 hectares irrigáveis, sendo: 84 46 lotes (área média de 5 ha) para pequenos produtores; 62 lotes (área média de 30 ha) para médios produtores; 110 ha para produção de feno de alta qualidade (Pulmão Verde); 751,85 ha de Ãreas de Reserva. ï‚· Principais explorações: Fruticultura e Horticultura. ï‚· Produção: 60 mil toneladas/ano. ï‚· Valor da produção: R$ 30 milhões/ano. ï‚· Empregos diretos: 2.600. ï‚· Empregos indiretos: 3.900. 4.2.3 Componente Estrutural Quadro 09: PGRH – Componente Estrutural Subcomponente Plano de Ação Atividades A.1 – Sistema de Ponto Novo A.1.a – Barragem Barragem em Concreto Compactado a Rolo – CCR com 25,5 m de altura, inundando 1.400 ha e regularizando 4.703 I/s (90% de garantia). A.1.b – Plano de Reassentamento Implantação de infraestrutura para 83 reassentados. A.1.c – Recuperação de Vegetação Ciliar Implantação e recuperação de 500 ha de vegetação ciliar. A.1.d – Sistema de Irrigação Sistema de Irrigação de Ponto Novo com 2.750 ha, sendo 600 ha para pequenos Produtores e 1.150 ha empresariais. A.1.e – Eletrificação do Sistema de Irrigação Eletrificação com 55 Km de rede instalada e disponibilização de uma linha de transmissão de 69 Kv A.1.f – Sistema de Abastecimento de Ãgua Sistema de Abastecimentos Associados, atendendo aos MunicÃpios de Ponto Novo, Filadélfia, Caldeirão Grande e 19 localidades Fonte: Adaptado de SRH/INGà (2008) 4.2.4 Principais obras ï‚· Estações de Bombeamento Eb1 – 6 Moto-Bombas de 400 cv Eb2 – Moto-Bombas de 150 cv 85 ï‚· Canais de Gravidade Comprimento Total 18.976 m ï‚· Adutora de Recalque AR-1 (2) Tubulações Ferro Fundido DN 1.000 mm – 1.346 m AR-2 (2) Tubulações Ferro Fundido DN 700 mm – 970 m ï‚· Chaminé de EquilÃbrio AR-01 (1) 28,50 m/h x O 3,60 m AR-02 (1) 17,12/h x o 3,98 m ï‚· Estação de Pressurização (2) 3 bombas DD 75 kv ï‚· Sistema de Eletrificação Alta tensão 13,8 kv – 34 km Subestação (potência instalada de 7,975 MVA) ï‚· Sistema Viário Caminho de serviços – 45 km 4.2.5 Coordenação do Projeto Superintendência de Irrigação (SIR) 4.2.6 Gestão do Projeto Distrito de Irrigação de Ponto Novo. O Distrito de Irrigação de Ponto Novo, entidade que congrega usuários de água na área de abrangência do Projeto de Irrigação de Ponto Novo, é uma Associação Civil, de direito 86 privado, sem fins lucrativos, com personalidade jurÃdica, patrimônio e administração próprios, constituÃda com prazo de duração indeterminado, com sede no MunicÃpio de Ponto Novo, que tem como objetivos 4 : I. Administrar, operar e manter, conforme delegação de competência que lhe for conferida, as obras de infraestrutura de uso comum do PROJETO, bem como os prédios de uso da administração e de apoio à s atividades do DISTRITO; II. Definir os critérios, a forma, o volume e os horários de distribuição da água entre os irrigantes, observando os planos de cultivo e de irrigação previamente aprovados; III. Estimular e apoiar o associativismo, incentivando a criação de entidades, cooperativas ou representativas, que congreguem os irrigantes instalados nas glebas do DISTRITO; IV. Preservar a função social, a racionalidade econômica e a utilidade pública do uso da água e dos solos irrigáveis; V. Orientar os Associados no que se refere à exploração agropecuária, com vistas a compatibilizá-la ao uso comum da água. 4.2.7 Etapas do Projeto I. O projeto de reassentamento da 1ª. etapa fase 1 Esta etapa inclui o reassentamento dos pequenos proprietários que possuÃam terras na área que foi alagada pela represa. Iniciou-se em 2000, com as primeiras realocações e já foi concluÃda. De acordo com Silva (Op. Cit.) os agricultores de sequeiro ou agricultores que irrigavam apenas quando o rio estava com a vazão adequada foram realocados de forma que tiveram que aprender a lidar com a mudança significativa na forma como trabalhavam com a terra. A primeira etapa, iniciada em 2000, com apenas 435 ha em atividade, divididos em 87 (oitenta e sete) lotes de cinco hectares cada, atendeu os agricultores procedentes da área de inundação da barragem, enquanto que um lote de 110ha foi reservado para a produção de forrageira/feno, correspondente ao chamado “Pulmão Verde†do Programa Cabra Forte. (SEI, 2006, p. 42). 4 Dados extraÃdos do Estatuto Social do Distrito de Irrigação de Ponto Novo, de 01 de Junho de 2000 87 Nesta etapa foram assentadas 83 famÃlias com cada lote tendo 5 ha. Cada lote foi entregue aos assentados com os seguintes incentivos: a) sistema de irrigação 3 micro e 2 tradicional; b) insumo para plantio em 2 ha; c) ajuda de custo; d) Cesta básica mensal de R$ 200,00; e) Fornecimento de água com isenção de taxa no primeiro ano, no segundo ano o assentado arcava com 40% do consumo, no terceiro ano com 60% e a partir do quarto ano passava a pagar integralmente; f) água tratada para consumo humano. II. O projeto de reassentamento da 1ª. etapa fase 2 Nesta etapa foram assentadas 54 famÃlias com cada lote tendo 5 ha. Cada lote deveria receber os mesmos benefÃcios ofertados na fase 1. No entanto, houve atrasos no repasse dos benefÃcios, e os insumos também não foram fornecidos na mesma quantidade, devido ao aumento no preço dos fertilizantes. Houve um atraso de dois anos na implantação da 2ª. Etapa do sistema de irrigação, que se deu em especial pela influência da transição do governo do PFL para o governo do PT a partir de janeiro de 2007. III. O projeto de implantação de lotes empresariais 2ª. etapa A 2ª. etapa do projeto diz respeito a implantação de lote empresariais a partir de um processo de concessão de direito real de uso para fins agrÃcolas e agropecuários através de uma licitação na modalidade de concorrência pública. De acordo com o levantamento feito por Silva (Op. Cit.), as condições de participação foram as apresentadas abaixo, não existindo nenhum critério que garantisse experiência ou tradição com a agricultura irrigada: 1. Para pessoas fÃsicas: ï‚· Cédula de identidade; ï‚· Cadastro de Pessoa FÃsica; ï‚· Regularidade com as fazendas federal, estadual e municipal; ï‚· Declaração de visita; 88 ï‚· Certidão negativa de execuções patrimoniais. 2. Para pessoas jurÃdicas: ï‚· Registro na junta comercial; ï‚· Atos constitutivos – contrato e alteração social; ï‚· CNPJ; ï‚· Inscrição estadual e municipal; ï‚· Regularidade com o FGTS e INSS; ï‚· Declaração de visita; ï‚· Regularidade com as fazendas federal, estadual e municipal; ï‚· Balanço patrimonial e demonstrações contábeis; ï‚· Certidão negativa de falência ou concordata. Neste capÃtulo buscou-se caracterizar o municÃpio de Ponto Novo e o Projeto de Irrigação investigado. Esse percurso visou familiarizar o leitor com o ambiente e contexto da pesquisa que embasam esta dissertação. Superada esta fase de caracterização, parte-se para a descrição e a análise dos dados qualitativos, para responder a questão norteadora da pesquisa, o que significará a culminância do processo investigativo. 89 5. ANÃLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Este capÃtulo visa apresentar os resultados da pesquisa. Tais resultados referem-se a uma análise da implementação do Projeto de Irrigação do MunicÃpio de Ponto Novo-BA, com foco na avaliação da eficácia com base na percepção do atores envolvidos em seu processo de implementação, baseado na questão norteadora da pesquisa. Na seção que segue serão descritos e analisados os dados qualitativos referentes à polÃtica pública investigada conforme categorias e subcategorias de análise descritas no capÃtulo (metodológico). 5.1 AVALIAÇÃO DA EFICÃCIA DA POLÃTICA: CATEGORIAS E SUBCATEGORIAS ANALISADAS Para a aplicação do método de análise de conteúdo, foram desenhadas, a partir do modelo apresentado por Laville & Dione (1999) e da sistematização de variáveis propostas por Farah (1997; 2002); Spink e Farah (1999) 03 (três) categorias analÃticas: a) Engenharia Institucional e traços que constituem a polÃtica; b) Atuação dos atores envolvidos; e c) Condições institucionais e sociais dos resultados. Para cada uma dessas categorias de análise foram definidas subcategorias capazes de agrupar conteúdos por afinidade de sentido, viabilizando, então, a análise dos textos gerados a partir dos relatos dos entrevistados, dos Relatórios Sociais, das Atas de Reuniões analisados e dos trabalhos de Souza (2010) e Silva (2008). 5.1.1 Categoria 1: Engenharia Institucional e traços que constituem a polÃtica Nesta categoria analÃtica foram aglutinadas as frases modais que indicam se o programa está sendo implementado de acordo com os seus objetivos e a partir do exame da engenharia institucional e dos traços constitutivos do projeto. Assim, a análise desta categoria permitiu o exame da processualidade concreta e da adequação e coerência dos meios e instrumentos utilizados na implementação da polÃtica. As frases modais identificadas foram agregadas nas seguintes subcategorias, o que viabilizou a análise da categoria em questão. 90 5.1.1.1 Subcategoria 1.1 – Clareza dos objetivos, metas e direção da polÃtica O Projeto de Irrigação de Ponto Novo foi delineado no Plano Diretor de Recursos HÃdricos da Bacia do Itapicuru e propôs suas ações inicialmente assim subdivididas, conforme dados extraÃdos de Silva (Op. Cit.) e de Souza (Op. Cit.): a) Ações de desenvolvimento ï‚· Implantação de novos barramentos (Recursos hÃdricos superficiais); ï‚· Aproveitamento de barramentos existentes (Recursos hÃdricos superficiais); ï‚· Exploração de águas subterrâneas; ï‚· Desenvolvimento hidro agrÃcola. b) Ações setoriais de irrigação – Fornecer à sociedade civil e à s entidades governamentais as indicações necessárias ao desenvolvimento ordenado e racional da irrigação da bacia de forma sustentada e compatÃvel com as disponibilidades e caracterÃsticas dos solos e dos recursos hÃdricos; c) Ações setoriais de saneamento; d) Ações setoriais de preservação ambiental; e) Ações setoriais de apoio e implementação; f) Controle de doenças de via de veiculação hÃdrica; g) Abastecimento de água para consumo humano atingindo 80% da população de toda bacia. 5.1.1.2 Subcategoria 1.2 – Recursos necessários considerados no momento da formulação/implementação da polÃtica Nesta subcategoria são descritas e analisadas as frases modais identificadas nos textos oriundos das entrevistas realizadas e dos trabalhos de Souza (Ibidem) e Silva (Ibidem) considerando os recursos necessários no momento da formulação/implementação da polÃtica. Neste caso, além do investimento inicial empregado no projeto, considerou-se todos os recursos que foram disponibilizados ao público-alvo para que a polÃtica cumprisse os seus objetivos. O projeto resultou num investimento total de R$ 75,3 milhões, sendo R$ 35,6 milhões na implantação da barragem e R$ 39,7 milhões nas obras de irrigação e linha de transmissão. 91 No que diz respeito aos recursos que foram viabilizados pelo Estado para o público-alvo da 1ª. e 2ª. etapas do projeto, os depoimentos abaixo auxiliaram na sua identificação e compreensão. Foi observado nas entrevistas, conforme frases modais abaixo, que quem participou da 1ª. Etapa do projeto foi contemplado com uma casa e diversos benefÃcios, como cesta básica, insumos para plantio, ajuda de custo, fornecimento de água etc, quando não optou pela indenização em espécie, conforme destacado pelo entrevistado 1: O governo do estado deu lotes para 146 agricultores familiares, 5 hectares para cada famÃlia já com equipamentos de irrigação, e uma casa com água e energia. (ENTREVISTADO 1) No entanto, verifica-se que a ação do Estado ocorreu sem consulta prévia aos proprietários interessados. Ou seja, o processo de realocação acabou se dando de forma forçada pois não existia uma terceira opção: ou agricultor aceitava a realocação ou recebia a indenização, conforme se confirma nos seguintes depoimentos registrados no trabalho de Silva (Ibidem, p. 312) e nas entrevistas realizadas: Assim, a base de seis meses da represa construÃda chegou aqui um rapaz num carro mais a Luciana (refere-se a uma antiga funcionária da Prefeitura Municipal), perguntou se eu queria a terra ou o dinheiro, eu disse que queria a terra. E disseram: só que vai ser um lote, com uma casa, com água, que você vai poder plantar tudo dentro, então eu disse que não importava não, que eu queria era a terra mesmo. Daà pra cá mediram aà nós ficamos uns dois anos esperando. Mas ninguém nem sabia que ia acontecer isso, quando nós sabemos já foi assim, já tinha medido, a medição já passava, um dia eu vim na roça, chegando vejo aquela medição dentro, aà eu disse: será que já apareceu outro dono e eu não tô sabendo? Não pediram autorização a ninguém pra medir, quando nós sabemos já estava medindo (Proprietária reassentada na 1ª. etapa – fase 2). A gente participou ali aonde seria uma 3ª etapa do projeto, a gente participou de uma luta de resistência de não querer as indenizações para a implantação de uma 3ª.etapa do projeto, por que muita gente sentiu que diversas pessoas que foram indenizadas na 1ª. e na 2ª. etapa tiveram problemas de subsistência até, porque não tavam preparados para essa mudança repentina de atividade, de local, porque essas indenizações elas causam esses impactos sociais e isso o pessoal da 3ª. etapa, já observando esse impacto não aceitou, por uma questão cultural, problema de famÃlia, de situação geográfica, problema de atividade econômica. Você diz: não, rapaz, vai ser bom você ter uma indenização porque você vai receber 10.000 reais; 10.000 reais para quem nunca teve 1.000 reais no bolso soa como um volume de recurso muito grande. Só que ele não consegue perceber que aquilo vai dar para comprar muito pouca coisa e não vai dar uma sustentação, então ele vem compra uma casa de 9.000 e fica com 1.000 que vai dar pra ele sobreviver dois, três meses só. Então esses impactos sociais houveram aqui, e por isso a gente mesmo tendo conhecimento que iam ocorrer esses impactos, a gente que tinha consciência disso não tinha como ser ouvido aqui porque a 92 expectativa na época era extremamente positiva (Representante da Associação Comercial do MunicÃpio de Ponto Novo e membro da COMUA). Muita gente ficou seduzida em vender, como que a proposta era feita individualmente, esse pessoal que foi seduzido pelo vender, eles tão se dando conta do problema hoje, então conflito não chegou a ser uma coisa maior porque as pessoas não se deram conta de como seria depois. Se você vai aà no campo e oferece numa propriedade 20 ou 15 mil, numa seca dessa, as pessoas não vão pensar duas vezes. Então isso contribuiu bastante. Outro fator que contribuiu também foi que essas pessoas, 83 famÃlias foram colocadas num projeto de reforma agrária. Mas o problema de lá está acontecendo hoje, violência no municÃpio, o grande número de periferia de Ponto Novo, principalmente Nova Esperança, Pedreira, aonde houve um acúmulo de pessoas que venderam a propriedade lá e vieram para a cidade e compraram uma casinha e depois.... Então hoje que começam a aparecer as conseqüências, pela sedução do momento, pela campanha feita pelo poder público, ainda hoje você entra na cidade e está lá estampado a barragem como sendo algo... (Representante da Igreja Católica no MunicÃpio de Ponto Novo) (SILVA, 2008, p. 326-327). O objetivo do projeto inicial era atender a uma comunidade que morava na região da barragem, e que foi afetada devido a sua construção; e o pessoal que morava no entorno do local que foi incluÃdo no projeto. Então, para esse pessoal, o Banco Mundial colocou como exigência que eles tivessem uma qualidade de vida igual ou superior ao que viviam anteriormente, e o Estado teve uma preocupação muito grande na indenização em espécie, que era uma indenização que poderia dar a essa pessoa quantia que não esperava e que não estava preparada para aproveitar este recurso.†(ENTREVISTADO 2) De acordo com as percepções destacadas acima, pode-se concluir que o processo de indenização pode ser considerado brutal, uma vez que retirava de pessoas pobres o único meio de subsistência que era a terra. Conforme observado nos depoimentos a indenização em espécie não garantiu a qualidade de vida exigida pelo Banco Mundial, ao contrário, trouxe prejuÃzos para muitas famÃlias que perderam tudo ao não saber administrar o recurso recebido. Assim, um problema de ordem social foi criado com a geração dos excluÃdos, antigos proprietários de terras que receberam apenas as indenizações, conforme ressalta o entrevistado 2: E daà surgiu esta idéia do Estado que era a possibilidade de indenizar com dinheiro para aqueles que não quisessem de forma nenhuma a indenização com uma propriedade, e esta indenização com a propriedade, seria um lote na área irrigada ou na área de sequeira, como eles trabalhavam com a agricultura de sequeira, ou um outro local, que não fosse o local afetado pela barragem. (ENTREVISTADO 2) Para aqueles que não optaram pela indenização em espécie e receberam um lote com a infraestrutura para irrigação, uma casa e diversos outros benefÃcios, como cesta básica, insumos para plantio, ajuda de custo, fornecimento de água etc. Ainda nestes casos, observa- 93 se sérios prejuÃzos para os agricultores, pois revelam não saber administrar bem os recursos e não receberam qualquer preparação para assumir esse novo papel, conforme ressalta, ainda, o entrevistado 2: Além do lote, no inÃcio, como a comunidade não tinha recursos para tocar uma atividade desta, uma atividade onerosa, atividades que inicialmente dependem de muitos recursos, e aà o governo do Estado entregou uma propriedade com o sistema de irrigação. Foram implantadas algumas culturas como o caso da manga, coco, que era uma das principais culturas no inÃcio do projeto, e a banana que leva em torno de um ano para começar a dar retorno. E neste perÃodo existia uma grande preocupação de como este pessoal iria sobreviver durante este perÃodo. Então inicialmente foi colocado o sistema de irrigação convencional, que é aquele sistema que molha toda a área. (ENTREVISTADO 2) Além disso, o governo do Estado na ocasião forneceu cestas básicas, ajuda de custo para que a pessoa pudesse contratar mão de obra, quando ele não tivesse condição de atender a demanda, e água no primeiro ano ela foi totalmente isenta de custo para o agricultor. Ela foi subsidiada por três anos. No primeiro ano, totalmente isenta. No segundo ano, o agricultor pagaria 40% do consumo, e no terceiro ano ele pagaria 60%, e depois que viria a cobrança integral de água. (ENTREVISTADO 2) O estudo de Silva (Ibidem, p. 248) ratifica essa percepção ao destacar que: Essa ação também foi seletiva e diferenciada: com os pequenos produtores a ação do governo do estado foi centrada na idéia de indenizar todos os que quisessem e de assistir apenas aqueles que optassem pela relocação. Já com relação aos grandes empreendimentos a opção foi por concessão de uso da terra por um perÃodo de 25 anos, renovável por igual perÃodo. Quanto a estes benefÃcios dispensados em forma de recursos, percebeu-se que a comunidade ficava na expectativa que o Estado subsidiasse a manutenção dos seus lotes, e, além disso, a população produzia, mas não reservava parte dos recursos provindos da atividade para o reinvestimento no lote, o que ocasionava certa dependência do assistencialismo do Estado. Tais conclusões revelam, portanto, as dificuldades do governo encontrar as chamadas “portas de saÃda†para polÃticas focalizadas (assistencialistas). Vale destacar, também, que muitos dos assentados preferiram vender seus lotes e gastaram o dinheiro de forma indiscriminada com bebidas, carros e outros bens. Assim, muitos não tiveram nenhum retorno financeiro e voltaram à situação de miséria, revelando, pois, que a situação econômica é dinâmica e complexa, o que impede uma categorização definitiva do tipo: “vamos acabar com a pobreza ou com a miséria em X anosâ€. Ressalte-se, ainda, que os lotes foram vendidos para pessoas interessadas em investir, mas, sobretudo, foram 94 transferidos para veranistas, o que acabou gerando um desvio dos objetivos do projeto, conforme menciona o entrevistado 6: Muitos dos assentados da primeira etapa preferiram vender seus lotes e gastaram todo dinheiro com bebidas alcóolicas, carros e bens que não trouxeram nenhum retorno. Muitos desses lotes foram comprados por pessoas que queriam investir na região, mas também por veranistas. Cada lote vali pelo menos R$ 50.000,00 . Os que ficaram, na sua maioria, teve resultado, comprou moto, caminhão. (ENTREVISTADO 6) Na análise dos dados foi também apontado ausência de recursos financeiros e tecnologia, conforme depoimento do lÃder dos assentados. Neste caso, houve ainda destaque para o fato de que o projeto beneficia mais os empresários que os assentados, que se queixam da ausência de recursos financeiros para manter o sistema de irrigação que exige um investimento muito alto. Observam-se nestes relatos as consequências do assistencialismo no projeto conforme já citado pelo entrevistado 6: Outro problema que a gente percebe é que faltam recursos e tecnologia. Além disso, nós pequenos agricultores temos mais dificuldades. O projeto beneficia mais os empresários que os assentados. A gente não tem condições de manter o sistema de irrigação. É muito alto o custo. A gente não tem condições de manter. (ENTREVISTADO 6) O projeto está dividido em dois segmentos: o segmento do agricultor familiar e o segmento empresarial. Então, existe grande, médio e pequeno produtor. O segmento empresarial foi licitado em 2004. (ENTREVISTADO 2) Para a 2ª. etapa do projeto foi concedido direito real de uso dos lotes para fins agrÃcolas e agropecuários, através de uma licitação na modalidade de concorrência pública. Para participar da licitação, pessoa fÃsica ou jurÃdica, deveriam apenas apresentar documentos e certidões negativas de débito com os principais órgãos públicos estaduais e federais, desconsiderando, pois, quaisquer critérios que garantisse experiência com a agricultura irrigada. Neste aspecto vale destacar que faltou fiscalização apropriada do Estado no processo de licitação dos lotes empresariais. Houve um processo de especulação durante a licitação e muitos dos que compraram lotes, não implantaram projetos e, de posse da terra, procuraram vendê-la a um preço maior, reforçando nesse sentido, a tradicional atividade especulativa que fundamenta o sistema econômico capitalista. 95 Conforme observa Silva (Ibidem), acredita-se que, apesar de ter sido solicitado um projeto de aproveitamento, com o cronograma fÃsico-financeiro, este instrumento não garantia que os lotes fossem efetivamente utilizados. Os lotes eram arrendados sem uma preocupação direta com o seu uso e como afirma o autor, “isto é tÃpico de polÃticas neoliberais que supervalorizam a iniciativa privada e defendem que cabe ao Estado tão somente disponibilizar as condições para a ação dessa iniciativa.†(Op. Cit., p. 277). Vale observar ainda que de acordo com os objetivos iniciais do projeto, 63 lotes empresariais deveriam ser disponibilizados nesta etapa. Com isto, esperava-se que várias empresas iniciassem suas atividades em Ponto Novo, o que contradiz a ação do Estado que previa fomentar a ação de várias empresas. Ao contrário dessa expectativa, apenas dois grupos de empresários acabaram adquirindo boa parte dos lotes, conforme se observa no levantamento feito por Silva (Ibidem, p. 278) e em avaliação in loco: Levantamentos realizados em 2007 verificaram que, de fato, os lotes empresariais estão funcionando da seguinte forma: ï‚· empresa AGRIVALE – controle de 1.100 hectares de terras dos 1.960 que entraram na licitação, correspondendo a 56,12% das terras dos lotes empresariais; ï‚· empresa SÃtio Barreiras – controle de 300 hectares, correspondendo a 15,3% das terras licitadas; ï‚· lotes individuais – apenas 3 com projetos em andamento; ï‚· um lote destinado a uma cooperativa que atuou no contexto do Programa Cabra Forte; ï‚· um lote sem licitar que ficou como área de reserva. A empresa AGRIVALE, atuante em Petrolina, instalou-se em Ponto Novo no ano de 2006, com o objetivo de plantar frutas para o mercado externo, em especial o europeu. Já a empresa SÃtio Barreiras se instalou em Ponto Novo em 2007, com matriz no Ceará, e distribui frutas para Salvador, Recife e Feira de Santana. A empresa veio por que existia o projeto de irrigação, da estrutura, da disponibilidade de área, de água e a própria caracterÃstica da região. (...) a empresa já existia, veio do Sul do Ceará. Já tÃnhamos esta mesma atividade e viemos pra cá como uma expansão. (ENTREVISTADO 5) Qual o grande atrativo pra vir uma empresa de fora para o projeto? É a questão da disponibilidade de áreas e a questão da infraestrutura hÃdrica, estradas, a questão de documentos, de licenças, licenças de uso de água, de desmatamento,... Facilidades que você encontra quando está dentro de um projeto público. (ENTREVISTADO 5) Conforme prevê o estatuto, estes arrendatários tornaram-se integrantes do conselho e do Distrito, mediante celebração de contrato. E neste caso vale lembrar que é o Distrito que se 96 encarrega da operação e manutenção da infraestrutura do projeto que é de uso comum, além da distribuição de água e das cobranças de tarifas, entendendo, desta forma, que coube à iniciativa privada, em detrimento dos pequenos agricultores, a definição do uso de tecnologia e dos processos gerenciais a serem adotados. Enquanto recursos, o Estado garantiu, nestes casos, água e terra. 5.1.1.3 Subcategoria 1.3 – Cumprimento dos objetivos, metas e prazos No que diz respeito ao cumprimento dos objetivos, levando em consideração a realização das ações previstas que foram citadas na seção 5.2.1.1, as frases modais que seguem atestam que a barragem foi construÃda e que houve de fato investimento na irrigação, cumprindo neste caso, os objetivos inerentes à infraestrutura do projeto, aproveitamento da barragem, exploração de água e ações setoriais de irrigação. Quanto ao desenvolvimento hidro agrÃcola não se pode observar o mesmo, conforme também se segue. Art 2º: O Projeto de Irrigação de Ponto Novo, doravante denominando apenas PROJETO, foi implantado de acordo com o disposto na Lei nº 6.662, de 25/05/79, no Decreto nº 89.496, de 29/03/84, e legislação complementar, e destina-se à irrigação de terras em perÃmetro de, aproximadamente, 2.745 ha, localizadas no MunicÃpio de Ponto Novo, no Estado da Bahia.†(ESTATUTO SOCIAL DO DISTRITO DE IRRIGAÇÃO DE PONTO NOVO) O Projeto foi encerrado apenas na parte da infraestrutura, com implantação em 2004. Um investimento de 60 milhões. No entanto, por problema ambiental não conseguimos concluir o projeto quanto a sua principal meta, desenvolver as culturas. (ENTREVISTADO 1) Enfim, o projeto tinha como objetivo principal desenvolver o potencial produtivo do semiárido baiano, com o aproveitamento da barragem de Ponto Novo como fonte hÃdrica de suprimento, com a integração entre os pequenos e médios produtores. (ENTREVISTADO 1) Quanto à questão de saneamento, em levantamento feito no trabalho de Souza (Op. Cit.) apenas duas ruas foram saneadas, uma das demandas reivindicadas pela população local. Silva (Op. Cit.) corrobora com esta informação ao apontar que a sede do municÃpio cresceu de forma desordenada o que resultou na total falta de infraestrutura com rede de coleta de esgoto regular e pavimentação. Com a construção da barragem o abastecimento de água melhorou, mas registrou-se que a barragem está diminuindo em profundidade e com a falta de chuva o abastecimento de água nas casas, bem como das áreas de irrigação, tem ficado comprometido. 97 A barragem melhorou muito nossa condição quanto ao abastecimento de água. Antes a gente tinha que comprar água para beber e usar água do poço, mas como disse, com a falta de chuva, já se sente a falta de água para o consumo e para a irrigação. (ENTREVISTADO 6) No que diz respeito à piscicultura, o projeto também não foi exitoso, pois o trabalho que se iniciou com esse objetivo não foi continuado. Conforme relato, os principais motivos para o insucesso desta iniciativa devem-se aos frequentes desvios dos pescados, falta de articulação entre os membros da comunidade, ausência de liderança para a atividade e o consequente abandono das instalações e equipamentos, conforme destaca o depoimento abaixo: A piscicultura foi um desastre. As instalações foram abandonadas, houve muito desvio dos pescados, as pessoas não colaboravam e faltava uma liderança. (ENTREVISTADO 6) Quanto à s ações voltadas ao plano ambiental, muitos problemas foram apontados e aparecem em destaque na seção 4. 2.3.2 deste trabalho, o que compromete a eficácia do projeto. No que tange as ações setoriais de implementação e apoio, algumas facilidades e outras fragilidades foram identificadas, conforme se discute na próxima sessão. Já no que diz respeito à saúde, de acordo com o trabalho de Souza (Op. Cit.) houve um declÃnio de colocação de 318ª para 344ª no perÃodo analisado pela autora que compreende o perÃodo de 1999 a 2009. Segundo a análise acerca do IDS da região correspondente ao ano de 2009, a saúde ainda é muito frágil e carece de maior atenção do setor público. No tocante à mão-de-obra ocupada, Silva (Op. Cit.) observou que em 2005 a população economicamente ativa era de apenas 416 trabalhadores com registro em carteira de trabalho. Desses, apenas 2% estavam ocupados na indústria, 8% no comércio e os outros 90% na prestação de serviços. Destaque-se, neste sentido, que na agricultura não foram registrados empregos. Ainda, em 2003, 2004 e 2005 as ocupações que mais admitiram foram serventes de obras, pedreiros e carpinteiros, com exceção para técnicos agrÃcolas em 2004, pois não apareceram admissões na área agrÃcola. Quanto ao cumprimento das metas e prazos, observa-se nos depoimentos dos entrevistados que: 98 O Projeto foi encerrado apenas na parte da infraestrutura, com implantação em 2004. Um investimento de 60 milhões. No entanto, por problema ambiental não conseguimos concluir o projeto quanto a sua principal meta, desenvolver as culturas. (ENTREVISTADO 1) O projeto foi implantado em duas etapas. Teve a primeira etapa em que o pessoal veio em 1999 para iniciar o projeto, mas a implantação das culturas só iniciou no ano de 2000. (ENTREVISTADO 2) A produção carece ainda de muitas mudanças, mas a primeira etapa está implantada. (ENTREVISTADO 2) A segunda etapa, também está implantada, apenas poucos lotes que não explorados totalmente. Não está implantado totalmente com fruticultura, pois este projeto tem foco na fruticultura, até por conta da estabilidade que a fruticultura proporciona. (ENTREVISTADO 2) A previsão era dentro do prazo dos três primeiros anos a implantação e conclusão do projeto, só que houve uma segunda etapa, pois existia uma necessidade imediata de realocação destas pessoas, que era o pessoal que morava no local onde foi implantado o projeto, pois não era necessidade imediata anteriormente. A necessidade imediata anteriormente era onde a barragem iria inundar. Essa etapa levou mais tempo e começou no inÃcio de 2006. (ENTREVISTADO 2) mas o segmento empresarial hoje é que uma parcela ainda não está implantada, e isto se deve a alegação das pessoas que participaram da licitação e que adquiram um lote desses, é que a falta de licença da operação é que está atrapalhando a implantação, por conta da dificuldade para encontrar recursos, financiamentos. (ENTREVISTADO 2) Então, está sendo implantado lentamente, por que não tem como ser diferente. Às vezes a gente quer que o projeto seja implantado o mais rápido possÃvel, mas é um investimento que precisa ser muito bem planejado. (ENTREVISTADO 2) Eu diria que nós estamos já numa fase de conclusão. Uns ajustes são necessários, mas estamos numa fase já avançada para conclusão. (ENTREVISTADO 2) As metas previstas ainda não foram alcançadas, pois o projeto visava gerar uma determinada quantidade de empregos, e isso não foi alcançado, mas a gente tem perspectiva que isso ocorra assim que o projeto estiver instalado. (ENTREVISTADO 2) Tomando como base as frases modais acima se pode afirmar que quanto ao cumprimento dos prazos e metas o projeto se mostra ineficaz, pois não logrou êxito ainda em sua 99 implementação que se arrasta num longo processo que já perdura 14 anos, quando o previsto em sua formulação eram 3 anos para a sua conclusão. Além disso, as metas relativas à geração de emprego e renda e à implantação do segmento empresarial também não foram alcançadas até o momento. O método de análise de conteúdo aplicado aos Relatórios Sociais do Distrito e aos depoimentos verbalizados e transcritos na Ãntegra possibilitou a identificação da percepção da população local quanto ao alcance das metas e objetivos da polÃtica. Neste caso, foram considerados aspectos gerais quanto à qualidade de vida, em especial, acesso a bens e serviços. 56,25% aprovam o projeto e dizem que as expectativas foram alcançadas 18,75% avaliam negativamente o projeto 25% não deixaram clara aprovação ou reprovação do projeto (RELATORIO SOCIAL DE 2002 – AVALIAÇÃO DA 1ª. ETAPA) Além da geração de emprego direto e indireto, as metas previam melhoria na qualidade de vida que já é uma coisa visÃvel, e que foi fomentado com o projeto. (ENTREVISTADO 2) Além disso, a gente que vê que o pessoal que foi realocado teve uma mudança substancial na vida. O projeto contribuiu muito. (ENTREVISTADO 2) Observa-se no cotidiano das famÃlias reassentadas uma mudança de vida significativa no que diz respeito à condição socioeconômica e cultural. (RELATÓRIO SOCIAL DE ABRIL DE 2002) O municÃpio teve um crescimento considerável após a implantação do projeto. (ENTREVISTADO 3) Para o municÃpio os resultados foram muito bons, em especial para o desenvolvimento. (ENTREVISTADO 4) (...) houve elevação da renda, em termos social, houve melhoria na qualidade de vida da população num geral, em termos polÃtico, houve uma certa independência por parte dos agricultores... (ENTREVISTADO 3) Considero que o projeto se mantém na rota dos seus objetivos, como já falei a gente tem como alcançar seguramente estes objetivos. (ENTREVISTADO 2) Foi ainda observado nos depoimentos avanço na fruticultura na região. Este êxito é atribuÃdo, em parte, aos investimentos realizados pelo SÃtio Barreiras. 100 Ponto Novo virou centro produtivo. Vêm pessoas da Embrapa e da EBDA para estudar novas tecnologias. E hoje Ponto Novo é referência na qualidade de frutas. É referência também em cultivo de maracujá, que já é conhecido em todo lugar. (ENTREVISTADO 5) O Projeto provocou grande transformação na região. Diversos agricultores foram beneficiados. O SÃtio Barreiras investiu na cultura de banana, gerou 400 empregos diretos, com tecnologia de ponta e água tratada. (ENTREVISTADO 1) No entanto, quanto ao alcance dos objetivos, metas e prazos existe divergência de opinião, considerando os relatos acima, como pode ser observado no depoimento abaixo. Admite-se, nesta observação, um determinado exagero no marketing do projeto pelo governo e certa alienação por parte da população local neste sentido. Esclarece-se que apesar do Projeto de Irrigação de Ponto Novo ser identificado como “referência†em irrigação no Estado da Bahia, a realidade local não condiz com esta imagem, conforme destaca Silva (Op. Cit., p. 320): Quando você fala em Ponto Novo tem uma ligação imediata com o projeto de irrigação. Embora exista um determinado exagero no marketing, na venda, o governo vende o projeto de Ponto Novo como se isso fosse uma coisa de grande... e chega a vender ilusões, porque tem gente por exemplo que não tem o conhecimento técnico de tamanho, percepção de volume, e acha que o projeto de Ponto Novo... porque o governo do estado diz o seguinte: é o maior projeto de irrigação do governo do estado, mas não diz que existem projetos de irrigação do governo federal, de governos municipais, quer dizer, o projeto de irrigação aqui parece até que é o maior projeto de irrigação que existe no estado da Bahia, enquanto na realidade se você somar todos os projetos de irrigação que tem implantado, tem em torno de 300.00 hectares irrigados na Bahia. Ponto Novo não chega a 3.000 mil, quer dizer que não chega a 1% do que tem irrigado na Bahia. E se tenta vender como se isso é realmente... e tem gente que chega aqui, chega a se instalar, bota uma loja, uma casa comercial, achando que vai haver uma revolução. Eu sempre digo que as pessoas aà fora que não conhecem Ponto Novo, que não vivem em Ponto Novo, eles acham que a gente só é abrir o bolso e o dinheiro já ta caindo dentro, aà vem a pessoa coloca um hotel, daqui a pouco fecha porque não tem aquela resposta que queria, vem um outro e instala um restaurante, daqui a pouco fecha porque não teve a resposta que queria, vem um outro botou uma fábrica de bolacha e fechou... A identificação hoje de Ponto Novo no estado e até fora do estado é o projeto de irrigação e voltando um pouquinho seria a repercussão imprimida pela implantação da barragem, por que sem a barragem não teria o projeto (Representante da CDL). Além disso, de acordo com a SEPLAN (2006), o projeto geraria 2.660 empregos diretos e 3.900 empregos indiretos. Neste caso, questiona-se o motivo da evasão populacional observada nos estudos de Souza (Op. Cit.), já que o estudo apontou uma perda populacional acumulada de 13,69% entre os anos de 1999 a 2007. Neste sentido, Silva (Op. Cit.) em seu trabalho acrescenta que não houve incremento populacional significativo entre 2000 e 2006, perÃodo em que o projeto de irrigação concluÃa a 101 sua 1ª. Etapa. O autor afirma, ainda, que entre os censos de 1999 e 2000, houve uma queda significativa da população rural, que caiu de 11.629 habitantes em 1991 para 10.420 habitantes em 2000. O autor considera que esse processo foi impulsionado pela venda dos lotes por pessoas da zona rural, através do recebimento de indenizações do governo do Estado e da atração de trabalhadores para a zona urbana em busca dos empregos que foram prometidos pelo Estado quando começou a fomentar o pólo de irrigação. Na verificação in loco observou-se ainda um crescimento intenso e rápido da área urbana, porém pouco planejado e com carência de infraestrutura. Nos depoimentos e no trabalho de Silva (Ibidem) esta observação se ratifica quando são abordados alguns impactos indesejados no âmbito social, como aumento da violência, do uso de drogas, alcoolismo, entre outros, como aponta o entrevistado 2: A própria cidade teve um crescimento muito grande, um crescimento até indesejável por minha parte, por que eles caminham em direção ao projeto, esse é um problema, e onde há desenvolvimento existem problemas. Então a gente precisaria ter discutido mais isto, esta questão do crescimento da cidade, pois se percebe que não está adequado, pois a cidade está muito próxima do projeto e deveria manter uma certa distância. (ENTREVISTADO 2) Muita gente ficou seduzida em vender, como que a proposta era feita individualmente, esse pessoal que foi seduzido pelo vender, eles tão se dando conta do problema hoje, então conflito não chegou a ser uma coisa maior porque as pessoas não se deram conta de como seria depois. Se você vai aà no campo e oferece numa propriedade 20 ou 15 mil, numa seca dessa, as pessoas não vão pensar duas vezes. Então isso contribuiu bastante. Outro fator que contribuiu também foi que essas pessoas, 83 famÃlias foram colocadas num projeto de reforma agrária. Mas o problema de lá está acontecendo hoje, violência no municÃpio, o grande número de periferia de Ponto Novo, principalmente Nova Esperança, Pedreira, aonde houve um acúmulo de pessoas que venderam a propriedade lá e vieram para a cidade e comparam uma casinha e depois.... Então hoje que começam a aparecer as conseqüências, pela sedução do momento, pela campanha feita pelo poder público, ainda hoje você entra na cidade e está lá estampado a barragem como sendo algo... (Representante da Igreja Católica no MunicÃpio de Ponto Novo) (SILVA, Ibidem, p. 326-327). Diante do exposto, o que se observa, afinal, é um lento processo de implementação da polÃtica em análise e, atualmente, se confirmam sinais de resistência ao projeto, em especial no que diz respeito à ampliação da área. Neste caso, é inevitável afirmar que as promessas feitas pelo Estado em sua maioria não foram cumpridas, o que compromete o alcance da eficácia da polÃtica. 102 5.1.2 Categoria 2: Atuação dos atores envolvidos Nesta categoria as polÃticas públicas são enquadradas quanto à efetiva participação dos atores envolvidos numa polÃtica. Nesta perspectiva, admite-se que os atores não agem apenas de acordo com os seus interesses pessoais, ao contrário suas identidades também influenciam o comportamento nos processos de decisão polÃtica. 5.1.2.1 Subcategoria 2.1 – Clareza no processo de construção da estratégia e divisão das atribuições e responsabilidades Nesta subcategoria são identificados os atores e seu respectivo papel institucional, bem como a divisão das tarefas e responsabilidades no processo de implementação da polÃtica. Para tanto, nas entrevistas realizadas uma das principais preocupações foi identificar os principais atores que participaram do processo de implementação da polÃtica, se ainda participam e como se dá essa participação. Para facilitar a identificação dos atores do Projeto de Irrigação desenhou-se o quadro abaixo: Quadro 10: Atores do Projeto de Irrigação de Ponto Novo Ator Papel institucional Governo do Estado Formulador e legitimador do Projeto SRH (SEAGRI) Responsável pelo projeto Distrito de Irrigação Implementação e gestão do projeto Prefeitura Municipal Parceria com o governo do Estado EBDA Parceria na assistência técnica Conselho Decidir sobre as questões mais gerais relativas ao projeto Fonte: Elaboração própria Ao Governo do Estado coube a formulação da polÃtica, em parceria com a Prefeitura Municipal, sob responsabilidade da SRH, que optou pela criação de uma associação civil, de direito privado e sem fins lucrativos para gerir o projeto, denominada Distrito de Irrigação de Ponto Novo, cujo estatuto social, principal meio de regulamentação da ação dos associados e do próprio distrito como entidade representativa, foi aprovado em junho de 2000 e registrado no cartório da cidade de Saúde, conforme se pode observar nas frases modais abaixo: Art 28º: A Assembléia Geral dos Associados, ordinária ou extraordinária, é o órgão máximo do DISTRITO e, convocada e instalada de acordo com as disposições deste Estatuto e normas internas, tem competência para decidir todos os assuntos relativos ao DISTRITO e tomar resoluções que julgar convenientes à sua defesa e desenvolvimento. (ESTATUTO SOCIAL DO DISTRITO) 103 Somos os responsáveis pelo projeto, em nome do governo do Estado da Bahia, e o Distrito de Irrigação de Ponto Novo, no próprio municÃpio, instituição sem fins lucrativos, sem vÃnculo com o Estado, formado por irrigantes associados faz a gestão do projeto. Nós realizamos a fiscalização. (ENTREVISTADO 1) O Distrito de Irrigação ele é responsável pela operação e manutenção do projeto. Isso é o que está no estatuto social. (ENTREVISTADO 2) O estatuto social aponta ainda os seguintes objetivos e competências para o Distrito de Irrigação de Ponto Novo: I. Administrar, operar e manter, conforme delegação de competência que lhe for conferida, as obras de infraestrutura de uso comum do PROJETO, bem como os prédios de uso da administração e apoio à s atividades do DISTRITO; II. Definir os critérios, a forma, o volume e os horários de distribuição da água entre os irrigantes, observando os planos de cultivo e de irrigação previamente aprovados; III. Estimular e apoiar o associativismo, incentivando a criação de entidades cooperativas ou representativas, que congreguem os irrigantes instalados nas glebas do DISTRITO; IV. Preservar a função social, a racionalidade econômica e a utilidade pública do uso da água e dos solos irrigáveis; V. Orientar os Associados no que se refere à exploração agropecuária, com vistas a compatibilizá-las ao uso comum da água. (ESTATUTO SOCIAL DO DISTRITO DE IRRIGAÇÃO DE PONTO NOVO) Ainda com base no estatuto, o órgão máximo do Distrito é a assembléia geral, onde são eleitos os membros do Conselho administrativo e fiscal, que decidem sobre as questões mais gerais quanto à polÃtica. O conselho administrativo é definido de acordo com uma classificação dos associados, e, neste caso, consideram-se os empresários possuidores de terra a partir de 20,1 hectares; médios produtores os que possuem 5,1 a 20,0 hectares e os pequenos produtores os que possuem lotes de até 5 hectares. Assim, o conselho é formado por 07 membros que são eleitos da seguinte maneira: 03 conselheiros escolhidos exclusivamente por associados classificados como empresários; 03 conselheiros eleitos exclusivamente por associados classificados como pequenos produtores e 01 conselheiro indicado exclusivamente por associados classificados como médios produtores. 104 Vale destacar que os pequenos produtores são maioria quando se considera o número de lotes no distrito, uma vez que os mesmos possuem no total 138 lotes de 5 hectares, contra 63 divididos entre a classe empresarial e os médios produtores. Neste caso, observa-se que os pequenos produtores, apesar de maioria, são transformados em minoria no conselho, que tem entre várias atribuições, aprovar o regulamento do distrito e estabelecer a sua polÃtica de atuação, ou ainda decidir quanto ao cargo da gerência executiva. Portanto, o Distrito de Irrigação de Ponto Novo está a serviço dos empresários em detrimento da maioria dos pequenos agricultores, mas a conta de sua manutenção é dividida por todos. Esse argumento se reforça quando percebemos a concentração dos lotes nas mãos de duas empresas que podem, assim, eleger, praticamente sozinhas, os 04 representantes do conselho. (SILVA, Op. Cit., p. 251). Para cumprir o requisito quanto à assistência técnica, foi implantado, em 2004, um escritório da EBDA em Ponto Novo. Neste caso, percebe-se uma distorção nesta informação e não fica devidamente esclarecida à atuação e responsabilidades deste ator, se forem observados os depoimentos abaixo: Também em 2004 foi criado um escritório da EBDA na região, com agrônomos e duas assistentes sociais para prestar assessoria técnica e social aos agricultores e suas famÃlias. (ENTREVISTADO 1) Quando a EBDA foi implantada em Ponto Novo foi para atender a reforma agrária, pois antigamente o escritório funcionava em Caldeirão Grande. Com o governo de Valdir Pires, o escritório de Caldeirão Grande foi fechado e transferido para Ponto Novo. Quando o escritório foi aberto em Ponto Novo, foi criado exclusivamente para atender ao projeto de Reforma Agrária. O projeto de irrigação veio depois. (ENTREVISTADO 4) A EBDA participa das reuniões do Conselho. (...) A gente não participa de outras questões, até por que é ordem de Salvador. Tem o caso de um colega de Terra Nova que tentou entrar em questões da área irrigada, empolgado em contribuir e foi “tesourado†pela Diretoria. Então, infelizmente a EBDA está muito longe deste projeto de irrigação, a gente até se intimida. A EBDA até tem gente para trabalhar nessa área, na verdade, pesquisa é trabalho da EBDA também. (ENTREVISTADO 4) Com relação ao projeto de irrigação a EBDA não tem responsabilidade direta. Esta responsabilidade fica com a assistência técnica do distrito. A gente cuida da elaboração de projetos. No ano anterior elaboramos 45 projetos para o Banco do Brasil, que contemplavam a área irrigada, e estes produtores estão produzindo banana, maracujá e goiaba. (ENTREVISTADO 4) 105 5.1.2.2 Subcategoria 2.2 – Participação e compreensão da polÃtica por parte dos atores envolvidos A principal caracterÃstica observada neste aspecto é a desarticulação entre os atores do projeto. Apesar de existir um conselho, percebe-se que os atores não se relacionam de forma ativa, e, portanto não compõe uma rede, vÃnculo que se entende essencial para que o projeto amadureça do ponto de vista das polÃticas públicas, formando assim um policy network. Neste caso, como as estruturas polÃtico-administrativas estatais centralizaram os processos de formulação e implementação na figura do Governo do Estado, da Prefeitura Municipal e da associação criada para fins de gestão que é o Distrito de Irrigação, não foi possÃvel favorecer o diálogo e participação ativa dos demais atores que fundamenta o conceito de policy network. Os demais atores resumem sua participação à frequência nas reuniões do Conselho. Dessa forma, o projeto não consegue formar uma rede capaz de amadurecê-lo e transformá-lo de acordo com a leitura do problema social. Os depoimentos e a análise feita nos trabalhos de Souza (2010) e Silva (2008) levaram à reafirmação das seguintes constatações: O projeto de irrigação de Ponto Novo é do Estado, sob responsabilidade da SRH e gestão do Distrito de Irrigação. Somos os responsáveis pelo projeto, em nome do governo do Estado da Bahia, e o Distrito de Irrigação de Ponto Novo, no próprio municÃpio, instituição sem fins lucrativos, sem vÃnculo com o Estado, formado por irrigantes associados faz a gestão do projeto. Nós realizamos a fiscalização. (ENTREVISTADO 1) Na sua formulação, a participação foi exclusiva do Estado, e, apesar de executar algumas ações que envolveram indivÃduos do municÃpio e municÃpios vizinhos, em nenhum momento a comunidade foi consultada no processo de formulação sobre as estratégias pensadas para os recursos hÃdricos. No entanto, mesmo não tendo sido consultados, a comunidade local não apresentou oposição quanto à polÃtica, pois já esperavam que a ação pública pudesse minimizar os efeitos das estiagens, conforme se observa nos depoimentos a seguir. Ou seja, os depoimentos ratificam que o governo do estado usou dois fortes argumentos para legitimar a ação que construiu a barragem: primeiro o combate à seca 106 no semiárido nordestino, cuja imagem é fortemente vinculada à manutenção da pobreza e da miséria, aliás, uma justificativa histórica para esconder as mazelas da ineficiente ação do poder público; segundo o anseio de um grupo de pequenos produtores com tradição na esfera da irrigação. No entanto, o governo do estado inverte o foco, inclusive inverte o próprio anseio dos agricultores locais que pensavam em água para suas demandas e não na implantação de um mega projeto empresarial do qual não fazem parte (SILVA, Ibidem, p. 291). Este tipo de implementação, que se dá de cima para baixo, onde todo o controle está nas mãos dos “formuladoresâ€, neste caso, o Governo do Estado, é denominada como top dow e baseia- se na visão clássica do ciclo de polÃticas que reflete a idéia de hierarquia da administração pública, em que o poder público deve tomar a decisão e os demais devem acatá-la. Neste caso, os depoimentos seguintes ilustram as lacunas provocadas pela distorção e falta de sintonia entre as percepções dos que estão no topo das instituições públicas e os anseios da sociedade, o que é iminente ao modelo top dow. Da decisão de implantação não, porque esse foi um programa do governo do estado, o governo já veio com esse programa, ele tinha um programa de aproveitamento dos recursos hÃdricos e dentro desse programa tinha a construção dessas barragens aÃ, a barragem do rio Aipim, a barragem de Ponto Novo, a barragem de Pedras Altas, tem lá em Senhor do Bonfim a barragem da Barroca do Faleiro, que todas essas barragens são de grandes programas de aproveitamento dos recursos hÃdricos da bacia do rio Itapicuru. Na realidade o que houve aqui a gente se envolveu já no processo depois do inÃcio da implantação porque o próprio programa previa a criação de Comissões Municipais de Usuários das Ãguas, que era as COMUAS, aà eu entrei numa dessas comissões, eu fui um dos membros que participei dessa comissão municipal de usuários da água (Representante da Associação Comercial do MunicÃpio de Ponto Novo e membro da COMUA). Existiam principalmente os irrigantes como eu, porque a gente tinha perÃodo em que o rio deixava de existir, porque não é um rio perene é um rio temporário, e aà no perÃodo em que o rio parava de correr água a gente tinha prejuÃzo, então existia aquele anseio, aquela vontade, a solicitação a determinados polÃticos para a construção da barragem, não se sonhava inclusive com uma barragem do porte da que foi construÃda, o sonho era menor, porque já existiam construções de barragens no próprio leito do rio e essas barragens elas garantiam determinados produtores a terem uma safra. Então se pensava uma barragem de nÃvel no rio que desse um determinado volume pelo menos para atender uma quantidade de produtores ali na margem, muito anterior a esse já se falava que existia um projeto de construção de diversas barragens intermediárias entre Pindobaçu e Queimadas, que eram barragens pequenas, mas que iriam perenizar o rio (Representante da Associação Comercial do MunicÃpio de Ponto Novo e membro da COMUA) (SILVA, Ibidem, p. 289-290). Quanto à ação do Estado se observa ainda que houve uma relação diferenciada e seletiva entre os demais atores, o que cria uma confusão entre o que foi proposto, o que a propaganda e a imagem gerada impõem e o que de fato está acontecendo, conforme destaca Silva (Ibidem, p. 324-325): 107 ï‚· a relação do Estado com os pequenos proprietários foi de simples interesse econômico, num primeiro momento, quando propôs indenizar a todos e não mais criar vÃnculo e compromisso; e de negociação num segundo momento, quando foi hábil para negociar a relocação, o que recriou o vÃnculo e o compromisso de reassentá-los de forma digna e completa; ï‚· a relação do Estado com poder público municipal foi de total parceria e comprometimento mútuo, o que resultou numa facilitação da execução dos projetos propostos; ï‚· a relação do Estado com a comunidade de Ponto Novo foi a de promotor do combate à seca e de provedor da água necessária para minimizar os problemas, e de muita propaganda e promessa. Promessa de gerar emprego, renda e de diminuir a pobreza de forma significativa; promessas que até o momento não verificamos estarem sendo cumpridas; ï‚· a relação do Estado com a Igreja Católica e com o CDL não foi efetiva o suficiente para ouvi-las como vozes discordantes, ao mesmo tempo essas instituições não se articularam para dizer não à execução dos projetos, o que só começou a acontecer agora com a tentativa do Estado de ampliar a área empresarial do perÃmetro irrigado; ï‚· a relação do Estado com os empresários foi de total acordo e articulação, inclusive com a colocação da máquina pública a serviço dos representantes do grande capital; ï‚· no processo de implantação da barragem e dos projetos derivados do uso da água o Estado envolveu todos os agentes de forma a minimizar conflitos de interesses através do uso da imagem de Nordeste seco e miserável em oposição à gestação de uma imagem de terra da agricultura irrigada, onde a água é projetada como capaz de trazer um progresso que produz melhorias para todos, legitimando sua ação como se fosse uma ação que representa o interesse e o anseio de todos. A Prefeitura Municipal assumiu o papel de parceira do Estado, não para debater o projeto, mas para implantá-lo, e como requisitante quanto à construção da barragem, o que ampliou o poder de ação e negociação do Estado. Neste caso, percebeu-se muita insatisfação quanto à inércia da prefeitura junto à polÃtica. O municÃpio é apenas um colaborador, por que, todas as dificuldades que eles passam, recorrem ao municÃpio para buscar apoio. (ENTREVISTADO 3) Acredito também que se faz necessária mais parceria com a prefeitura municipal. Percebo a prefeitura muito distante desse projeto, mesmo por que existem questões polÃtico-partidárias, que pra mim deve ser arbitrário nesse processo, e uma série de outros fatores. (ENTREVISTADO 4) A prefeitura não tem intervenção direta no projeto de irrigação. O projeto de irrigação é administrado pelo conselho formado pelos pequenos agricultores, reassentados e pelos lotes empresarias, as empresas aqui instaladas. (ENTREVISTADO 3) O poder público municipal, neste sentido, assumiu o projeto também como seu, difundindo a imagem que foi estabelecida pelo Estado e apoiando para que a ação acontecesse com o 108 mÃnimo de conflito, o que potencializou a capacidade do agente hegemônico de agir com o máximo de adesão e consenso, conforme se pode verificar no seguinte depoimento: Foi solicitada essa barragem aqui através do prefeito atual, quando da primeira gestão dele, 1993 a 1996, foi iniciativa dele. Ele já pensava em implantar a barragem e após a implantação da barragem aà entrou o parceiro maior que foi o Banco Mundial. E a prefeitura tem uma grande parceria com o Estado. A prefeitura sempre apoiou o Estado e o Estado sempre apoiou a prefeitura (Representante do Poder Público Municipal) (SILVA, Ibidem, p. 292). A SRH, a EBDA e o Distrito de Irrigação foram os principais atores envolvidos no inÃcio da implementação da polÃtica, em especial na construção da barragem, conforme se observa no trabalho de Silva (Ibidem, p. 288-289): Eu trabalhei no projeto da SRH que era o departamento de estudos e conflitos da água, depois da barragem o que iria trazer de benefÃcios, o que iria criar de conflito do uso da água, esse era um projeto que a gente basicamente trabalhava com entrevistas com lideranças locais pra ver os problemas, no perÃodo diagnosticou problemas de poluição dos rios, uso de metais pesados, curtume, essas coisas, foi mais um levantamento, já tava na fase de construção da barragem (Técnico a serviço do Estado – SRH). Eu trabalhei aqui na implantação da barragem, eu fiz um levantamento das áreas, na época não trabalhava aqui nesse órgão, trabalhava no antigo INTERBA, hoje é o CDA, eu trabalhei fazendo o levantamento das áreas que foram indenizadas, nessa parte onde hoje está o perÃmetro irrigado e foram reassentadas as famÃlias, onde hoje está o lago, eu trabalhei no inÃcio desse processo, no INTERBA, fazendo esse levantamento dessas áreas (Técnico a serviço do Estado – EBDA). Eu era funcionário da Odebrecht, responsável pelo controle ambiental da barragem, e fiz parte da CTGA, era eu e mais um... que a Odebrecht tinha um ambientalista contratado, ele era geral, ele fazia parte de várias obras, e ele ficava locado na barragem de Ponto Novo, ele vinha uma vez por mês, dava as coordenadas direitinho e a gente aplicava, era bota fora! A gente tinha que controlar se esse bota fora tinha condição de ficar na área de APP, se era um bota fora vegetal, se era um bota fora resto de construção, desmatamento da bacia eu acompanhei. Depois de construÃda a barragem eu fui convidado para fazer o mapeamento na parte de preservação permanente, foi meu primeiro trabalho como consultor, pela SRH, por intermédio desse trabalho fui convidado para ser supervisor na área ambiental, ou seja, a CERB ficava com a parte de concreto, que era o eixo da barragem, e eu ficava com a questão ambiental mesmo, com a gestão do reservatório (Técnico a serviço do Estado – SRH). Quanto à participação do Distrito, conforme previsto no estatuto, o mesmo possui uma função gerencial que visa viabilizar a agricultura irrigada, mas apresenta deficiência na oferta de assistência técnica, e, como estabelece o artigo 64 do estatuto, não consegue promover ações para incentivar o associativismo e cooperativismo, ou ainda, a oferta de infraestrutura que viabilize a comercialização dos produtos. 109 Observa-se ainda que de certa forma houve participação dos demais atores ao longo do processo de implementação da polÃtica através das reuniões do Conselho. No entanto, nos depoimentos analisados não há registros de uma participação mais intensa, no sentido, por exemplo, de discussão sobre os objetivos da barragem, sobre o escopo do projeto. Não houve grande mobilização social, e, assim, o “Estado foi legitimado a agir, encontrando no Banco Mundial o parceiro ideal para a execução de suas propostas.†(SILVA, Op. Cit., p. 235). Esses aspectos são importantes porque a barragem poderia ter sido construÃda com uma outra gama de objetivos, como por exemplo, implantar um grande projeto de reforma agrária beneficiando agricultores locais e suas famÃlias ou mesmo dar suporte à s atividades nos assentamentos já existentes, mas foi direcionada para privilegiar a ação das empresas privadas ligadas ao mercado financeiro internacional. Não houve um amplo debate sobre essas ações, ao mesmo tempo em que não houve o envolvimento da comunidade local, nem tampouco foram criados mecanismos de maior participação na tomada de decisão. O depoimento de um dos lÃderes dos pequenos agricultores ratifica esta afirmação, pois reconhece que precisam se organizar melhor para atuarem nas assembléias em busca de seus interesses, uma vez que a ação do distrito privilegia os anseios das grandes empresas, e não aceitar e apoiar propostas que beneficiem apenas a classe empresarial. Para eles, a participação é muito pequena e sem efetividade e não está centrada nos interesses coletivos. Essa constatação pode também ser confirmada tanto nas entrevistas realizadas quanto nos resultados apontados no trabalho de Silva (Ibidem), ao destacar que: Outro problema que a gente percebe é que faltam recursos e tecnologia. Além disso, nós pequenos agricultores temos mais dificuldades. O projeto beneficia mais os empresários que os assentados. A gente não tem condições de manter o sistema de irrigação. É muito alto o custo. A gente não tem condições de manter. (ENTREVISTADO 6) Nós agricultores precisamos nos organizar melhor para atuarmos nas assembleias em busca de nossos interesses. Não devemos apoiar qualquer proposta, e a maioria delas beneficia bastante as empresas. Nossa participação é muito pequena e não foca a defesa de nossos interesses. Reconheço que a gente ainda não conseguiu se organizar para fazer propostas que defendam os nossos interesses. É muito difÃcil conduzir o grupo. (ENTREVISTADO 6) Além disso, existe a imagem da seca como causa da miséria, da falta d‟água como legÃtima culpada pelos seculares problemas estruturais do semiárido brasileiro, como pano de fundo que dificulta a ação da sociedade civil. Para a maior parte da população que vive no semiárido é absurdo ser contra uma ação que vai disponibilizar água, em 110 grande quantidade e em condição de ser utilizada a partir dos sistemas integrados de abastecimento humano e irrigação. (SILVA, Ibidem, p. 240). A construção da barragem de Ponto Novo resultou de um planejamento estatal, de polÃtica de governo, pensada por técnicos sob a orientação de um conjunto de princÃpios preestabelecidos, inclusive atentando para as diretrizes do Banco Mundial, que estavam voltadas para atender a uma lógica: a construção de um pólo empresarial de irrigação. No caminho para a execução desse projeto estavam os pequenos agricultores, pequenos proprietários, posseiros, meeiros, etc. (SILVA, Ibidem, p. 242). Neste caso, fica evidente o poder do Estado na decisão quanto os rumos de Ponto Novo, numa relação onde não se observa controle e dominação, mas uma legitimação da ação do ator dominante pelos demais atores envolvidos. Além disso, percebe-se de forma muito clara os objetivos finais do governo que era fomentar a agricultura empresarial, o que implica afirmar que a construção da barragem foi pensada numa estratégia de intervenção estatal mais ampla para a reestruturação produtiva e uso do território, ou seja, para a construção de um pólo empresarial de irrigação na região. Percebe-se ainda, que o distrito foi concebido com a intenção de gerenciar e apoiar os irrigantes em questões que vão além da oferta ou regulação da água. Ou seja, tal entidade deveria fomentar o desenvolvimento e zelar pela infraestrutura que lhe foi confiada. Sobretudo, na análise realizada a partir das entrevistas, observa-se um descontentamento por parte dos atores quanto à atuação desta entidade. Percebo também que falta mais iniciativa do Distrito para resolver as questões necessárias. (ENTREVISTADO 3) Falta um posicionamento e atuação mais forte do Distrito de Irrigação em relação especialmente à capacitação e busca de melhorias. (ENTREVISTADO 3) 5.1.3 Categoria 3: Condições institucionais e sociais dos resultados Nesta categoria examina-se o processo de implementação com vistas a identificar os fatores facilitadores de resultados e buscam-se também reconhecer os obstáculos ao alcance destes resultados. 5.1.3.1 Subcategoria 3.1 – Fatores facilitadores que operam ao longo do processo de implementação da polÃtica 111 Quanto aos fatores facilitadores observados ao longo do processo de implementação da polÃtica e validados nos depoimentos que se seguem, considera-se inicialmente, a assistência técnica que foi oferecida no inÃcio do projeto. Existiu assessoria técnica e social aos agricultores e suas famÃlias no inÃcio da implementação da polÃtica por parte da EBDA, bem como pela equipe de assistência técnica e social que existia no projeto em sua fase inicial, conforme revelam alguns dos entrevistados: Também em 2004 foi criado um escritório da EBDA na região, com agrônomos e duas assistentes sociais para prestar assessoria técnica e social aos agricultores e suas famÃlias. (ENTREVISTADO 1) O Distrito tem uma equipe de assistência técnica. O objetivo dela é geração e fomentação, e com isso existe o esforço de uma equipe técnica, que em algum momento a gente recebia recursos do Estado. Hoje a gente não tem a equipe de assistência técnica, mas a gente continua mantendo este serviço, pois temos outros recursos do Estado, e como se diz, uma mão lava a outra. (ENTREVISTADO 2) Mesmo sem a devida autonomia e efetiva participação no que diz respeito aos rumos da polÃtica, destaca-se a existência e as reuniões do Conselho como necessárias ao menos para discutir os aspectos mais gerais da polÃtica, conforme se configura atualmente, e segundo percepção dos entrevistados: Existe um conselho que estabelece as diretrizes de administração, e esse conselho é formado pelo segmento da agricultura familiar e o segmento empresarial. (ENTREVISTADO 2) O projeto de irrigação é administrado pelo conselho formado pelos pequenos agricultores, reassentados e pelos lotes empresarias, as empresas aqui instaladas. (ENTREVISTADO 3) Nós como diretores, participamos da gestão do projeto, fazemos parte do conselho de gestão do Distrito, e via conselho de gestão a gente busca o que é melhor para o Distrito como um todo. (ENTREVISTADO 5) 5.1.3.2 Subcategoria 3.2 – Obstáculos que operam ao longo do processo de implementação da polÃtica Ao submeter os documentos e as verbalizações dos atores institucionais entrevistados ao método de análise de conteúdo, foi possÃvel identificar frases modais que apontam os principais obstáculos que operam ao longo do processo de implementação da polÃtica. 112 Um dos principais obstáculos relatado diz respeito ao choque cultural existente na implementação do projeto, pois o mesmo gerou uma série de modificações na organização especial e no uso do solo, além de ter fomentado processos produtivos que eram desconhecidos e tecnologias que não eram comuns à realidade da população local. Desta forma, os relatos apontam resistência a essa proposta, que contrariava todo um conjunto de relações cotidianas que formatavam a cultura local, segundo a opinião de alguns entrevistados: Existem muitos pontos crÃticos. Inicialmente, a dificuldade em lidar com a cultura que o pessoal já tinha no local. Como eles trabalhavam com outra atividade, e a agricultura irrigada é muito diferente da agricultura de sequeiro. E à s vezes a pessoa que nasceu e se criou fazendo aquilo apresenta uma certa resistência a inovação tecnológica, ao próprio espÃrito empreendedor. (ENTREVISTADO 2) A dificuldade maior que tivemos foi este choque cultural. (ENTREVISTADO 2) A gente participou ali aonde seria uma 3ª etapa do projeto, a gente participou de uma luta de resistência de não querer as indenizações para a implantação de uma 3ª.etapa do projeto, por que muita gente sentiu que diversas pessoas que foram indenizadas na 1ª. e na 2ª. etapa tiveram problemas de subsistência até, porque não tavam preparados para essa mudança repentina de atividade, de local, porque essas indenizações elas causam esses impactos sociais e isso o pessoal da 3ª. etapa, já observando esse impacto não aceitou, por uma questão cultural, problema de famÃlia, de situação geográfica, problema de atividade econômica. Você diz: não, rapaz, vai ser bom você ter uma indenização porque você vai receber 10.000 reais; 10.000 reais para quem nunca teve 1.000 reais no bolso soa como um volume de recurso muito grande. Só que ele não consegue perceber que aquilo vai dar para comprar muito pouca coisa e não vai dar uma sustentação, então ele vem compra uma casa de 9.000 e fica com 1.000 que vai dar pra ele sobreviver dois, três meses só. Então esses impactos sociais houveram aqui, e por isso a gente mesmo tendo conhecimento que iam ocorrer esses impactos, a gente que tinha consciência disso não tinha como ser ouvido aqui porque a expectativa na época era extremamente positiva (Representante da Associação Comercial do MunicÃpio de Ponto Novo e membro da COMUA) (SILVA, Op. Cit., p. 326). Ou seja, não se pode negar que houve um vultoso investimento na infraestrutura do projeto e em equipamentos e tecnologia avançada. No entanto, negligenciou-se a cultura local e as condições do homem do campo que, em sua maioria semianalfabeto, se viu diante uma nova realidade. É fato, pois, que já existia uma tradição de irrigação à s margens do rio, entretanto, esses agricultores não tinham predisposição a se transformarem em agricultores empresariais, ainda que pequenos, como foi imposto pelo estado à queles que optaram pela realocação. 113 Nesse caso, os principais envolvidos são os pequenos proprietários que não conseguiram se reterritorializar, ou seja, saÃram de suas terras, deixaram seu jeito de viver e produzir, mas não se adaptaram à s novas relações que se estabeleceram e aos novos processos de produção. Logo esses proprietários ficaram fora do processo, como é o caso dos proprietários que já venderam seus lotes ou receberam a indenização e gastaram o dinheiro, ficando sem terra, sem trabalho, sem lugar para viver e desassistidos pelo Estado(...). (SILVA, 2008, p. 243). Além disso, a questão financeira, pela dificuldade em financiamentos e a gente até achava que não era aconselhável conseguir trazer um banco para financiar o projeto que estava iniciando, por que eles têm uma grande dificuldade de gestão da propriedade, e isto ainda existe. (ENTREVISTADO 2) Neste perÃodo seco, por mais incrÃvel que pareça é o melhor perÃodo para o agricultor irrigado, pois há um aumento grande na produção, além disso os preços também melhoram, mas a maioria ainda não sabe conviver com isso e gerenciar. (ENTREVISTADO 2) Tem o perÃodo crÃtico que é o perÃodo de inverno, que é o perÃodo de queda de produção, aumento das doenças fúngicas e daà cai a produção, ocorrem quedas nos preços, as áreas de sequeiros começam a produzir também, e daà eles têm dificuldades pois não souberam administrar para guardar/acumular recursos do perÃodo que foi melhor. (ENTREVISTADO 2) O que está explicitado nas frases modais abaixo apontam também problemas de ordem ambiental na implementação da polÃtica como obstáculo ao alcance dos objetivos do projeto. Problemas relacionados à liberação da licença ambiental que não foi prevista inicialmente, inviabilizou a liberação de recursos por parte dos bancos, e com isso muitos empresários não conseguiram iniciar suas atividades para desenvolver as novas culturas de irrigação empresarial. Além disso, observam-se reflexos indesejados de ordem ambiental, como degradação, erosão e salinização. No entanto, por problema ambiental não conseguimos concluir o projeto quanto a sua principal meta, desenvolver as culturas. No meio do ano passado houve a liberação da licença ambiental, e estamos retomando o projeto nesse sentido, em especial para a produção de feno, voltado para o pequeno produtor (...) Em especial o problema da licença ambiental que não esperávamos que demorasse tanto, pois sem a licença os bancos não financiam. (ENTREVISTADO 1) Mas o segmento empresarial hoje é que é uma parcela ainda não implantada, e isto se deve a alegação das pessoas que participaram da licitação e que adquiram um lote desses, é que a falta de licença da operação é que está atrapalhando a implantação, por conta da dificuldade para encontrar recursos, financiamentos. (ENTREVISTADO 2) Na prática, a gente vê que existe a dificuldade por que o empresário que está implantando, ele tem que buscar recurso, ele tem que conseguir também mercado, 114 neste perÃodo ele não pode ampliar uma área de vez, por que ele ainda não tem mercado certo, ele tem que primeiro ganhar o mercado. (ENTREVISTADO 2) Esta região é marcada por problema de restrição climática e por atividades que induzem a uma degradação ambiental, como a mineração, a pecuária e a agricultura. Assim, se projetos desta natureza não forem bem implementados apresentam maior risco de erosão do meio ambiente e podem trazer outros reflexos indesejados, como o processo de infiltração e salinização do solo. De fato, a irrigação é uma alternativa de melhoria de vida da população, assim como de desenvolvimento econômico, todavia, se não for bem implementada pode promover um processo de degradação ambiental. Além disso, a agricultura em larga escala se não for bem embasada tecnicamente também pode acarretar em degradação ambiental. Dados do SEI (2006) confirma essa análise. “O que se registra hoje nos perÃmetros irrigados são estruturas abandonadas, áreas irrigadas reduzidas, problemas de salinização e açudes subutilizados†(p.26). Agora, ambiental, depende do ângulo. Tudo na vida tem ônus e tem bônus. Então, gerou um certo impacto negativo, nada que a gente não possa conviver. Existem áreas hoje com problemas de salinização, que é natural em todo projeto irrigado, mas a gente tem uma área de reserva legal que estamos tentando recuperar, mas infelizmente ainda não avançamos muito. (ENTREVISTADO 2) Em termos ambiental, infelizmente houve um impacto negativo, relacionado à infiltração em parte do solo, que ocasionou a salinização e que vem nos preocupando muito. (ENTREVISTADO 3) O projeto também pretende construir um posto para recolhimento de embalagens, pois acontece o descarte indiscriminado das embalagens. (ENTREVISTADO 2) Uma abordagem para a questão ambiental em Ponto Novo já havia sido tratada pelo PDDU (2004) do MunicÃpio que apontava que para melhoria dever-se-ia considerar algumas questões: a) Proibição de queimadas, hoje menos frequentes, mas em anos anteriores mais constantes para a fabricação de carvão; 115 b) Permitidos desmatamentos apenas dentro de condicionamentos de manejos e constituição de áreas de reservas legais, preservação de remanescentes significativos da caatinga e em áreas de influência do sistema hidrográfico local; c) Reconstituição da cobertura vegetal nas faixas ciliares do sistema hidrográfico local; d) Criação de unidades de conservação municipais nas principais glebas de remanescentes de caatinga – Serra do Imbé e área entre Barracas e o Rio Itapicuru-Mirim; e) Elaboração de um plano de extração de minerais para fins de construção civil e regularização da atividade; f) Recuperação das áreas degradadas; g) No caso da área rural deve ser controlado o uso de agrotóxicos controle já implantado na área de preservação da barragem, além da introdução de manejos mais racionais de adubação [...]. (PDDU, 2004, p. 11-12). Cabem ainda algumas considerações apontadas no trabalho de Souza (2010) com base no censo agropecuário (2006) e na SEI (2009) sobre essa questão: As orientações técnicas para a agropecuária , em Ponto Novo, são recebidas pelos estabelecimentos em sua maioria pelo Governo, o que mais uma vez evidencia uma caracterÃstica relatada ao longo do trabalho em que demonstra que o projeto tem sua base assistencialista. Outro fator preocupante, é que apesar do projeto ter tido em seu discurso uma preocupação ambiental, apenas 7,3% dos estabelecimentos agrÃcolas praticam a agricultura orgânica, ainda assim sem crescimento por entidades apropriadas. (CENSO AGROPECUÃRIO, 2006). A região tem um perfil em investir mais em lavouras temporárias que permanentes. As lavouras temporárias ocupam uma área de 6.150 ha enquanto a lavoura permanente ocupa apenas 293 ha. Com relação à s pastagens, 10,6% encontram-se degradadas, correspondendo a 1.369 ha. (CENSO AGROPECUÃRIO, 2006). Registre-se ainda que uma das principais dificuldades encontradas foi a falta de dados e documentos consistentes disponÃveis. Percebeu-se que não se adota nenhum procedimento metodológico para retenção e geração de novos conhecimentos a partir das experiências que foram adquiridas. Além disso, o projeto existe há mais de dez anos e ainda não há qualquer tipo de avaliação formal por parte do Estado. No mais, a expectativa e investimento nesta polÃtica foram grandes e chega a ser considerado o mais importante da Bahia. Todavia, se a polÃtica, apesar dos vultosos investimentos, não promove mudança nas relações de produção e de trabalho, a situação da população local não avança para melhorias, conforme se observa nos relatos abaixo. As evidências mostram que os assentados jamais tiveram acesso a participar regularmente do mercado de trabalho e nem a tecnologias avançadas. 116 O objetivo do projeto inicial era atender a uma comunidade que morava na região da barragem, e que foi afetada devido a sua construção; e o pessoal que morava no entorno do local que foi incluÃdo no projeto. Então, para esse pessoal, o Banco Mundial colocou como exigência que eles tivessem uma qualidade de vida igual ou superior ao que viviam anteriormente, e o Estado teve uma preocupação muito grande na indenização em espécie, que era uma indenização que poderia dar a essa pessoa quantia que não esperava e que não estava preparada para aproveitar este recurso. (ENTREVISTADO 2) Outro fator observado como obstáculo é a falta de assistência técnica atual. Apesar de ter sido destacada como fator facilitador anteriormente, considerando o momento inicial da implementação da polÃtica, hoje na fase de consolidação do projeto percebe-se que uma das grandes queixas observadas diz respeito à falta de assistência técnica. Além disso, hoje a equipe técnica está desfalcada por que depois que eu assumi a gerência do Distrito, fiquei assumindo a gerência e a assistência técnica e eu hoje já conversei com o conselho que não dá pra fazer as duas coisas juntas, bem feito, e hoje é importante a contratação de um agrônomo. (ENTREVISTADO 2) Falta de quadro técnico. O quadro atual é de um técnico para atender dois municÃpios. (...) Para se ter uma idéia, a projeção da EBDA é um técnico para atender 100 produtores, e aqui em Ponto Novo nós temos 600 produtores cadastrados, e assim a gente não consegue ter um trabalho de qualidade. É preciso fazer o atendimento de forma rápida de modo que a gente tem dado conta do recado, mas com certa deficiência. (ENTREVISTADO 4) Eu acho que a assistência técnica ainda é uma deficiência muito grande. Ainda ontem eu visitei um produtor que perdeu a safra de maracujá por doença e acho que falta assistência técnica mais atuante. O pessoal hoje está endividado com o Banco por que nem um laudo técnico havia para explicar o fato. Então o produtor, mesmo em área irrigada está em uma situação difÃcil. (ENTREVISTADO 4) O que a gente sabe é que no inÃcio existiram capacitações sobre preparação do solo, etc, mas acho que as pessoas precisam de mais capacitação. Falta mais apoio governamental, assistência técnica. (ENTREVISTADO 3) Eu acho que poderia se estimular um pouco mais, principalmente na área do reassentamento, a vinda de técnicos, por que há carência, especialmente para os pequenos agricultores, que necessitam de mais conhecimento, mais tecnologia, por que a gente percebe que o nÃvel de desenvolvimento poderia ser bem melhor. (ENTREVISTADO 5) Outra questão a se destacar é que não existe ainda formação para nossos jovens sobre a atividade de irrigação, para que possam dar continuidade à s atividades de seus pais. (ENTREVISTADO 3) 117 Hoje uma das grandes preocupações ainda está associada ao comprometimento da água, conforme se observa nos depoimentos abaixo. Tal fato se dá por falta de gerenciamento da água que se agrava no perÃodo de longas estiagens. Neste caso, entende-se que falta gestão da água por parte do Distrito, que não realiza ações que visem formar e conscientizar os produtores quanto aos padrões de racionalidade técnica e financeira. Assim, observa-se um uso indiscriminado por parte dos agricultores que, apesar da seca, pensam a água como recurso ilimitado por conta da barragem. Na avaliação de Silva (Op. Cit., p. 261), “falta esclarecimento, falta um conhecimento aos agricultores que lhes permitam modificar sua visão sobre a relação seca e a água numa região semi-áridaâ€. Os entrevistados ratificam estas informações: Uma preocupação muito grande que nós temos em relação ao projeto refere-se a gestão da água. O projeto ele tem uma limitação de água. Ele hoje ainda não está 100% implantado e já existe uma certa limitação. A gente acredita que se já tivesse sido implantado 100%, a gente hoje já teria racionamento de água. (ENTREVISTADO 5) Quando questionamos os produtores se sabiam a quantidade de água utilizada a cada mês, verificamos que 100% não fazem esse tipo de acompanhamento. Ou seja, não há uma preocupação em dispor da água de forma a reduzir custos ou mesmo usá-la como um recurso limitado. Um produtor justificou que não sabia porque era medido em m3. Os produtores só souberam dizer quanto pagam por mês. (SILVA, 2008, p. 260). Acho que este é o ponto principal que os gestores devem se preocupar, o comprometimento da água, que hoje é um problema muito sério, especialmente numa seca que se vive como hoje. (ENTREVISTADO 5) Esse é um aspecto que só se resolve com educação de qualidade e com a introdução de uma polÃtica voltada para gerir a água não somente como um bem econômico, mas também, como fator de desenvolvimento social. O próprio Estado fez circular entre os demais agentes envolvidos, inclusive os pequenos produtores, a idéia de que há água disponÃvel para todos os empreendimentos e que não se utiliza todo o potencial da barragem. Corroborando com a análise feita por Silva (Ibidem), essa é uma idéia equivocada por parte do Estado, pois não se levou em consideração os ciclos de estiagens do semiárido que ocorrem a cada 3 ou 4 anos, e que se configuram numa longa estiagem. Silva aponta que, “ao contrário do que fez, deveria ter utilizado sua influência, para gestar um discurso e uma prática efetiva de uso sem desperdÃcio.†(Ibidem, p. 261), e não delegar esta ação estritamente ao Distrito, que está sob o domÃnio de grandes produtores, conforme já foi discutido neste trabalho. Para o autor, deu-se muita ênfase para a infraestrutura do projeto e não existiram ações formativas e educativas para o melhor aproveitamento da água. 118 Como consequência, o municÃpio vive atualmente este ciclo de longa estiagem e sofre drasticamente as conseqüências pelo anterior uso indiscriminado deste limitado recurso. No dia 09 de abril deste ano, agricultores do distrito de irrigação e moradores dos municÃpios vizinhos, obstruÃram durante horas a estrada que vai para Juazeiro com carcaças de animais e frutas, reivindicando a anistia das dÃvidas agrÃcolas em função da falta de produção, por causa da seca; garantia da manutenção da irrigação, com ampliação da oferta de água de quatro para oito horas/dia; apoio aos pequenos produtores; aumento da capacidade da barragem de Ponto Novo; canalização da água do rio São Francisco para a região, e o compartilhamento da gestão da barragem entre o Distrito de Irrigação de Ponto Novo/Embasa e Sema/CERB. Além disso, os resultados apresentados até o momento não correspondem à expectativa gerada pela ação do governo, o que é ratificado pelos resultados apresentados nas categorias e subcategorias desenhadas, comprometendo assim, o alcance da eficácia da polÃtica. 119 6. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES Quando se observa as diferentes modalidades de avaliação, percebe-se que a avaliação de polÃticas públicas não pode ser restrita à aferição das metas quantitativas, no entanto, deve se reportar à qualidade do resultado alcançado. É neste sentido que os conceitos de eficiência, eficácia e efetividade se revelam importantes no campo das polÃticas públicas. A avaliação da eficácia de um projeto, sobretudo quando implementado pelo poder público como se fosse polÃtica pública, permite a imersão de algumas questões que dificilmente seriam observadas se fossem analisadas somente à luz do próprio projeto e dos seus respectivos objetivos. Assim, as considerações finais aqui expostas refletem o caminho percorrido em busca de res- postas para a questão norteadora deste trabalho que almeja justamente analisar a eficácia de uma polÃtica pública: Quais os principais fatores facilitadores e/ou obstáculos que tem influ- enciado o alcance da eficácia do processo de implementação do Projeto de Irrigação de Ponto Novo-BA? O primeiro objetivo especÃfico - compreender os aspectos teórico-metodológicos que fundamentam os processos de avaliação em polÃticas públicas com foco na modalidade de análise da eficácia – foi trilhado a partir da imersão em obras de autores clássicos e contemporâneos, o que viabilizou um olhar diferenciado para o campo da pesquisa. Este mergulho na literatura revelou-nos que o grande desafio para a disseminação de instrumentos de avaliação de programas no setor público é, justamente, encontrar pressupostos teórico- metodológicos que permitam avaliar, de forma confiável, o desempenho das polÃticas. Partindo das inquietações provocadas pelas leituras realizadas foi possÃvel alcançar o objetivo em questão, tendo em vista o desenvolvimento do trabalho de dissertação ter como base as teorias que trabalham as PolÃticas Públicas, de forma mais especÃfica, o campo da avaliação em polÃticas públicas, com foco para a avaliação da eficácia. O segundo objetivo especÃfico proposto foi identificar e/ou desenhar instrumentos metodoló- gicos que possibilitem analisar a eficácia do Projeto de Irrigação de Ponto Novo. Para tanto, recorremos ao arcabouço teórico que trata de forma especÃfica da avaliação de polÃticas públi- cas e após explorar todo o material disponÃvel e identificar algumas propostas de metodologi- as de avaliação, optou-se por desenhar um instrumento de análise a partir da sistematização de 120 categorias e subcategorias analÃticas, tendo como critério a avaliação da eficácia da polÃtica em sua implementação. As categorias e subcategorias analÃticas desenhadas nesta pesquisa foram elaboradas, a priori, levando em consideração o que Laville& Dionne (1999) denominam de modelo fechado, que permite ao pesquisador a prévia definição das categorias e subcategorias analÃticas tomando como base a teoria que trata do tema pesquisado. Além disso, para o desenho do instrumento tomou-se como referência a sistematização de variáveis para identificação de polÃticas públicas inovadoras, democráticas e participativas proposta por Farah (1997; 2002) e Spink e Farah (1999), e assim, o mesmo foi delineado nas seguintes categorias: 1) Engenharia institucional e traços que constituem a polÃtica; 2) Atuação dos atores envolvidos e 3) Condições institucionais dos resultados, o que proporcionou o alcance do referido objetivo. Para alcançar o terceiro objetivo especÃfico - compreender, de forma critica e contextualizada, o projeto, seu enquadramento institucional, seu ciclo de implementação, a dinâmica que ca- racteriza a atuação dos principais atores envolvidos, os objetivos pretendidos, o público-alvo beneficiado diretamente com a polÃtica, os critérios de inclusão e seleção dos reassentados e dos empresários locais, os benefÃcios recebidos pelos participantes e a presença ou não de condicionalidades, acessamos o trabalho de Souza (2010), Silva (2008) e realizamos a pesqui- sa de campo, o que viabilizou o alcance deste objetivo. Foi possÃvel compreender e contextualizar a polÃtica formulada pelo Governo do Estado da Bahia, através da SEAGRI e da SEMARH, com apoio do Banco Mundial e denominada Pro- jeto de Irrigação de Ponto Novo, que tem como objetivo central desenvolver o potencial pro- dutivo do semiárido baiano, com o aproveitamento da barragem de Ponto Novo. O quarto objetivo especÃfico proposto foi verificar se a polÃtica tem conseguido alcançar os objetivos e metas definidos na formulação e/ou revisão do Projeto. Para tanto, aplicamos o instrumento desenhado a partir da categoria analÃtica: Engenharia institucional e traços que constituem a polÃtica, e subcategorias: 1) Clareza dos objetivos, metas e direção da polÃtica; 2) Recursos necessários considerados no momento da formulação/implementação da polÃtica; e 3) Cumprimento dos objetivos, metas e prazos. 121 Com base nos resultados obtidos, observou-se que os objetivos, metas e direção da polÃtica, delineados no Plano Diretor de Recursos HÃdricos da Bacia do Itapicuru não foram compreendidos da mesma forma por todos os atores envolvidos no processo. A polÃtica tem enquanto finalidade última desenvolver a agricultura irrigada empresarial. Dessa forma, foram viabilizados investimentos expressivos em infraestrutura e reordenação do uso do solo, e de fato, dois grupos empresariais que concentraram os lotes concedidos na segunda etapa, foram os principais beneficiários, contrariando as expectativas dos pequenos agricultores que esperavam uma mudança substancial de vida a partir da resolução do problema das longas estiagens. Em contrapartida, o municÃpio ainda apresenta problemas de acesso à água, problemas de saneamento básico e precarização dos serviços essenciais. Logo, é possÃvel concluir que a polÃtica causa confusão quanto ao entendimento dos seus objetivos quando se observa os resultados até então alcançados e o direcionamento que foi dado à polÃtica. Neste caso, observa-se que o Estado fez uso da imagem simbólica do Nordeste seco que causa a miséria e a projeta positivamente o futuro de Ponto Novo como portal da agricultura irrigada, facilitando assim a sua ação. Ou seja, a ação do Estado foca a água como recurso ao serviço da iniciativa privada e não para a comunidade, onde muitos que vivem a poucos quilômetros da barragem não têm acesso a ela e os resultados ainda são escassez da água, altos Ãndices de desemprego, analfabetismo e pobreza, quando a população local esperava desenvolvimento, contrariando o que se entende como polÃtica pública, uma ação voltada ao tratamento de problemas sociais considerados de pública relevância. Quanto aos recursos necessários que foram considerados no momento de formulação/implementação da polÃtica, considerou-se na análise além do investimento inicial empregado, todos os recursos que foram disponibilizados em forma de benefÃcios ao público- alvo. O projeto resultou num investimento total de R$ 75,3 milhões, sendo R$ 35,6 milhões na implantação da barragem e R$ 39,7 milhões nas obras de irrigação e linha de transmissão. Logo, se compararmos o valor do investimento público aos resultados obtidos que mais beneficiou a classe empresarial, percebe-se que existe incoerência na ação. É coerente questionar neste sentido: por que o investimento não foi direcionado para os que já estavam assentados, para uma promoção da reforma agrária? 122 Quem participou do projeto na 1ª. Etapa foi contemplado com uma casa e diversos benefÃcios, como cesta básica, insumo para plantio, ajuda de custo, fornecimento de água e etc, quando não optou pela indenização em espécie. No entanto, verifica-se que a ação do Estado ocorreu sem consultar de forma prévia os proprietários interessados. Ou seja, o processo de realocação acabou se dando de forma forçada, pois não existia uma terceira opção, ou agricultor aceitava a realocação ou recebia a indenização. Assim, um problema de ordem social foi criado com a geração dos excluÃdos, antigos proprietários de terras que receberam apenas as indenizações e que perderam tudo por não saber administrar bem o recurso. Para aqueles que optaram pelo lote, também houve prejuÃzo para a grande maioria pois não souberam gerir bem os recursos e não estavam capacitados para a nova forma de produção. Quanto a estes benefÃcios dispensados em forma de recursos, percebeu-se que a comunidade ficava na expectativa que o Estado subsidiasse a manutenção dos seus lotes, e, além disso, a população produzia, mas não reservava parte dos recursos provindos da atividade para o reinvestimento no lote, o que ocasionava certa dependência do assistencialismo do Estado. Outra consequência do assistencialismo é a falta de mobilização social como resultado do comodismo. Atualmente, em Ponto Novo, todo o investimento realizado na piscicultura e na floricultura encontram-se abandonados. Falta auto-gestão, que requer uma preparação educacional e cultural. Conclui-se dessa forma, que a participação do Estado em Ponto Novo, ao tentar contribuir para o desenvolvimento local, acabou por exacerbar seu papel e condicionar uma comunidade à sua manutenção constante. Para a 2ª. etapa do projeto foi concedido direito real de uso dos lotes para fins agrÃcolas e agropecuários através de uma licitação na modalidade de concorrência pública. Para participar da licitação, pessoa fÃsica ou jurÃdica, deveria apenas apresentar documentos e certidões negativas de débito com os principais órgãos públicos estaduais e federais, não existindo assim nenhum critério que garantisse experiência com a agricultura irrigada. Neste aspecto vale destacar que faltou fiscalização apropriada do Estado no processo de licitação dos lotes empresariais. Houve um processo de especulação durante a licitação e 123 muitos compraram lotes, não implantaram projetos e de posse da terra procuraram vendê-la a um preço maior. Vale ainda observar que de acordo com os objetivos iniciais do projeto, 63 lotes empresariais deveriam ser disponibilizados nesta etapa. Com isto, esperava-se que várias empresas iniciassem suas atividades em Ponto Novo, o que contradiz a ação do Estado que previa fomentar a ação de várias empresas. Ao contrário, apenas dois grupos de empresários acabaram adquirindo boa parte dos lotes. Quanto ao cumprimento dos objetivos, metas e prazos, levando em consideração as ações previstas, houve êxito quanto à construção da barragem e ao investimento na irrigação, o que não se pôde observar quanto ao desenvolvimento hidro agrÃcola. No que tange à s ações de saneamento também não foram bem sucedidas, pois a cidade cresceu de forma desordenada ao ponto que falta infraestrutura como rede de coleta de esgoto regular. No que diz respeito à piscicultura, o projeto também não foi exitoso, pois se iniciou um trabalho neste sentido que não foi continuado. Conforme relato, os principais motivos para o insucesso desta iniciativa devem-se aos frequentes desvios dos pescados, falta de articulação entre os membros da comunidade, ausência de liderança para a atividade e o consequente abandono das instalações e equipamentos. Além disso, o projeto teve suas atividades iniciadas em 1999, com prazo previsto para encerramento em três anos, no entanto, o que se observa é um lento processo de implementação da polÃtica e atualmente sinais de resistência a ela, em especial no que diz respeito à ampliação da área, requisito para conclusão da 2ª. etapa. O quinto objetivo especÃfico – identificar os pontos crÃticos do processo de implementação da polÃtica, ressaltando os aspectos facilitadores e/ou obstáculos no alcance da eficácia planejada – foi trilhado a partir da análise feita com base nas categorias: 2) Atuação dos atores envolvidos e 3) Condições institucionais e sociais dos resultados. Partindo da análise da categoria que trata da atuação dos atores envolvidos, vale destacar que 124 ao Governo do Estado coube a formulação da polÃtica, em parceria com a Prefeitura Municipal, sob responsabilidade da SEAGRI, que optou pela criação de uma associação civil, de direito privado e sem fins lucrativos para gerir o projeto, denominada Distrito de Irrigação, e, neste caso, existe clareza na distribuição de papéis. No entanto, quando se observa a efetividade da participação dos demais atores, a principal caracterÃstica é a desarticulação existente. Apesar de existir um conselho, percebe-se que os atores não se relacionam de forma ativa, e, portanto não compõe uma rede, vÃnculo que se entende essencial para que o projeto amadureça do ponto de vista das polÃticas públicas, formando assim um policy network. Neste caso, como as estruturas polÃtico-administrativas estatais centralizaram os processos de formulação e implementação na figura do Governo do Estado, da Prefeitura Municipal e da associação criada para fins de gestão que é o Distrito de Irrigação, não foi possÃvel favorecer o diálogo e participação ativa dos demais atores que fundamenta o conceito de policy network. Os demais atores resumem sua participação à frequência nas reuniões do Conselho. Dessa forma, o projeto não consegue formar uma rede capaz de amadurecê-lo e transformá-lo de acordo com a leitura do problema social. Na sua formulação, a participação foi exclusiva do Estado, e, apesar de executar algumas ações que envolveram indivÃduos do municÃpio e municÃpios vizinhos, em nenhum momento a comunidade foi consultada no processo de formulação sobre as estratégias pensadas para os recursos hÃdricos. No entanto, mesmo não tendo sido consultados, a comunidade local não apresentou oposição quanto à polÃtica, pois já esperavam que a ação pública pudesse minimizar os efeitos das estiagens. Este tipo de implementação, que se dá de cima para baixo, onde todo o controle está nas mãos dos “formuladoresâ€, neste caso, o Governo do Estado, é denominada como top dow e baseia- se na visão clássica do ciclo de polÃticas que reflete a idéia de hierarquia da administração pública, em que o poder público deve tomar a decisão e os demais devem acatá-la. Neste caso, os depoimentos seguintes ilustram as lacunas provocadas pela distorção e falta de sintonia entre as percepções dos que estão no topo das instituições públicas e os anseios da sociedade, o que é iminente ao modelo top dow. 125 Desta forma, fica evidente o poder do Estado na decisão quanto os rumos de Ponto Novo, numa relação onde não se observa controle e dominação, mas uma legitimação da ação do ator dominante pelos demais atores envolvidos. Além disso, percebe-se de forma muito clara os objetivos finais do governo, fomentar a agricultura empresarial, ou seja, a construção da barragem foi pensada numa estratégia de intervenção estatal mais ampla para a reestruturação produtiva e uso do território para a construção de um pólo empresarial de irrigação. Para que exista eficácia nestes programas públicos é preciso desenvolvê-los localmente, de forma que as instituições sejam ligadas à heterogeneidade das relações sociais no âmbito local, já que o Estado Central não é capaz de planejar sozinho o que é caracterÃstico de uma região. Dessa forma, a articulação entre os atores representa uma solução mais adequada ao desenvolvimento pretendido. Partindo da análise da categoria 3 que trata das condições institucionais e sociais dos resultados, com vistas a identificar os fatores facilitadores de resultados, assim como os obstáculos ao alcance destes resultados, verificamos que as facilidades que se revelam condizem ao estágio inicial do projeto, como a assistência técnica e social que foi dispensada aos agricultores e os recursos que foram disponibilizados. No entanto, foram observados alguns obstáculos que operam ao longo da implementação da polÃtica, com destaque para o choque cultural observado, pois o mesmo gerou uma série de modificações na organização especial e no uso do solo, além de ter fomentado processos produtivos que eram desconhecidos, e tecnologia que não era comum à realidade da população local. Desta forma, os relatos apontam resistência a essa proposta, que contrariava todo um conjunto de relações cotidianas que formatavam a cultura local. Foi observado ainda problemas de ordem ambiental, como degradação, erosão e salinização. Esta região é marcada por problema de restrição climática e por atividades que induzem a uma degradação ambiental, como a mineração, a pecuária e a agricultura. Assim, se projetos desta natureza não forem bem implementados apresentam maior risco de erosão do meio ambiente e pode trazer outros reflexos indesejados, como o processo de infiltração e salinização do solo. 126 De fato, a irrigação é uma alternativa de melhoria de vida da população, assim como de desenvolvimento econômico, todavia, se não for bem implementada pode promover um processo de degradação ambiental. Registre-se ainda que uma das principais dificuldades encontradas foi a falta de dados e documentos consistentes disponÃveis. Percebeu-se que não se adota nenhum procedimento metodológico para retenção e geração de novos conhecimentos a partir das experiências que foram adquiridas. No mais, a expectativa e investimento nesta polÃtica foram grandes e chega a ser considerado o mais importante da Bahia, todavia, se a polÃtica, apesar dos vultuosos investimentos, não promove mudança nas relações de produção e de trabalho, a situação da população local não avança para melhorias. O impulso inicial gerado por projetos como o de Ponto Novo acabam por perder forças devido a uma desestruturação social e educacional, assim como a problemas de choque cultural. O desenvolvimento de uma região depende de um investimento em longo prazo com base cultural e educacional. Outro fator observado como obstáculo é a falta de assistência técnica atualmente. Apesar de ter sido destacada como fator facilitador anteriormente, considerando o momento inicial da implementação da polÃtica, hoje uma das grandes queixas observadas diz respeito à falta de assistência técnica. Vale ainda destacar que mesmo tendo tido treinamento no inÃcio do projeto, ainda hoje se observam falhas na qualidade do trabalho, como no manejo do solo e nos cuidados necessários para evitar e controlar pragas. Ainda, atualmente, uma das grandes preocupações está associada ao comprometimento da água. Tal fato se dá por falta de gerenciamento da água que se agrava no perÃodo de longas estiagens. Neste caso, entende-se que falta gestão da água por parte do Distrito, que não realiza ações que visem formar e conscientizar os produtores quanto aos padrões de racionalidade técnica e financeira. Por todos os motivos expostos, conclui-se que a implementação do Projeto de Irrigação de Ponto Novo não atingiu a eficácia, quando considerados os instrumentos de análise utilizados. 127 Por fim, ressaltamos que o caminho para a eficácia em polÃticas públicas não pode ser percorrido unilateralmente, cabendo ao poder público municipal e a sociedade o compromisso de direcionar as polÃticas públicas para a realidade local. A pesquisa aqui exposta pretende contribuir com a academia ao apresentar um instrumento de avaliação para análise da eficácia de polÃticas públicas, cuja discussão ainda é tão incipiente no campo das polÃticas públicas, e ao governo local no sentido de repensar novos rumos para a respectiva polÃtica. Como qualquer trabalho acadêmico é um processo que permeiam algumas limitações, neste caso, destaca-se uma: a falta de dados e documentos consistentes disponÃveis relativos ao projeto, e, portanto dificultou o entendimento quanto ao ciclo da formulação, e, além disso, a gerência do Distrito não é mais a mesma do seu perÃodo inicial. Entende-se que as considerações advindas deste trabalho podem ser vistas como o inÃcio de um leque de possibilidades para outros estudos que envolvam o campo da avaliação de polÃticas públicas, de forma a contribuir com a construção de metodologias que favoreçam a análise da eficiência, eficácia ou efetividade de programas públicos. 128 REFERENCIAS ARAÚJO, G. C. de. A relação entre federalismo e municipalização: desafios para a construção do sistema nacional e articulado e educação no Brasil. Revista Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 36, n. 1, p. 389-402, jan./abr. 2010. ARGYRIS, C. & SCHON, D. A. 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O projeto foi encerrado apenas na parte da infraestrutura, com implantação em 2004. Um investimento de 60 milhões. No entanto, por problema ambiental não conseguimos concluir o projeto quanto a sua principal meta, desenvolver as culturas. No meio do ano passado houve a liberação da licença ambiental, e estamos retomando o projeto neste sentido, em especial para produção de feno, voltado para o pequeno produtor. 3 - Qual a sua avaliação sobre o projeto? Eu conheci Ponto Novo em 2002, e quando cheguei lá num domingo à noite fui surpreendido por não achar nenhum lugar para comer. Não existiam lanchonetes, hotéis ou pousadas e o municÃpio era marcado pela pobreza. A equipe teve que alugar uma casa e a própria dona da casa providenciava a alimentação. Ponto Novo era uma das cidades mais pobres da Bahia. Com grandes estiagens, as perspectivas de desenvolvimento e de produção de alimentos para subsistência já era difÃcil e a produção para o mercado era inimaginável. O Projeto provocou grande transformação na região. Diversos agricultores foram beneficiados. O sÃtio Barreiras investiu na cultura de banana, gerou 400 empregos diretos, com tecnologia de ponta, água tratada. O governo do estado deu lotes para 146 agricultores familiares, 5 hectares para cada famÃlia já com equipamentos de irrigação, e uma casa com água e energia. A economia, o cenário social e a vida das pessoas dessa região ganharam nova perspectiva. A cidade está mais bonita, com casas novas, novos empreendimentos, hotéis, pousadas, 135 restaurantes. Investimos também na entrada da cidade, que era bem precária, hoje muito bonita. Enfim, o projeto tinha como objetivo principal desenvolver o potencial produtivo do semiárido baiano, com o aproveitamento da barragem de Ponto Novo como fonte hÃdrica de suprimento, com a integração entre os pequenos e médios produtores. E esse objetivo foi alcançado. 4 – Em termos de inovação e aprendizagem, como o Senhor avalia o projeto? Foi incorporada tecnologia de ponta, totalmente inovadora, vinda de Israel, com treinamento para os agricultores. Também em 2004 foi criado um escritório da EBDA na região, com agrônomos e duas assistentes sociais para prestar assessoria técnica e social aos agricultores e suas famÃlias. O SÃtio Barreiras oferece constantemente cursos para seus funcionários, bem como para o público externo para desenvolver competências quanto à s novas tecnologias utilizadas. 5 – Quais as principais dificuldades enfrentadas? Em especial o problema da licença ambiental que não esperávamos que demorasse tanto, pois sem a licença os bancos não financiam. 6 – Qual o papel da SEAGRI no projeto? Somos os responsáveis pelo projeto, em nome do governo do Estado da Bahia. E o Distrito de Irrigação de Ponto Novo, no próprio municÃpio, instituição sem fins lucrativos, sem vÃnculo com o Estado, formada por irrigantes associados faz a gestão do projeto. Nós realizamos a fiscalização. Toda documentação fica disponÃvel no Distrito, apenas temos as plantas. 136 APÊNDICE B Entrevista realizada com o Sr. José Adilson Cardoso da Silva, Engenheiro Agrônomo, Gerente Do Distrito de Irrigação, realizada em 29/03/12. ROTEIRO DE QUESTÕES: 1 – Qual o papel e responsabilidade do Distrito em relação ao Projeto de Irrigação? R - O Distrito de Irrigação ele é responsável pela operação e manutenção do projeto. Isso é o que está no nosso estatuto social. O distrito tem que fomentar a produção de um modo geral. Hoje a gente fornece assistência técnica à área de agricultura familiar. Então, hoje a gente opera a parte de bombeamento, pra ofertar água ao segmento empresarial e eles realizam a poçorização, e para área do agricultor familiar a gente faz a gente entrega a água já poçorizada.. 2 – Quais os principais objetivos do Projeto, seu público-alvo, critérios de inclusão e seleção? Quais foram os benefÃcios recebidos pelos participantes? Existiram condicionalidades? Quais? R – O objetivo do projeto inicial era atender a uma comunidade que morava na região da barragem, e que foi afetado devido a sua construção; e o pessoal que morava no entorno do local que foi incluÃdo no projeto. Então, para esse pessoal, o Banco Mundial colocou como exigência que eles tivessem uma qualidade de vida igual ou superior ao que viviam anteriormente, e o Estado teve uma preocupação muito grande na indenização em espécie, que era uma indenização que poderia dar esse dinheiro a uma pessoa, quantia que ele não esperava, e que não estava preparado para aproveitar este recurso. E daà surgiu esta ideia do Estado, que era a possibilidade de indenizar com dinheiro para aqueles que não quisessem de forma nenhuma a indenização com uma propriedade, e esta indenização com a propriedade, seria um lote na área irrigada ou na área de sequeira, como eles trabalhavam com a agricultura de sequeira, ou um outro local, que não fosse o local afetado pela barragem. Além do lote, no inÃcio, como a comunidade não tinha recursos para tocar uma atividade desta, uma atividade onerosa, atividade que inicialmente depende de muitos recursos, e aà o governo do Estado entregou uma propriedade com o sistema de irrigação, foram implantadas alguma culturas como o caso da manga, coco, que era uma das principais culturas no inÃcio do projeto, e a banana que leva em torno de um ano para começar a dar retorno. E neste perÃodo existia uma grande preocupação de como este pessoal iria sobreviver durante este perÃodo. 137 Então inicialmente foi colocado o sistema de irrigação convencional, que é aquele sistema que molha toda a área. Ele sobrepõe toda área. E foi incentivado que as pessoas pudessem fazer consórcios, com culturas de ciclo curto. Além disso, o governo do Estado, na ocasião forneceu cestas básicas, ajuda de custo para que a pessoa pudesse contratar mão de obra, quando ele não tivesse condição de atender a demanda, e água no primeiro ano ela foi totalmente isenta de custo para o agricultor, ela foi subsidiada por três anos. No primeiro ano, totalmente isenta. No segundo ano, o agricultor pagaria 40% do consumo, e no terceiro ano ele pagaria 60%, e depois era que viria a cobrança integral da água. Não existiram condicionalidades. O que houve foi um condicionamento para que a pessoa se adequasse ao projeto, que era ter a propriedade, caso tivesse sido afetado pela construção da barragem. Quero só lembrar que o projeto também tem a área empresarial, que tem como objetivo dar sustentação ao projeto. Então, o projeto não ficaria apenas com a agricultura familiar, pois teria custo de operação alto e por isso poderia se tornar inviável. Os critérios que foram criados visavam identificar quem se enquadraria como agricultor familiar e quem iria receber uma propriedade desta. A partir do momento que ele já tinha a propriedade, ele tinha direito aos benefÃcios. 3 – Quando ocorreu sua implantação e para quando estava prevista a sua conclusão? Por que não foi concluÃdo no prazo previsto? Quais as principais dificuldades enfrentadas? R – O projeto foi implantado em duas etapas. Teve a primeira etapa em que o pessoal veio em 1999 para iniciar o projeto, mas a implantação das culturas só iniciou no ano 2000. Eu vim para cá no mês de junho/2000, e os agricultores já estavam nas propriedades, só que o pessoal tinha apenas a casa. Daà a gente veio para montar o sistema de irrigação, preparar o solo, fazer os testes com o sistema de irrigação, e daà a partir do mês de novembro começou a implantar as culturas. A previsão era dentro do prazo dos três primeiros anos a implantação e conclusão do projeto, só que houve uma segunda etapa, pois existia uma necessidade imediata de realocação destas pessoas, que era o pessoal que morava no local onde foi implantado o projeto, pois não era necessidade imediata, anteriormente. A necessidade imediata era onde a barragem iria inundar. Essa etapa levou mais tempo e começou no inÃcio de 2006. Daà o restante da implantação, o produtor começava a receber os benefÃcios que o Estado dava e daà ele começava a ter resultados, nesse prazo de três anos eles já haviam ampliado suas culturas. O projeto está dividido em dois segmentos: o segmento do agricultor familiar e o segmento empresarial. Então, existe grande, médio e pequeno produtor. O segmento empresarial foi licitado em 2004. 138 Na primeira etapa, ficaram poucos lotes que não foram ocupados. Não está um paraÃso. A produção carece ainda de muitas mudanças, mas a primeira etapa está implantada. A segunda etapa, também está implantada, apenas poucos lotes que não são explorados totalmente. Não está implantado totalmente com fruticultura, pois este projeto tem foco na fruticultura, até por conta da estabilidade que a fruticultura proporciona, mas o segmento empresarial hoje, é que uma parcela ainda não está implantada, e isto se deve a alegação das pessoas que participaram da licitação e que adquiriram um lote desses, é que a falta da licença de operação é que está atrapalhando a implantação, por conta da dificuldade para encontrar recursos, financiamentos. A licença saiu em 2009, mas alguma empresas que já tinham vindo aqui e retornou, e daà ficaram alguns lotes ociosos. Então, está sendo implantado lentamente, por que não tem como ser diferente. As vezes a gente quer que o projeto seja implantado o mais rápido possÃvel, mas é um investimento que precisa ser muito bem planejado. Então na teoria, a gente achava que dentro de três anos tinha como implantá-lo. Na prática, a gente vê que existe a dificuldade por que o próprio empresário que está implantado, ele tem que buscar recurso, ele tem que conseguir também mercado, neste perÃodo ele não pode ampliar uma área de uma vez, por que ele ainda não tem mercado certo, ele tem que primeiro ganhar o mercado, então esse aumento é salutar que ocorra de forma gradativa e sustentável. 4 – Houve participação dos atores locais no desenho e gestão do projeto? R – No desenho eu não sei por que quando cheguei aqui já achei o modelo pronto, mas de certa forma, existiram diversas reuniões nas comunidades e que se discutiu muito o escopo do projeto. Na gestão do projeto houve e há por que o modelo de gestão do distrito de irrigação inclui um conselho, onde eu sou o gerente executivo, mas existe um conselho que estabelece as diretrizes de administração, e esse conselho é formado pelo segmento da agricultura familiar e o segmento empresarial. 5 – Qual a fase atual do Projeto? As metas previstas foram alcançadas? O projeto se mantém na rota dos seus objetivos? Se mudou, o que mudou e por quê? R – Eu diria que nós estamos já numa fase de conclusão. Uns ajustes são necessários, mas estamos numa fase já avançada para conclusão. Vale frisar este problema da licença que existiu, e por conta disso algumas pessoas se desestimularam e saÃram do projeto e tiveram que repassar estes lotes. Mas estamos avançando bem. As metas previstas ainda não foram alcançadas, pois a projeto visava gerar uma determinada quantidade de empregos, e isso não foi alcançado, mas a gente tem perspectiva que isso ocorra assim que o projeto estiver instalado. Não alcançamos, mas não podemos dizer que a 139 ideia foi abandonada e que estas metas a gente não tem como cumprir. Acho que a gente tem como cumprir até um pouco além destas metas que foram estabelecidas. Além da geração de emprego direto e indireto, as metas previam melhoria na qualidade de vida que já é uma coisa visÃvel, e que foi fomentado com o projeto. Então, o principal é isto. O projeto não está restrito aos produtores, ele é um projeto do municÃpio e que beneficia o municÃpio. Além disso, a gente vê que o pessoal que foi realocado teve uma mudança substancial na vida. O projeto contribuiu muito. A gente tem pessoas que viviam numa situação de mão de obra temporária, que nesses perÃodos de estiagem não tinham onde trabalhar, e hoje estão produzindo bastante, tem como projetar o futuro, e essas mudanças aconteceram dentro do projeto. A própria cidade teve um crescimento muito grande, um crescimento até indesejável por minha parte, por que eles caminham em direção ao projeto, esse é um problema, e onde há desenvolvimento existem problemas. Então a gente precisaria ter discutido mais isto, esta questão do crescimento da cidade, pois percebe-se que não está adequado, pois a cidade está muito próxima do projeto e deveria manter uma certa distância. Considero que o projeto se mantém na rota dos seus objetivos, como já falei a gente tem como alcançar seguramente estes objetivos. Acho que este projeto, em relação a outros projetos do Estado, está à frente de todos os outros projetos, e a gente tem potencial para alcançar os objetivos que já falei que foram projetados, e até além disso. 6 – Até então, quais os principais resultados alcançados no projeto? R – A produção, pois houve um aumento muito significativo. A vinda de empresas, que pela condição muito profissionalizada ajudou bastante no projeto também. A mudança na vida dos agricultores que antes tinham muita dificuldade e hoje temos pequenos produtores bem sucedidos, e como falei, na própria cidade, que cresce. Tirando este projeto, certo dia conversando com o prefeito, tirando este projeto eu acho que tiraria parte da cidade. A cidade ao invés de crescer eu acho que teria uma redução, por que muita gente iria buscar oportunidades em outros lugares. 7 – Quais as contribuições do projeto para o municÃpio em termos econômico, social, polÃtico e ambiental? R – Econômico, houve esta mudança na realidade dos produtores, na realidade da cidade, na produtividade; polÃtico por que contribui com o desenvolvimento. O projeto quando foi licitado muita gente da região não queria concorrer, hoje reclamam que os empresários são todos de fora, mas não havia interesse, e isto é uma questão cultural, uma questão polÃtica, e hoje a gente já vê muita gente aqui da região procurar o projeto, mas infelizmente não tem mais espaço, por que eles foram licitados, então, ocupados. Então houve essa mudança 140 cultural, eu diria, polÃtica. Agora, ambiental, depende do ângulo de visão. Tudo na vida tem ônus e tem bônus. Então, gerou um certo impacto negativo, nada que a gente não possa conviver. Existem áreas hoje com problemas de salinização, que é natural em todo projeto irrigado. Mas a gente tem uma área de reserva legal que estamos tentando recuperar, mas infelizmente ainda não avançamos muito. Estamos fazendo inclusive um convênio com Estado para cercar novamente, e assim que cercar, já discuti com o presidente do sindicato e da associação e com o conselho para tentar elaborar um projeto de reflorestamento dessas áreas. Então a contribuição ambiental é isto, o projeto também pretende construir um posto para recolhimento de embalagens, pois acontece o descarte indiscriminado das embalagens. 8 – Existiu uma pesquisa da Unicamp que apontava que o solo não era apropriado para irrigação. Vocês tomaram conhecimento deste trabalho? R – Tomamos conhecimento, apesar de termos tido pouco contato com este pessoal. Os solo da região aqui é excelente para a atividade. O problema que ocorreu, em termos estatÃsticos chega a ser insignificante, por que menos de 5 % do solo é que sofreu este problema (infiltração e salinização), então é uma coisa perfeitamente normal, inclusive o pessoal que sofreu com este problema estão sendo realocados para um outro lote, e estamos montando toda infraestrutura de água e energia elétrica para que eles venham para outro lote que não tenha problemas. 9 – Quais os pontos crÃticos na implementação do projeto? R – Existem muitos pontos crÃticos. Inicialmente, a dificuldade em lidar com a cultura que o pessoal já tinha no local. Como eles trabalhavam com uma outra atividade, e a agricultura irrigada é uma atividade muito diferente da agricultura de sequeiro. E as vezes, a pessoa que nasceu e se criou fazendo aquilo apresenta uma certa resistência a inovação tecnológica, ao próprio espÃrito empreendedor. Ainda ontem eu conversava com o pessoal do Incra e uma das crÃticas que faço é que uma atividade dessa depende de mudança de mentalidade, e isto proporciona um choque cultural. No inÃcio do projeto a gente chegou com umas mudas de banana e elas vieram em tubetes, e as mudas bem fininhas, e daà os produtores diziam eu não vou plantar isto, por que isto não é muda de banana, por que eles estavam acostumados a plantar com um tronco grosso, enorme, e a gente tinha que tentar convencer eles. No tipo de irrigação, eles diziam, irrigação tem que derramar água, e daà a gente orientava, e isso eu posso falar com muita propriedade, pois eu era da assistência técnica, e quando passava orientava, e à s vezes eles não faziam por que não acreditavam naquela orientação, e a gente também era estranho no local, e então a gente não tinha esta confiança deles todos; a gente veio adquirir isto depois. Na segunda etapa, por exemplo, nós fomos muito mais bem 141 recebidos por que apesar de não conhecer eles, eles até já me conheciam, e aà já sabiam sobre o outro projeto, e então a gente já não teve muita dificuldade, e também pelo próprio exemplo que eles já viam lá, mas na primeira etapa a gente teve muito isso, e tivemos que lidar com essa diferença cultural. A dificuldade maior que tivemos foi este choque cultural outros foram dificuldades que ainda temos, mas que dá pra se administrar. Ainda hoje a gente tem a questão do produtor que não assimila essas novas tecnologias e a gente tem que explicar diversas vezes, e hoje a gente até encontra mais facilidade, por que a minha convivência fez com que, apesar deles não entenderem a linguagem técnica, eu entendo a linguagem deles. Também aprendi com eles, então hoje convivo bem melhor com eles. Além disso, a questão financeira, pela dificuldade em financiamentos e a gente até achava que não era aconselhável conseguir trazer um banco para financiar o projeto que estava iniciando, por que eles têm uma grande dificuldade de gestão da propriedade, e isto ainda existe. Neste perÃodo seco, por mais incrÃvel pareça, é o melhor perÃodo para o agricultor irrigado, pois há um aumento grande na produção, além disso, os preços também melhoram, mas a maioria ainda não sabe conviver com isso e gerenciar isso. Tem o perÃodo crÃtico que o perÃodo de inverno, que é o perÃodo de queda de produção, aumento de doenças fúngicas e daà cai a produção, ocorrem quedas nos preços, as áreas de sequeiros começam a produzir também, e daà eles têm dificuldades pois não souberam administrar para guardar/acumular recursos do perÃodo que foi melhor. Este problema de gestão é crÃtico, mas a gente acredita que isto vai melhorar com a própria vivência do produtor, a substituição destes gestores que no futuro serão substituÃdos pelos filhos, e daà esses filhos estarão mais preparados para isto, até por que já conviveram de inÃcio com esta realidade, por que é uma dificuldade, que como ontem comentei com o Incra, se dependesse de mim a gente não iria colocar num projeto que tem um choque como este, uma pessoa com 70 anos. Daà ele me lembrou, mas tem o estatuto do idoso! Você coloca uma pessoa como esta que nunca viu nada, a chance de insucesso é maior, por que uma pessoa de 70 anos não vai se readaptar e mudar seus atos, é raro um caso que isso possa ocorrer, mas a esperança que a gente tem são filhos, que esta nova geração possa estar preparada para esta realidade. 10 – Em termos de aprendizagem para os beneficários do projeto, grupos e associados, comunidade local e empresários, quais as principais contribuições do Projeto? R – O distrito tem uma equipe de assistência técnica. O objetivo dele é geração e fomentação, e com isso existe o esforço de uma equipe técnica, que em algum momento a gente recebia recursos do Estado. Hoje a gente não tem a equipe de assistência técnica, mas a gente 142 continua mantendo este serviço, pois temos outros recursos do Estado, e como se diz, uma mão lava a outra. Inclusive, hoje o modelo de assistência técnica está sendo redirecionado, com chamadas públicas, inclusive eu estou até mantendo contato com gerentes de outros distritos, por que a gente precisa neste modelo diferenciar a atividade irrigada da atividade de sequeiro, e eu acho que as chamadas públicas deveriam (a gente vai discutir isto na Superintendência da Agricultura Familiar) ser diferenciadas para a área de sequeiro e para a área irrigada. Para isso, já comecei fazer contatos com alguns gerentes e a gente pretende mobilizar os outros gerentes e se a minha ideia for aceita, a gente vai para a porta da Superintendência da Agricultura Familiar para que haja esta adequação desta realidade. Então, a assistência técnica é um modo de contribuição, assim como já trouxemos cursos do Sebrae e a gente está tentando reativar isto. Além disso, hoje a equipe técnica está desfalcada por que depois que eu assumi a gerência do distrito, fiquei assumindo a gerência e a assistência técnica e eu hoje já conversei com o conselho, que não dá pra fazer as duas coisas juntas, bem feito, e hoje é importante a contratação de um agrônomo, e aà a gente está em processo de contração e acreditamos que poderemos avançar neste sentido. Criamos uma cooperativa que incluÃa treinamentos, chegamos até fazer estatuto e eleição, mas na hora da regularização, junto à Receita, por exemplo, ela não deu continuidade. Por que também nós não querÃamos fazer tudo por que não acreditamos também que fazendo tudo estaremos contribuindo, pois num momento a gente vai precisar soltar, eles não saberão se direcionar, por isso é importante que eles comecem a se conduzir e então pretendemos reativar esta ideia assim que tivermos outra equipe técnica para melhorar a comercialização. É lógico que eu tenho dito para os produtores que a gente não tem só que pensar em preço; quando a gente fala comercialização estamos falando também da qualidade do produto, e por isso é importante melhorar a qualidade do produto para barganhar preço também. 11 – Houve disponibilidade de tecnologias (geração e difusão) para viabilizar uma agricultura moderna e competitiva? Como? Houve. O projeto ele sempre teve assistência técnica e a gente já trouxe palestrantes, houve dia de campo aqui, a Embrapa já esteve diversas vezes aqui fazendo palestras, então a gente sempre procura trazer estas tecnologias e à s vezes até levar para o produtor. A gente já levou o produtor para outros projetos, para feiras agrÃcolas. Então, na medida do possÃvel a gente vem tentando fazer isso. 12 – Existiu alguma avaliação do Projeto? Qual o tipo de avaliação? Quantas? Quando? Realizada por quem? 143 Não. Tivemos uma avaliação no inÃcio, quando existia a equipe social, mas bem no inÃcio. Hoje a gente até, eu tive contato com o conselho e a gente já sente que carece desta avaliação. A equipe de assistência social era independente do Distrito e essa avaliação eles faziam e enviam para a Superintendência de Irrigação. Eu sei que existiu essa avaliação inicial e eu cheguei a ver esse documento antes de assumir a gerência, não lembro se foi a própria assistente social que me mostrou, mas é uma coisa que a gente pode até tentar localizar. 13 – Até a fase atual, quais as lições aprendidas a partir das dificuldades enfrentadas, dos ganhos obtidos e das metas que não conseguiram ser alcançadas? R – Houve um aprendizado da parte não só dos produtores, mas como eu falei, eu também tive um aprendizado, saà da universidade com uma visão e na verdade não sabia como me conduzir em algumas situações, acabava me sentindo impotente, quando eu falava percebia que ninguém estava entendendo, e isso hoje eu aprendi a conviver, hoje eu já sei quando estou falando com o produtor se ele não entendeu. Eu estava até conversando com o pessoal da UEFS que esteve aqui também, e eu disse para eles, que antes, quando eu era convidado para fazer uma palestra, se todo mundo ficasse calado eu achava que tinha sido nota dez, hoje, eu já descobri que não é uma verdade isso, quando eu começo a falar que eu vejo que está todo mundo quieto é por que não estão entendendo nada, aà eu tenho que me redirecionar, por que a gente descobre que começa a ser entendido, quando surgem as perguntas. Então, a gente aprendeu, o projeto aprendeu, o municÃpio com a chegada do projeto mudou, então foi uma lição pra todo mundo, para todos os atores envolvidos, inclusive para o próprio municÃpio. 14 – Gostaria de acrescentar alguma coisa? R – Eu acho que este projeto tem muito potencial, principalmente no segmento de agricultura familiar. 144 APÊNDICE C Entrevista realizada com o Sr. Fernando Antonio da Silva, Secretário de Agricultura do MunicÃpio de Ponto Novo-BA, realizada em 29/03/12. ROTEIRO DE QUESTÕES: 1 – Qual o papel e responsabilidade da Prefeitura em relação ao Projeto de Irrigação? R – A prefeitura não tem intervenção direta no projeto de Irrigação. O projeto de irrigação é administrado pelo conselho formado pelos pequenos agricultores reassentados e pelos lotes empresariais, as empresas que estão instaladas. O municÃpio é apenas um colaborador, por que, todas as dificuldades que eles passam, recorrem ao municÃpio para buscar apoio. 2 – Até então, quais os principais resultados alcançados no projeto? As metas foram alcançadas? O municÃpio teve um crescimento considerável após a implantação do projeto. A qualidade de vida da população melhorou, a evasão diminui, entre outras melhorias alcançadas. 3 – Quais as contribuições do projeto para o municÃpio em termos econômico, social, polÃtico e ambiental? Em termos econômico foi positivo, devido ao aumento da produção, houve elevação da renda; em termos social, houve melhoria na qualidade de vida da população, num geral; em termos polÃtico, houve uma certa independência por parte dos agricultores, que eram procurados por polÃticos, em especial no perÃodo de eleição, e em tempos de seca, que depois da irrigação, e da consequente melhoria da renda familiar, ficaram mais independentes; em termos ambiental, infelizmente, houve um impacto negativo, relacionado à infiltração em parte do solo, que ocasionou a salinização, e que vem nos preocupando muito. 4 – O projeto beneficiou outras regiões? Sim. Devido ao aumento da produtividade, o que acabou beneficiando outras regiões. 5 – Quais os pontos crÃticos do projeto? Falta mais apoio governamental, assistência técnica. E o principal, um problema atual, que é a salinização ocorrida, que já chegou à cidade, e que estamos muito preocupados sobre a proporção deste problema e como buscar resolvê-lo. Percebo também que falta mais iniciativa por parte do distrito para resolver as questões necessárias. 145 Além disso, estamos com problemas em relação aos lotes, que foram criados para atender a uma famÃlia, cada lote. Com o crescimento das famÃlias, hoje temos lotes divididos em 3 ou 4 partes, o que compromete a renda dos seus proprietários. Outra questão a se destacar é que não existe ainda formação para os nossos jovens sobre a atividade de irrigação, para que possam dar continuidade à s atividades de seus pais. 6 – Em termos de aprendizagem para os beneficários do projeto, grupos e associados, comunidade local e empresários, quais as principais contribuições do Projeto? Aprendizagem de novas tecnologias, novos modos de produção. 7 - Houve capacitação dos produtores? No inÃcio do projeto. 9 – Existiu alguma avaliação do Projeto? Qual o tipo de avaliação? Quantas? Quando? Realizada por quem? Não. Não existiu avaliação. 12 – Quais as principais dificuldades da Prefeitura em relação ao projeto e o seu posicionamento? Falta um posicionamento e atuação mais forte do Distrito de Irrigação, em relação especialmente a capacitação e busca de melhorias. 146 APÊNDICE D Entrevista realizada com o Sr. Ederli Afonso Vieira, Técnico Agropecuário, Responsável pelo escritório da EBDA que atende Ponto Novo e Caldeirão Grande, realizada em 29/03/12. ROTEIRO DE QUESTÕES: 1 – Qual o papel e responsabilidade da EBDA em relação ao Projeto de Irrigação? Quando a unidade foi implantada? Foi implantada para atender ao projeto? De que forma? R – Com relação ao Projeto de Irrigação, a EBDA não tem responsabilidade direta em relação ao projeto. Esta responsabilidade fica com a assistência técnica do distrito. A gente cuida da elaboração de projetos. No ano anterior elaboramos 45 projetos para o Banco do Brasil, que contemplava a área irrigada, e estes produtores estão produzindo banana, maracujá, goiaba. Quando a EBDA foi implantada em Ponto Novo foi para atender a reforma agrária, pois antigamente o escritório funcionava em Caldeirão Grande, com o governo de Valdir Pires, o escritório de Caldeirão Grande foi fechado e transferido para Ponto Novo. Então, quando o escritório foi aberto em Ponto Novo, foi criado exclusivamente para atender ao projeto de Reforma Agrária. O projeto de irrigação veio depois. 2 – Até então, quais os principais resultados alcançados no projeto? R – Para o municÃpio, os resultados foram muito bons, em especial para o desenvolvimento. O municÃpio era muito defasado, e com a chegada da irrigação a evolução aqui foi fora de sério e, o desenvolvimento para Ponto Novo chegou. Agora precisa ainda de muita coisa. 3 – Quais as contribuições do projeto para o municÃpio em termos econômico, social, polÃtico e ambiental? R – Em todos os pontos existiram mudanças relevantes para o municÃpio, então, a gente avalia que a irrigação é viável e que precisa ser desenvolvida em todo o Nordeste, não só em Ponto Novo, em especial pelo perÃodo de seca atravessado, pois quem tem sua área irrigada está tranquilo, e quem atua no sequeiro está passando por dificuldades. Em resumo, em todas as dimensões tem melhorado bastante e o resultado é bem visÃvel. 4 – Quais os pontos crÃticos do projeto? R – Eu acho que assistência técnica ainda é uma deficiência muito grande. Ainda ontem eu visitei um produtor que perdeu a safra de maracujá por doença e acho que falta assistência 147 técnica mais atuante; o pessoal está hoje endividado com o banco por que nem um laudo técnico havia para explicar o fato. Então, o produtor mesmo em área irrigada está em uma situação difÃcil. Acredito também que se faz necessária mais parceria com a prefeitura municipal; percebo a prefeitura muito distante desse projeto, mesmo por que existem questões polÃtico-partidárias, que pra mim deve ser arbitrário desse processo, e uma série de outros fatores. Acredito que o próprio governo no Estado, que na verdade é até vergonhoso dizer que tinha um pulmão verde aqui que na época desenvolvia feno e hoje está lá abandonado, então acho que deve existir mais ação do Estado pra fazer funcionar estas coisas, pois é uma área irrigada, e uma área de destaque que está lá parada. Faltam gestores para querer e fazer acontecer, mas ou menos por aÃ. 5 – Em termos de aprendizagem para os beneficários do projeto, grupos e associados, comunidade local e empresários, quais as principais contribuições da EBDA no projeto? R – A EBDA participa das reuniões do conselho. Existiram alguns problemas internos, que antes os empresários foram retirados do conselho, agora os empresários voltaram para o conselho. A participação do empresário é muito importante pra isto. Além disso, existem muitos lotes empresariais parados sem produção, não sei por quê. O lote parado é entrave, então tem que haver mais postura. Então, o que a EBDA participa mesmo é da reunião do conselho mensal, a gente não participa de outras questões, até por que é ordem da EBDA de Salvador. Tem o caso até de um colega de Terra Nova que tentou entrar em questões da área irrigada, empolgado em contribuir, e foi “tesourado†pela Diretoria. Então, infelizmente a EBDA está muito longe deste projeto de irrigação, a gente até se intimida. A EBDA até tem gente para trabalhar nessa área, na verdade, pesquisa é trabalho da EBDA também. No entanto, a EBDA passa por esta situação, você deve saber, o descaso que ocorre aÃ, muitos processos jurÃdicos, falta de funcionários, então é assim, a gente até tem boa vontade, mas boa vontade só não resolve. 6 – Houve, e ainda há capacitação dos produtores? Quais? Como? Outros tipos de capacitação? Para outros públicos? R – O que a gente sabe é que no inÃcio existiram capacitações sobre preparação do solo, etc, mas acho que as pessoas precisam de mais capacitação. A gente percebe que eles evoluÃram muito, mas também por que muitos deles aprenderam coisas novas, mas com aquele pessoal mais velho mais antigo, é difÃcil mudar a mentalidade deles, mas mesmo assim acho que é possÃvel mais treinamento, por que, pelo potencial que Ponto Novo tem, precisa de mais tecnologias. 148 7 – Houve disponibilidade de tecnologias (geração e difusão) para viabilizar uma agricultura moderna e competitiva? Como? R – Como a EBDA fica mais distante a gente não tem esta informação. 08 – Quais as principais dificuldades da EBDA em relação ao projeto? R – Falta de quadro técnico, o quadro atual é de um técnico para atender dois municÃpios. Então, enquanto não houver concurso público fica difÃcil. Para se ter uma ideia, a projeção da EBDA é um técnico para atender 100 produtores, e aqui em Ponto Novo nós temos 600 produtores cadastrados, e assim a gente não consegue ter uma trabalho de qualidade, é preciso fazer o atendimento de forma rápida de modo que a gente tem dado conta do recado, mas com uma certa deficiência. 09 – Alguma consideração a acrescentar? R – Eu acho que o pessoal de pesquisa, vocês da UFBA devem vir mais no municÃpio pra gente avançar nas pesquisas, diversificar na produção, e não ficar só com banana, maracujá, e outros. Eu acho que é a partir da pesquisa que você descobre novas coisas, novas utilidades. A pesquisa deve ser mais explorada no municÃpio, deve haver mais parcerias. Aqui não sei por que as pessoas não enxergaram isso ainda. A partir da pesquisa é que você trás alternativas, então, deve haver uma atenção especial para isto. Acho inclusive que os produtores também deveriam ser ouvidos. 149 APÊNDICE E Entrevista realizada com o Sr. Fábio Regis de Albuquerque, Sócio do SÃtio Barreiras, realizada em 29/03/12. ROTEIRO DE QUESTÕES: 1 – Qual a relação da empresa com o Projeto de Irrigação? R – A empresa veio por que existia o projeto de irrigação, da estrutura, da disponibilidade de área, de água, e a própria caracterÃstica da região. A empresa já existia, veio do sul do Ceará. Já tÃnhamos esta mesma atividade, e veio para cá como uma expansão. Estamos há 06 anos aqui no municÃpio. Nós não conhecÃamos a região antes do projeto. 2 – Quais os benefÃcios adquiridos pela empresa com a implantação do Projeto? R – Qual o grande atrativo pra vir uma empresa de fora para o projeto? É a questão da disponibilidade de áreas e a questão de infraestrutura hÃdrica, estradas, a questão de documentos, de licenças, licenças de uso de água, de desmatamento. Facilidades que você encontra quando está dentro de um projeto público. 3 – Na sua perspectiva, quais as contribuições do projeto para o municÃpio em termos econômico, social, polÃtico e ambiental? R – Como não conhecÃamos a região, nós podemos imaginar, face o entorno do projeto, que se possibilita desenvolver uma atividade econômica de alto nÃvel, em especial do ponto de vista tecnológico, que não seria possÃvel se não houvesse o projeto. 4 – A empresa contribui para o desenvolvimento local a partir do Projeto? Como? Quais as iniciativas empreendidas? R – Nós como diretores, participamos da gestão do projeto, fazemos parte do conselho de gestão do distrito, e via conselho de gestão a gente busca o que é melhor para o distrito como um todo. A gente sempre busca integração. Já fizemos várias visitas de campo com os reassentados que trabalham com banana, já trouxemos três vezes profissionais de fora, de Santa Catarina, de São Paulo para dar cursos sobre a atividade. Então nós fazemos sim integração no sentido de difusão de tecnologia. As palestras são exclusivamente para o público externo. 5 – Houve, e ainda há capacitação (aprendizagem) proporcionada pelo projeto? Qual? Como? 150 R – Acredito que sim. Ponto Novo virou centro produtivo, vêm pessoas da Embrapa e da EBDA para estudar tecnologias novas. E hoje Ponto Novo é referência na qualidade de frutas. É referência também em cultivo de maracujá, que já conhecido em todo lugar. Maracujá de Ponto Novo é referência. 6 – Houve disponibilidade de tecnologias (geração e difusão) para viabilizar uma agricultura moderna e competitiva? Qual (is)? Como? R – Com certeza ele trás tecnologia, seja através da gerência do distrito e convênios com Embrapa e outros órgão de pesquisa, como também as iniciativas de empresas, como é no nosso caso, a gente trás tecnologia que não tem como não ser difundida para as pessoas que estão ao nosso lado. Inclusive, funcionários que trabalham aqui e daqui a pouco estão trabalhando em outro lugar. Conhecimento é uma coisa que a pessoa leva. Especificamente na nossa empresa, a gente busca muito a qualificação, a gente tem um sistema de educação profissional. Estamos fazendo uma auditoria que inclusive um dos itens é quantos por cento do trabalho é certificado. 07 – Quais as perspectivas futuras da empresa, a partir do Projeto, uma vez que o mesmo ainda está em fase de implementação? R – Estamos mais ou menos 80% do projeto da empresa que temos já implantado. Estamos na fase agora de estruturação. A gente implantou muita área, mas muitas metas da empresa que ainda não estão realizadas, algumas estruturas que estamos implantando agora. Também a parte de capacitação profissional, como se tem muita gente nova. Então, se comparar esta empresa com a empresa que está lá no Ceará, são nÃveis totalmente diferentes. A empresa já está lá há 16 anos, onde 100% dos funcionários já estão certificados, todas as estruturas necessárias já atendidas, todos os postos de trabalho já atendidos. Existe uma carência muita grande aqui nesta região que são pessoas para ocupar posições de mais responsabilidade, maior nÃvel dentro da empresa. Este é um problema que nós temos aqui nesta região. 08 – Na sua perspectiva, quais os pontos crÃticos do projeto? R - Uma preocupação muito grande que nós temos em relação ao projeto refere-se a gestão da água. O projeto ele tem uma limitação de água. Ele hoje ainda não está 100% implantado e já existe uma certa limitação. A gente acredita que já tivesse sido implantado 100% a gente hoje já teria racionamento de água. E a gente tem que conversar com os gestores do Estado para que eles tenham ciência de que não se pode em nenhum momento comprometer o uso dessa água para outros destinos, antes de se providenciar o aumento da capacidade da barragem. Acho que este é o ponto principal que os gestores devem se preocupar, o comprometimento 151 da água, que hoje é um problema muito sério, especialmente numa seca que se vive como hoje. 09 – Alguma dificuldade da empresa em relação ao Projeto? R - O projeto de Ponto Novo é um projeto muito bem executado e planejado. As estruturas são excelentes, solo, água, localização. É um projeto excelente. 10 – Alguma consideração a acrescentar? R – Eu acho que poderia se estimular um pouco mais, principalmente na área do reassentamento, a vinda de técnicos, por que há uma carência, especialmente para os pequenos agricultores, que necessitam de mais conhecimento, mais tecnologia, por que a gente percebe que o nÃvel de desenvolvimento poderia ser bem melhor. 152 APÊNDICE F Entrevista realizada com o Sr. José Vieira, Presidente do Sindicato dos Assentados, realizada em 29/03/12. ROTEIRO DE QUESTÕES: 1- Na perspectiva dos assentados, como o Sr. avalia o Projeto de Irrigação de Ponto Novo, quais os principais problemas? A barragem dificultou a sobrevivência, pois dificultou as vendas dos produtos da agricultura, pois houve aumento do custo de transporte devido ao aumento da distância da área rural até o centro da cidade. Além disso, muitos dos assentados da 1ª. Etapa preferiram vender seus lotes e gastaram todo o dinheiro com bebidas, carros e bens que não trouxeram nenhum retorno. Muitos desses lotes eram comprados por pessoas queriam investir na região, mas também por veranistas. Cada lote valia pelo menos R$ 50.000,00, os que ficaram, na maioria, teve resultado, depois comprou moto, caminhão... Outro problema que a gente percebe é que faltam recursos e tecnologia. Além disso, nós pequenos agricultores temos mais dificuldades. O projeto ajuda mais os empresários que nós. A gente não tem condições de manter. A barragem também vem diminuindo de profundidade e isto nos preocupa. A barragem melhorou muito nossa condição quanto ao abastecimento de água, antes a gente tinha que comprar água para beber e usar água do poço, mas como já disse, com a falta de chuva, já se sente a falta de água para o consumo e para a irrigação. A piscicultura mesmo foi um desastre. As instalações foram abandonadas, houve muito desvio dos pescados e as pessoas não colaboravam. Faltou liderança. Nós agricultores precisamos nos organizar melhor para atuarmos nas assembleias em busca de nossos interesses. Não devemos apoiar qualquer proposta. A maioria delas beneficia bastante as empresas. Nossa participação é muito pequena e não foca a defesa de nossos interesses. A gente ainda não conseguiu se organizar para fazer propostas que defendam os nossos interesses. É muito difÃcil conduzir o grupo.